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II SÉRIE -C— NÚMERO 31
O Sr. Presidente (Antunes da Silva): t~ Sr. Dr. Alexandre Galo, agradeço a sua exposição. Penso que todos os Srs. Deputados estarão de acordo comigo ao dizer que se justifica perfeitamente a intervenção que V.. Ex.3 aqui fez, perante aquilo que se tem vindo a passar, e que é algo que todos nós devemos fazer, ou seja, preservar a nossa própria dignidade. Percebemos, por isso, perfeitamente, a exposição que V. Ex.3 aqui fez.
Tem a palavra o Sr. Deputado António Campos.
O Sr. António Campos (PS): — Sr. Dr. Alexandre Galo, agradeço-lhe a sua vinda aqui — penso que o seu contributo foi de extrema importância e que valeu a pena ouvi-lo, mas gostaria de o questionar sobre algumas situações.
V. Ex.3 publicou muitos trabalhos, mas por que é que não publicou nada ligado ao primeiro aparecimento de encefalopatia?
A segunda questãorefere-se à carta que V. Ex.a nos leu, onde lhe é reconhecida alta competência profissional: é do mesmo Professor Lage que esteve aqui a depor, ou é de outro professor, ou de outra pessoa?
V. Ex.3 informou-nos de que foi obrigado a guardar sigilo. Conhecemos o percurso: já aqui estiveram colegas seus que fizeram o diagnóstico no terreno; já tivemos aqui o Sr. Dr. Matos Aguas, que confirmou que o director-geral o obrigou a manter sigilo; já sabemos que, numa questão desta natureza, quem tem de actuar é o director-deral'e o próprio Governo (em Inglaterra foi o Secretário de Estado da Agricultura, em França foi o próprio Ministro da Agricultura quem tratou destas situações). O que gostaria de saber é se houve algum contacto entre V. Ex.a e o director-geral.
Outra questão que gostaria que nos esclarecesse, é se, quando começou a especializar-se nesta doença, foi o próprio director-geral que o mandou especializar nesta matéria. • . c
Ainda outra questão, que também aqui referiu, é a da recusa de.enviar as lâminas para Inglaterra, para confirmar o diagnóstico. O primeiro diagnóstico foi feito em 1990, já estamos em 1993 e. aparecem-nos agora aqui alguns professores a dizer que era: preciso fazer mais exames (já passaram três anos e alguns países declararam a doença com dois casos apenas, fazendo declaração obrigatória ao detectar a existência de dois casos) mas a nós, desde .1990, que nos estão a ser sonegados, apesar de haver compromissos comunitários e de haver legislação portuguesa para o diagnóstico:
Uma outra pergunta. Há um decreto-lei que estabelece:a forma de diagnóstico em Portugal (e que não é só em Portugal, existe em todos os países da Comunidade), contudo, encontramo-nos hoje nesta situação ridícula: há vacas que têm encefalopatia em França, em Inglaterra ou na Suíça mas, em Portugal essas mesmas vacas não têm encefalopatia. Poderá dizer-nos sé o processo utilizado por eles é o mesmo ou não que V, Ex." utilizou?
V. Ex.3 fez a esta Câmara uma revelação importantíssima sobre a reunião do Comité dos Veterinários (penso que é essa a designação), que já é posterior ao levantamento da situação em Portugal, e sobre a posição e a postura.dá delegação portuguesa na qual foi referido «após exames detalhados»,- o que quer dizer que, além das fornias tradicionais de diagnóstico estabelecidas por lei, a Direcção-Gerâl fez mais diagnósticos, e mais exames complementares que permitiam ao próprio director-geral (que, suponho, era quem encabeçava essa delegação) referenciar a situação com toda a clareza e com toda a autoridade. A mesma autoridade que
usou comigo porque, antes de declarar isto publicamente, telefonei-lhe a perguntar se havia e quantos casos havia, e ele mentiu-me, informando-me que não havia casos de encefalopatia espongiforme bovina em Portugal.
Portanto, gostaria que nos indicasse outros exames detalhados que o director-geral tenha mandado fazer para poder fazer essa afirmação nessa reunião do Comité, porque se V. Ex.3 estava a trabalhar nesse assunto presumo que o próprio director-geral o tivesse contactado para esses outros trabalhos.
Para nós, não há qualquer dúvida sobre a existência da encefalopatia espongiforme bovina em Portugal, porque, utilizando a mesma metodologia que se usa em qualquer país da Comunidade, nós tivemos, por sorte, acesso a esses diagnósticos; Assim, é estranho —e é aquilo que mais me preocupa — o comportamento do Estado português, porque assinou acordos internacionais, criou legislação, preparou investigadores. Ora, havendo um quadro legislativo, havendo um laboratório altamente preparado (tenho documentação em que o próprio director-geral o considera como tal), recusando até a importação de priões para o Instituto Nacional Ricardo Jorge para complementos de trabalho — isto em 1991 —o Sr. Director-Geral não só não confirmou a doença publicamente como também evitou qualquer outro exame complementar que o comprovasse; isto acrescido da recusa como V. Ex.3 aqui referiu, do Sr. Director-Geral, que impediu o envio das lâminas para Inglaterra.
O Sr. Presidente (Antunes da Silva): — Antes de dar a palavra ao Sr. Dr. Alexandre Galo, gostaria de esclarecer uma dúvida.
O Sr. Deputado António Campos referiu na sua intervenção, por duas vezes, a recusa do envio das lâminas para Inglaterra. O que percebi da intervenção do Dr. Alexandre Galo foi que as lâminas estavam disponíveis para qualquer outro exame que se quisesse fazer.
Tem a palavra Sr. Dr. Alexandre Galo.
O Sr. Dr. Alexandre Galo (Investigador Auxiliar do Laboratório Nacional dé Veterinária): — Tentarei esclarecer essa situação. Prometo tentar ser breve mas as perguntas foram muitas e tenho medo de me alongar um pouco —a conversa é conio«as cerejas» e corremos o risco de ficar aqui tempos intermináveis. A primeira pergunta, por que não publiquei nenhum trabalho sobre esta doença tendo publicado muitos outros trabalhos'— a determinada altura, nós, pessoas que trabalhamos em ciência, vivemos para e de este tipo de trabalho, que tem como consequência imediata a publicação; todo o nosso curriculum, ou a apreciação do nosso curriculum, é baseado, sobretudo, nos trabalhos que publicamos e na respectiva qualidade. Era minha intenção e teria sido muito grato para mim que, na altura em que alguém faz o diagnóstico do primeiro caso de encefalopatia espongiforme dos bovinos, ele pudesse ter sido publicado e reportado, sobretudo, como era o caso e estava combinado, numa revista reconhecida como uma das boas revistas internacionais, o Veterinary Reco rd; mas a realidade é que o sigilo que foi imposto impediu-me de fazer essa publicação. Devo dizer que optei por outra solução e acabei por fazer uma tradução de um trabalho, que publiquei com a anotação dè que era tradução minha, de um autor inglês, que foi publicada numa revista técnica que é editada pelo Sindicato Nacional dos Médicos Veterinários e que tem uma difusão de cerca de 1500 ou 2000 exemplares e é de distribuição gratuita aos veterinários.