19 DE JUNHO DE 1993
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O Sr. Presidente (Antunes da Silva): — Para responder às questões que foram suscitadas, tem a palavra o Sr. Professor Amaral Mendes.
O Sr. Prof. Amaral Mendes (Universidade de Évora): — Uma vez que as perguntas não se sobrepõem, vou começar por responder às questões colocadas pelo Sr. Deputado Carlos Duarte.
Assim, relativamente ao problema da saúde pública (salvaguarda da possibilidade de contacto) —está, aliás, em relação com um aspecto posto pelo Sr. Deputado António Campos sobre a possibilidade de transmissibilidade à espécie humana —, quando digo que há uma possibilidade, não quero dizer que seja já na vivência dos nossos dias ou desta geração, mas, sim, em relação ao futuro, digamos que daqui por um século ou coisa assim, porque a alteração de informação de transcrição genética que se deu pode dever-se a um erro metabólico ou pode haver um fenómeno epige-nético, isto é, um fenómeno que não é condicionado pela informação genética. E é neste aspecto que me interessa muito — tenho aqui até uns trabalhos que lhe vou deixar — porque a área em que trabalho é a chamada área dos bio-marcadores.
Portanto, este é o grande problema que se põe aos cientistas. É que, de futuro, pode haver esse erro metabólico. E é um erro metabólico que se reproduz. Hoje, na comunidade internacional, está assente como sendo uma forma, de facto, virulenta que tem personalidade própria.
Agora, as dimensões deste vírus infectante por comparação, por exemplo, com o vírus da sida, é uma coisa monstruosoa. O vírus da sida podemos concebê-lo, talvez, como sendo do tamanho de uma sala e o vírus infectante como sendo, talvez, do tamanho de uma cadeira. Há, portanto, uma disparidade muito grande na dimensão do projecto.
Quem se preocupa com estes problemas da biologia teórica pura e as suas implicações futuras pode vir a encontrar não só estas formas, agora identificadas, mas também novas formas que possam vir a surgir. Houve, de facto, uma atitude pasteuriana de que as doenças seriam imutáveis, ficariam estáticas. Mas nós próprios, através das introduções, estamos a evoluir. E, por isso, a toxicologia ambiental, que me leva a actuar assim, vai modificar o nosso ambiente e condiciona a criação de vácuos ecológicos, digamos assim, cujas doenças bacterianas ou foram ultrapassadas ou as próprias bactérias se adaptaram.
A vida tem mecanismos e a personalidade científica dos biologistas é extremamente exigente, pois trata-se de pessoas altamente qualificadas e competentes, com uma formação matemática que lhes permite dar este enquadramento que é extremamente difícil para um mortal como eu, por exemplo, acompanhar.
Agora, vou passar a responder à sua segunda pergunta sobre o histopatológico. Do meu ponto de vista como patologista e da experiência que tive — eu afastei-me da área da anatomia patológica veterinária, que não é a mesma coisa que a anatomia patológica animal, pois são os animais que nós utilizamos para exploração económica—, a patologia animal tem maior amplitude, mas em relação à patologia humana ela é ainda maior, uma vez que, do ponto de vista antropogénico, as exigências também são muito maiores. E, ao contrário do que acontece em Espanha, onde os patologistas espanhóis da patologia animal reúnem com os seus colegas da patologia humana, o grande drama que se opera, hoje, na sociedade portuguesa da anatomia patológica é o facto de existir essa separação.
Devo dizer que, em minha opinião, a histopatologia e a evidência morfológica ao nível óptico, isto é, ao nível do microscópio normal, são insuficientes e temos de utilizar a microscopia electrónica mesmo em relação ao problema das fibrilhas. Hoje, com as técnicas evoluídas que existem, a metodologia e a rotina, há já muitos aspectos definidos, que podem ser considerados — não direi patognomónicos, porque todos estes aspectos estão agora a nascer — mas, ao nível da biologia molecular dos estudos histomunoquímicos, pontos de identificação que podem ser precisos e que são necessários.
Portanto — e tentando já responder à pergunta do Sr. Engenheiro António Campos —, penso que é preciso ver as condições em que os estudos são feitos em Inglaterra, onde o aparecimento deste surto de doença se deve a uma razão qualquer. Aquando da visita que fiz a Compton, há já
alguns anos, tomei conhecimento de que os ingleses justificam o aparecimento da doença com a utilização de farinhas. Mas isso já os Srs. Deputados sabem!
E aproveito, desde já, a oportunidade para dizer que estou convencido que quer em Inglaterra, quer mesmo no Emirado de Omã, um dos maiores produtores de petróleo, deve existir um equipamento tecnológico e laboratorial muito superior ao nosso, que, aliás, é uma autêntica pelintrice. Não tenho qualquer dúvida disto! De facto, quando estive na Universidade de Birmingham, soube que as universidades inglesas tinham celebrado convénios com todos os emirados e com todos os países africanos, e até estou convencido de que existem patologistas britânicos a trabalhar em Omã, o que me leva a pensar que os laboratórios que lá existem devem estar muito bem equipados, muito melhor do que os nossos, até porque têm muito mais dinheiro do que nós.
Com toda a honestidade, e na qualidade de patologista veterinário, envolvido agora neste drama com que nós, os patologistas humanos, nos deparamos, devo dizer que só a histopatologia não é suficiente para resolvê-lo. O meu mestre, o Professor Renato Trincão, marcou uma época, onde tudo era definido através da identificação histológica, que era fundamental para, por exemplo, a identificação dos processos malignos ou não malignos. Isto é muito importante, mas temos de ir mais além, porque a identificação clínica de um processo fica muitas vezes aquém da identificação biológica, até porque são duas coisas completamente diferentes. Já «senti isto na pele», quando contactava com cancerosos. Muitas vezes, nos seres humanos, o processo é identificado muito tarde e o mesmo não acontece com os animais porque não os deixamos viver. Se eles vivessem, teriam o mesmo drama. Simplesmente, o que acontece é que temos de os abater em condições para os consumirmos. Trata-se, de facto, de uma ética utilitária, que é diferente da que se utiliza para com os humanos.
Respondendo agora a outra pergunta que me foi feita, e em face da consulta que fiz à Med-Line, posso dizer que, em relação à Inglaterra, não estou a pôr nada em causa, até porque mantenho ligações com a Universidade de Birmingham e com o Hospital de Saint Bartholomeo, em Londres, onde fiz o meu doutoramento, e são eles que me permitem manter-me actualizado sobre estas matérias.
Em relação ao sector veterinário, posso dizer que também tive em Weybridge, nessa atara, para estudar a planificação para a identificação do problema da radioactividade, mas não sei, exactamente, se as citações da comunidade científica, em Inglaterra, se referem só à veterinária, uma vez que há também a comunidade que está ao serviço da patologia humana, a qual é muito mais exigente e, portanto,