19 DE JUNHO DE 1993
258-(99)
O Sr. Prof. Amaral Mendes (Universidade de Évora): — As informações que obtive foram-me transmitidas verbalmente pelo Sr. Director-Geral e é ele que terá de lhe responder, bem como os patologistas responsáveis. Devo dizer que tenho o maior respeito quer pelo Professor Manuel Laje quer pelo Dr. Alexandre Galo, que estão qualificados para isto. Eu trago aqui a minha experiência, muito mais abrangente e de outras perspectivas; não venho aqui propriamente para esclarecer uma situação em que seja forçado a afirmar que não estou de acordo.
O trabalho feito pelo Professor Alexandre Galo é valioso, indispensável, mas, do meu ponto de vista e do ponto de vista comparado, sei que pode ser e deveria ter sido feito muito mais — mas, repito, de maneira nenhuma vou contra aquilo que foi feito.
A existência de doença no nosso país é uma situação diferente de haver uma doença que é importada; uma nasce no país, é autóctone, e a outra vem de fora. São duas situações que foram bem definidas pelo Professor Galo. O que temos aqui, em Portugal, é o prolongamento de uma situação que nasceu em Inglaterra e que tem de ser definida aqui. E, no meu entender, como patologista molecular e com as exigências que procuro fazer, numa perspectiva humana, digo aquilo que me parece credível e razoável.
Quanto a outras situações, há quem deva vir responder por elas, porque eu não fui conselheiro para estes assuntos, especificamente, para o Sr. Director-Geral da Pecuária, que tem os seus assessores, pelo que o problema deve ser posto de outra maneira: eu dou a minha contribuição como cientista na área de um problema que me preocupa grandemente porque as implicações são bastante sérias.
O Sr. Presidente (Antunes da Silva): —Sr. Professor, os nossos agradecimentos pelas suas declarações bem como pela colaboração prestada. Peço desculpa pelo facto de esta audição ter sido mais morosa do que tínhamos imaginado.
De seguida, vamos ouvir o Sr. Prof. Vaz Portugal, a quem começo por agradecer a disponibilidade de vir a esta Comissão de Agricultura e Mar prestar o seu depoimento, no âmbito da audição parlamentar que tem por objecto o apuramento da existência ou não em Portugal da doença denominada «vacas loucas».
Caso assim o entenda, V. Ex.a poderia começar por fazer uma exposição, após o que os Srs. Deputados, eventualmente, lhe colocarão algumas questões às quais V. Ex.° responderá globalmente no final. Desta forma, tem a palavra, Sr. Prof. Vaz Portugal.
O Sr. Prof. Apolinário Vaz Portugal (Estação Zootécnica Nacional, Vale de Santarém): — Antes de mais, quero saudar esta Comissão e dizer que, ao «reflectir» sobre a minha presença numa sessão deste tipo, resolvi trazer uma intervenção escrita sobre esta matéria. Matéria que, terei de dizer, com muita franqueza, me parece extremamente importante e que desenhou determinado tipo de cenário de actuação que não me parece ser o mais correcto, na forma e no conteúdo, como temos sido «bombardeados» pela comunicação social. Dividi esta minha intervenção em quatro pontos, e passo a abordar o primeiro: a razão da nossa presença na Assembleia da República.
Solicitado a depor sobre esta matéria, não deixo de manifestar a minha preocupação deontológica por ver assunto desta natureza ser tratado fora dos palcos adequados e onde, por uma questão científica e de ética profissional, devia ter sido tratado e esgotado em todos os seus aspectos relevantes. Uma nota prévia: há questões que são aqui colocadas e
que, compreendo isso, devem provocar extremas dificuldades por parte dos Srs. Deputados para as interpretarem. Se eu estivesse no vosso lugar, a tratar de outros assuntos, ou de outras matérias para as quais W. Ex."5 estarão certamente mais preparados do que nós, senüria dificuldades para seguir o tipo de discussão que se forja.
Mas retomemos a análise específica da matéria em discussão. Ao não ter acontecido assim, terei de considerar que se trata, na sua essência, de uma intervenção, leitura e polémica políticas, geradas e motivadas por circunstâncias que, nos locais próprios, terão de ser clarificadas, dada a forma como se formou e processou o conhecimento da documentação, a difusão da informação e a forma de divulgação do seu conteúdo. Interrogo-me se uma doença, com as características desta e seguindo, processualmente, o controlo adequado, merecia toda esta agitação de arrastamento para acontecimento político!
Como especialista veterinário da produção animal, não posso deixar de dizer que lamento os reflexos causados no sector produtivo, na sequência da imagem pública e da reacção do consumidor às situações criadas, e que exigiam uma informação e comportamentos diferentes. Importándose animais do Reino Unido, estava aberta a possibilidade, no tempo, de correr o risco de identificar a BSE em Portugal. Portanto, o problema não está apenas em haver ou não haver BSE em Portugal — está na forma como se chega e se reduziu intencionalmente o problema a este dilema. Cada país tem as suas circunstâncias (não vou trazer novidade nenhuma a esta Assembleia) e, face ao coeficiente de importação de animais vivos, nomeadamente do país infectado, expõe-se a vir a ter a doença. Assim, julgo que teria sido mais útil, com serenidade e com profundidade, acautelando sempre a imagem pública da produção animal (foi isso o que fizeram os outros países) e a salvaguarda da saúde pública, analisar os casos suspeitos, controlar os acontecimentos e evitar, sobretudo, alarmismos que, face aos dados disponíveis — insisto — exigiam mais prudência e estudo detalhado, com abertura a outra participação científica e com a profundidade resultante de outros meios a utilizar no diagnóstico.
O problema também não está apenas e só em questões como as que já ouvi esta manhã: se este diagnóstico serve ou não serve pois tudo depende das condições que se instalem para o fazer. Agora e sempre o cientista tem de ir mais longe, tem de exigir mais de si e dos outros, abrindo-se na procura da solução que tranquilize. O que se fez: o contrário! Mais: porquê esta agitação que se precipita no tempo? Destaca-se a utilização, agora, desta situação que origina, necessariamente, aproveitamento e leitura pob'ticas, face à forma como foi tratada esta matéria. Pergunta-se quem é ou quem são os responsáveis pelos acontecimentos que sc vivem? Ao provocar directa ou indirectamente a situação alarmista, gerada pela confusão estabelecida e aproveitada, quem se assume, face aos prejuízos causados ao sector produtivo, neste caso, à bovinicultura nacional e, sobretudo, à zona do minifúndio? As circunstâncias exigem outra postura, outra atitude informadva-formativa de opinião e a exclusão do aproveitamento, a que se assiste, de uma situação que de anormal só tem a forma como se interpretam e usam os acontecimentos e as decisões que geraram.
Aspectos específicos da BSE. Estas matérias já foram analisadas e tratadas por individualidades de reconhecido mérito científico e técnico, dentro desta Assembleia. O juízo de valor sobre as opiniões aqui manifestadas não pode deixar de ser feito em função da capacidade científica dos