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II SÉRIE-C — NÚMERO 31

o som no microfone que tinha tido à sua disposição durante

a entrevista».

2 —■ Com a sua exposição escrita, forneceu-mc o

Sr. Engenheiro... o registo magnético do Telejornal das 19 horas e 30 minutos do dia 24 e do 14 Horas do dia 25.

relativo à matéria em apreço.

3.1:—Entende o reclamante que a RTP violou, togo no Telejornal, o direito à imagem que a Constituição lhe assegura (artigo 26.°, n.91); esse direito à imagem assume um especial relevo quando se trata de um meio da comunicação social como a televisão, «onde a essência da missão informativa assenta precisamente na transmissão dc imagens e do texto a que essas imagens se reportam».

Ocorreu, assim, uma utilização abusiva da sua imagem, «para ilustrar um texto da responsabilidade da RTP que não corresponde na íntegra à declaração prestada».

3.2 — Entretanto, o que ocorreu no dia imediato veio tomar mais evidente a má fé com que a RTP actuou.

Com efeito, com a 2" entrevista não pretendeu a RTP «repor a verdade dos factos, mas tão-somente reincidir numa atitude atentatória da dignidade [dele, Sr. Engenheiro ...] e manifestamente contrária aos mais elementares valores da isenção e do rigor jornalísticos».

II

4 — É a RTP uma empresa pública e está cm causa a defesa de direitos fundamentais — o que, desde logo, toma pertinente e necessária a intervenção deste órgão do Estado (máxime artigos l.9 e 19.9, n.9 1, da referida Lei n.9 81/77 — Estatuto do Provedor dc Jusúça).

Cabe-me, pois, o dever dc pronúncia.

5.1 — Estrutura-se o nosso ordenamento constitucional no respeito pela dignidade da pessoa (artigo l.9 da Constituição da República Portuguesa), sendo uma das tarefas fundamentais do Estado a de «garantir os direitos c liberdades fundamentais» [alínea b) do artigo 9.9].

Subjacente ao sistema de valores que transparece na Constituição está, assim, o direito ao respeito pela dignidade da pessoa; como lembra Karl Larenz (Metodologia da Ciência do Direito, tradução portuguesa da 2' ed., 1978, p. 600), «aquilo que se deve ao homem — enquanto pessoa — é o respeito».

Não é, pois, por acaso que a Declaração dos Direitos e Liberdades Fundamentais aprovada pelo Parlamento Europeu cm 12 de Abril de de 1989 declaradamente acolhe, no n.9 1 do artigo 6.9, esse «direito ao respeito».

5.2 — Ora, desde logo, não resta sombra de dúvida que o respeito devido ao Sr. Engenheiro ... — enquanto pessoa, como cidadão, como homem público — foi preterido, sobretudo, cm meu entendimento, na 2} emissão televisiva.

6.1 — Sucede, no entanto, que o n.9 1 do artigo 26.9 da Constituição cataloga, expressis verbis, alguns dos direitos dc personalidade tutelados, numa intencionalizada sinonímia com os direitos fundamentais, pelo menos nesta área (cf., no entanto, numa oportuna precisão, Jorge Miranda, Manual de Direito Constitucional, rv, 1988, p. 59 c nota 1).

E, para além do direito à imagem, ajustadamente chamado àcolação pelo Sr. Engenheiro ....particulariza ainda o direito à identidade pessoal.

Passa hoje como moeda corrente que o direito à identidade pessoal excede cm muito o simples direito ao nome. Será o direito a que não seja afectada a própria imagem clica, social ou política; a posição da pessoa na realidade social, a «ideia» que os outros formam de alguém.

E daí, precisamente, que o direito á imagem e à identidade pessoal andem frequentemente associados na àouWWâ (por exemplo, Figône, «Tutóla deli' iámÚlh ÇCTSOUãle P

nuove prospeuive in tema di diritto ali' imagine, in Giur.

di mérito, i, 1981, p. 1264, e Giovanni Giacobbe,

«L'idcnlità personalc ...», na Rivista trimestrale di diriito

e procedura civile, ano xxxvii, Setembro de 1983, pp. 810

e segs., máxime p. 847).

6.2 — Ora, como salienta o Sr. Engenheiro..., aquilo que lhe foi solicitado, e que ele pressupõe fazer, foi um depoimento — que é de ver se desenvolvesse através dc palavras suas — e não um visionamento acompanhado dc um texto a que foi alheio.

7 — Aliás, e significativamente, na nova redacção do n.9 1 do artigo 26.9 da Constituição foi incluído — e por unanimidade — um novo direito: o direito à palavra.

Significa isto, na circunstância em análise, que a imagem do Sr. Engenheiro ... deveria ter sido acompanhada daquilo que ele próprio disse, e não de um icxto que, em seu entendimento, não exprimiu o sentido autêntico da mensagem que ele pretendeu uansmilir.

III

7.1 — Não pode o Provedor de Justiça, a contragosto, deixar dc assinalar que a RTP fez um uso inadequado dos poderes de que dispõe para o exercício de uma essencial função dc interesse público.

Aliás, sobretudo, o que se passou na 2.' emissão (a do dia 25) não deixa dc molestar, na parte final, a sensibilidade de qualquer observador imparcial; quase direi que foram esquecidas não apenas elementares normas de ética, mas até dc estética dc actuação.

7.2 — Já cm 1981 Roland Dumas, hoje Ministro dos Negócios Estrangeiros do Governo Francês, e então advogado, sublinhava no seu Le Droit de l'Information (PUF, col. «Thémis», p. 31) que a influência da televisão tomava a sua «utilização tendenciosa particularmente perigosa».

Não pertence ao Provedor de Justiça ajuizar se, no caso, a referida actuação foi deliberadamente tendenciosa.

E não lhe pertence, também, ajuizar se deliberadamente está a ser preterido o comando constitucional do n.9 6 do artigo 38.9 da Constituição.

7.3 — Cabc-lhc, no entanto, pronunciar-se sobre o caso concreto que lhe é posto e formular acerca dele um juízo prévio inclutavclmente negativo, seja ou não esse caso um epifenómeno dc um mais alargado condicionalismo.

7.4 — Entretanto, porque não dispõe o Provedor dc Justiça da gravação das palavras efectivamente ditas peto Sr. Engenheiro ... aquando da prestação das suas declarações na 1.* emissão (dia 24), solicita-se ao conselho de gerência essa gravação.

E notifica-se o mesmo conselho de gerência para, caso o pretenda, dizer o que porventura considere útil para a apreciação do caso, no prazo máximo dc 10 dias.

Lisboa, 27 de Setembro de 1990. Processo n.° 2191/90.

2.s despacho

1 — Tenho perante mim uma carta, que me é nominalmente enviada pelo Sr. Chefe do Departamento de Noticiário e Actualidades da RTP, por incumbência do Sr. Director do canal 1 da mesma RTP, «ausente no estrangeiro».