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II SÉRIE-C — NÚMERO 31

II

1.1 —A resultante prática do ofício de 3 do corrente do conselho de gerência da RTP é a de que não acatou a recomendação que em 29 de Agosto formulei no sentido da revisão do critério subjacente à Ordem de Serviço, n.B 5/90 («Dever leal de não concorrência»).

1.2 — Diz, em síntese, o conselho de gerência que não foram por este órgão do Estado refutados «os argumentos e as razoes jurídicas e deontológicas em que [ele, conselho de gerência] se apoiou».

Refere ainda que aquele despacho de 29 de Agosto não se encontra «devidamente fundamentado», preterindo, assim, o disposto no n.fi 2 do artigo 268.9 da Constituição; com efeito, limita-se a problematizar, com carácter genérico, a posição por ele assumida, «virtualmente lesiva de direitos fundamentais do universo do[...] possíveis destinatários [da Ordem de Serviço]».

Finalmente, e uma vez mais, o conselho de gerência refere que a questão se encontra afecta ao foro do trabalho da comarca de Lisboa. Mas adita agora que aquilo que é objecto de apreciação jurisdicional «é a legalidade da Ordem de Serviço, n.B 5/90[...]e não apenas situações referentes à sua aplicação concreta e individualizada».

2 — Tenho como óbvio que, no presente estado de coisas, me deverei limitar a remeter os meus despachos e outros elementos do processo à Assembleia da República, até porque no âmbito do inquérito parlamentar constituído pela Resolução n.8 19/90 (Diário da República, 1.' série, de 4 de Agosto de 1990) se inclui, precisamente, a avaliação das implicações daquela Ordem de Serviço «ao nível da restrição da liberdade de expressão e de informação dos jornalistas» (ponto n.9 1.5).

3 — Duas precisões devo, no entanto, fazer.

Tem a primeira a ver com a chamada à colação do n.9 3 do artigo 268.° da Constituição. É evidente que o Provedor de Justiça não se integra na Administração Pública, sendo um órgão do Estado com uma fisionomia específica. Isso mesmo advém do artigo 23.9 da Constituição, agora precisado pelos novos n.0! 3 e 4. As recomendações que produz não são actos administrativos que repercutam na esfera jurídica dos destinatários. Caracterizam-se pela sua «informalidade» (artigo l.9 da Lei n.9 81/77, de 22 de Novembro). Daí o não serem susceptíveis de recurso contencioso, só podendo ser objecto de reclamação para o próprio Provedor (artigo 35.° desta lei). O que releva é que o seu sentido seja captável, a fim de que possa ser tomado em conta pela Administração (em sentido amplo).

Ora a intencionalidade e a razão de ser da recomendação capta-se, com concludente univocidade, dos meus despachos de 2, 21 e 29 de Agosto.

Movimentei-me no domínio da justiça (desde logo da justiça relativa, em confronto com o tratamento dado a outros trabalhadores da RTP, a todos os níveis) e, sem ingressar em análise de mero legalismo, procurei prevenir o que entendia poderem vir a constituir novas injustiças. Não foi, de resto, alheio à minha intervenção um marcado propósito de persuadir o conselho de gerência da RTP a encontrar uma forma de composição de interesses que não arrrastasse a resultantes que tinha como desproporcionadas.

Ao que se vê, o conselho de gerência não compreendeu que o Provedor de Justiça — desprovido como está de poderes decisórios — actuava num campo não coincidente com o da legalidade estrita.

4.1 — Tem a segunda precisão a ver com a reiteração, agora ampliada com uma nova vertente, de que o «caso» da Ordem de Serviço se encontrava afecto ao foro judicial.

Começo por manter por inteiro o que ponderei nos n.°5 4.1, 4.2, 4.3 e 4.4 do meu despacho dc 29 de Agosto.

Com efeito, e como concludentemente dispõe a Constituição (n.9 2 do artigo 23.9), «a actividade do Provedor dc Justiça é independente dos meios graciosos c contenciosos previstos na Constituição e nas leis».

A Lei n.9 81/77, complementando esta regra fundamental, preceitua no n.9 2 do artigo 20." que «ficam excluídos dos poderes dc inspecção e fiscalização do Provedor de Justiça os órgãos de soberania [...]».

Ora, como os tribunais são órgãos de soberania, deve o Provedor de Justiça abster-se de controlar o desenrolar dc processos judiciais pendentes, fiscalizando os actos dos juízes produzidos em casos bem concretos c definidos.

Nada disso aconteceu, no entanto, na hipótese em causa.

A Ordem de Serviço assim ilar-se-á a um acto administrativo genérico, com um universo de destinatários, a maioria dos quais não iniciou nem pretende iniciar qualquer actuação judicial; isto ao que é possível depreender.

Sem ingressar no domínio da apreciação da legalidade estrita desse acto genérico, ao Provedor não pode ser expropriada a faculdade —que constitucionalmente lhe é atribuída — dc emitir uma recomendação baseada, essencialmente, cm critérios dc justiça, de oportunidade — c de bom senso.

4.2 — 0 n.9 2 do artigo 17.9 da Lei Orgânica 3/1981, de 6 dc Abril, sobre o «Defensor dei Pueblo» espanhol, ajuda a clarificar este ponto dc vista:

O DP não entrará no exame individual das queixas que estejam pendentes de resolução judicial [...].

Mas para logo depois acrescentar

Isto não impedirá, no entanto, a investigação sobre os problemas genéricos propostos nas queixas apresentadas.

Há que distinguir, pois, entre os problemas individuais e os problemas genéricos (Victor Faisén Guillen, Ei Defensor dei Pueblo .... ii. 1986, p. 31).

4.3 — O artigo 11.9, primeira parte, da Lei n.9 73-6, de 3 de Janeiro dc 1973 (com a redacção dada pela Lei n.9 76-1211, de 24 de Dezembro de 1976), sobre o Mê-diateur francês, é ainda mais explicito:

O mediador não pode intervir num processo proposto num órgão jurisdicional, nem pôr em causa o bem-fundado de uma decisão judicial, mas tem a faculdade dc formular recomendações ao organismo em causa.

4.4 — No folheto de divulgação publicado, em 1978, pela Secretaria de Estado da Comunicação Social, sobre o Provedor de Justiça escreve-se na p. 8 que o Provedor de Justiça recusará a apreciação de reclamações «referidas a litígios cuja apreciação e resolução seja da competência dos tribunais».

Claro está que esse «esclarecimento» deve ser rectificado, pelo erro em que induz quanto ao âmbito dc actuação do Provedor de Jusüça.

Dá-se até o caso de, numa primeira leitura, se poder inferir que basta a possibilidade de recorrer a tribunal para que o interessado não lance mão do «apelo» ao Provedor dc Justiça.

Trala-se dc um clamoroso lapso, que a Lei n.B 81/77 frontalmente contraria.