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II SÉRIE-C — NÚMERO 31

que sc deveria ter concedido ao A. o estatuto de mulher,

fícar-.hc-ía negada afaculdâdê de Cõnlfáf tül

10 — Pelo menos dois acórdãos da Relação de Lisboa

— o dc 17 de Janeiro de 1984 (cit. Colectânea, 1984, L i, p. 109) e o dc 5 de Abril de 1984 (cit. Colectânea, 1984, t. ii, p. 124) — pronunciaram-se no sentido da legitimação da intcrsexual idade.

11 — Trata-se, em tese, de um problema controverso e será mesmo um exemplo típico da necessária intervenção do Conselho Nacional dc Ética para as Ciências da Vida, prévia ou posterior a qualquer iniciativa legislativa.

Mesmo a nível do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem não existe uma unanimidade dc pontos dc vista. É o que se mostra da sua mais recente decisão — de 27 de Setembro de 1990 (caso Cossey c/ Rcino-Unido), na Revue universelle des droils de lhomme, vol. 2, n.° 10, de 31 de Outubro de 1990, p. 353.

Fora recusada pelas autoridades britânicas à requerente

— que nascera com o sexo masculino— a alteração do seu registo de nascimento, o que ela considerou ser uma violação do artigo 8.° da Convenção Europeia (respeito pela vida privada). E o seu casamento com um indivíduo do sexo masculino fora anulado, o que, na perspectiva da requerente, violara o artigo 12.9 da Convenção (direito a contrair casamento).

Decidiu o Tribunal, por 10 votos contra 8, não ocorrer violação do arugo 8.° E, por 14 votos contra 4, não ter sido transgredido o artigo 12.B

12 — São, aliás, de considerar a resolução adoptada pelo Parlamento Europeu cm 12 de Setembro de 1989 e a Recomendação n.° II17 da Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa de 29 de Setembro de 1989.

Em qualquer delas é preconizado aos Estados membros que editem legislação que reconheça aos transexuais o direito a mudar dc sexo através de tratamentos endocrino-lógicos, cirurgia plástica c de tratamentos estéticos.

13 — Está, pois, em causa uma questão que não pode ser considerada tabu pelo legislador. Tudo estará, obviamente, em evitar que as motivações que determinaram as intervenções clínicas não resultem dc mero caprichismo ou dc interesses não tuteláveis (por exemplo, vantagens artísticas, desportivas, etc.).

O drama do legislador é, por vezes, o dc optar. E, para que cie seja atenuado, deverá munir-sc de todos os elementos dc análise prévia que não conduzam à violcntação da normalidade da vida ou da consciência colectiva da comunidade.

IV

Procriação assistida e manipulações genéticas

14 — Elaborou a Comissão para o Enquadramento Legislativo das Novas Tecnologias, para além do anteprojecto sobre o Conselho Nacional dc Bioética, dois outros: um sobre a utilização de técnicas dc procriação assistida e outro sobre os centros de procriação assistida.

Foi ainda publicado no X Governo Constitucional o Dccreto-Lei n.° 319/86, de 25 de Setembro, dirigido a acautelar a idoneidade das práticas de procriação assistida que já então sc desenvolviam em Portugal.

Tratou-se de um pequeno diploma, que nunca veio a ser regulamentado, como nele sc previa (artigo 2.*).

15 — Sobre os dois anteprojectos de que não decorreu Qualquer actuação légiférante, é evidente que as soluções neles propostas —sobretudo no primeiro— terão dc ser reencaradas a uma luz mais actual e através dc uma reflexão mais alargada, na qual o Conselho Nacional dc Ética terá uma determinante palavra a dizer.

É dc questionar, aliás, se o âmbito da legislação a editar deverá ser tão amplo c se, ao invés, novos flancos de problematização não poderão ser encarados.

Que em certa e prudente medida haverá que legislar não sofrerá dúvida.

São os próprios biólogos e médicos a quesuonar os juristas: «Pedimos que sejam fixadas normas [...]; pretendemos directivas precisas e um consenso da sociedade (...]; estamos a ingressar no domínio dc uma medicina muito específica [...]. Mais do que nunca carecemos [...] que sejam estabelecidos limites», escrevia, já em 1985, Rcnc Frydman (M). «Os desafios ultrapassam largamente a nossa responsabilidade e as nossas competências [...]. Necessitamos que as instituições se pronunciem o mais urgentemente possível sobre a legalidade destas actividades», insistiria meses depois Frydman, então já na companhia de Jacques Tcstard í21). Este, que fora o pioneiro em França da fecundação in vitro, anunciaria depois, cm L'oeuf transparent, que não ousava ir mais além, c que punha termo às experiências (22).

No aludido Colóquio dc 1985, sublinhara Catherine La-brussc-Riou que a lei deve intervir, embora confinando-se ao indispensável. Esta, dc resto, a posição da Igreja Católica: da intervenção do legislador não despontará uma legislação que regulamente todas as técnicas actualmente existentes bastando-sc cm assegurar a protecção do direito à vida e à dignidade da pessoa.

Realmente o que hoje é actual amanha já o não será A evolução das tecnologias é vertiginosa e um legislador que a todas intentasse abarcar cairia no campo do precário c do transitório, sc não do utópico.

De rejeitar será, no entanto, a corrente individualisai c liberalizante, que postula a supressão dc quaisquer limites e o derrubar das barreiras da sociedade «burguesa» tradicional. Nada deve ser feito: qualquer regulamentação, qualquer «juridificação», é nociva, inútil e incongruente O2).

Uma visão tão fluida c permissiva não será dc aceitar. Põe ela de lado a identidade e o valor da pessoa, que não pode ser objecto inerte das concepções e do arbítrio da cada um. E esquece que, como ajustadamente lembrou Jean Carbonnicr, a lei, só por existir, produz efeitos simbólicos, que largamente excedem a sua eficácia directa: «légiférer, c'est consacrer» (}*).

16.1 — Desde 1987 muitas coisas se passaram, aliás. Graças a um novo método dc fertilização in vitro, as mulheres podem agora ter filhos depois da menopausa; a experiência foi realizada com pleno êxito pelo Prof. Mark Sauer, da Universidade da Califórnia do Sul. A escolha do sexo do embrião é já hoje uma realidade, e pratica-se largamente nos Estados Unidos, no Japão e em França; na índia assiste-sc a um verdadeiro «holocausto» dos embriões femininos C5). Ainda recentemente em Espanha, uma mulher, Espcranza Martin Cornejo, dc 43 anos, pretendeu ver judicialmente reconhecido o direito dc, através dc técnicas dc reprodução assistida, ler uma filha. A escolha ûo foi-lhe vedada í26).

As primeiras terapias génicas são levadas a cabo nos Estados Unidos (27).

A interacção entre a biologia c a informática, ainda cm fase não muito consolidada, poderá dar lugar a seres