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II SÉRIE-C — NÚMERO 33

dar lugar a aludida norma, cuja abertura viria, afinal, a dar os frutos indesejados.

72.° Com efeito, tal entendimento termina por admitir que as referidas pensões de preço de sangue são tributáveis

em IRS, na categoria H, po.r via do artigo 11.°, n.° 1, alínea fr), do CIRS.

B) Violação dos artigos 106.°, n.° 1, e 107.°, n.° 1, por desconformidade com os fins visados ao sistema fiscal e, especificamente, ao imposto sobre o rendimento pessoal.

73." Ainda que não viesse a ser acolhido o entendimento atrás perfilhado, estamos em crer, todavia, haver outras boas razões para admitir a inconstitucionalidade do preceito.

74.° Ou, dé outro modo, se não se entender que a norma em análise peca por defeito, pela falta de determinação e densificação dos elementos de incidência tributária, então, forçoso será reconhecer que é desconforme com a Constituição por excesso por comportar na área de incidência fiscal as pensões de preço de sangue.

75.° Se no passado pudemos conhecer concepções abso-lutizantes da soberania fiscal, os resultados alcançados pela evolução constitucional não se compadecem com estas no presente, nomeadamente o reforço das garantias do Estado de direito e da dignidade da pessoa humana. .

76.° Terá de compreender-se que a lei fiscal não pode tributar todos e quaisquer acréscimos patrimoniais, desinteressando-se da natureza jurídica que tenham e dos factos que lhes dão origem. Isto explica, aliás; a ausência de tributação dos actos ilícitos.

77." «Nem todas as situações da vida, abstractamente susceptíveis de desencadear efeitos tributários, podem ser escolhidas pelo legislador como factos tributáveis.» (Carlos Pamplona Corte-Real, A Reforma Fiscal e a Inerente Dignificação Científica do Direito Fiscal, Lisboa, 1983, p. 19.)

78.° O poder de tributar não reside mais numa soberania fiscal ilimitada, sob pena de se reconhecer como causa da obrigação tributária, apenas e somente, a vontade soberana do legislador. >

79.° Ora, como vimos, a pensão de preço de sangue tem a natureza de uma verdadeira indemnização compensatória pelo sacrifício infligido em nome das mais elevadas razões de interesse público em determinados interesses particulares.

80.° Sacrifício esse que em primeira linha envolve danos rião patrimoniais. .

81.° Não se apura, como tal, qualquer razão —senão numa ratione imperie — que leve à tributação de tais pensões.

82." Não se vê que.motivo imperioso exija um novo sacrifício daqueles mesmos interesses privados que as pensões de sangue pretendem compensar.

83.° Poderia contra-argumentar-se com o facto de, por meio do Decreto-Lei n.° 487/88, de 30 de Dezembro, ter sido efectuada uma majoração das referidas «pensões».

84.° No entanto, tal majoração é claramente insuficiente, tendo frustrado em muitos casos o objectivo de não fazer diminuir os montantes líquidos auferidos pelos beneficiários (artigos 3." e 4.° do Decreto-Lei n.° 487/88, de 30 de Dezembro, bem como as tabelas anexas ao mesmo diploma).

85.° A tributação das pensões de preço de sangue não pode deixar de colidir com os-fins visados ao sistema fiscal pelo artigo 166.°, n.° 1, da Constituição.

86." O sistema fiscal português fiá-de obedecer, nos termos daquele preceito, a duas coordenadas fundamentais, de forma cumulativa.

87.° Por um lado, as receitas provenientes da tributação hão-de ter como destino «a satisfação das necessidades financeiras do Estado e outras entidades públicas» (ar-

tigo 106.°, n.° 1, da CRP).

88.° Por outro, visará promover uma «repartição justa dos rendimentos e riqueza» (artigo 106.°, n.° l, infine, da CRP).

89." Pois bem. Não se vê como possa ser justa a repartição de uma compensação pelos danos morais que sofreram e sofrem os beneficiários de uma pensão de preço de sangue.

90." E a injustiça de tal solução será tão mais evidente quanto as lesões perpetradas nas esferas jurídicas de tais pessoas não focam, nem serão nunca repartidas entre todos, nem completamente ressarcidas.

91." Quanto ao artigo 107.°, n." 1, CRP, a desconformidade será, porventura, mais velada, mas não deixa de se fazer sentir.

92." Isto, porquanto o imposto sobre o rendimento pessoal é, no espírito e na letra da Constituição, úm instrumento privilegiado para alcançar a «diminuição das desigualdades».

93." E, mais que isso, a lei fiscal em matéria de imposto sobre o rendimento pessoal está vinculada nesse sentido.

94.° Ora, se ao artigo 11.°, n.° 1, alínea b), do CIRS for permitida a tributação das pensões de preço de sangue, estão parcialmente a desvirtuar-se estas mesmas pensões naquilo que elas pretendem obter.

95." O falecimento do «militar ao serviço da Nação» ou «do civil incorporado em serviço nas forças militares» [artigo 2.", n." 1, alíneas a) e b), do Decreto-Lei n.° 404/ 82, de 24 de Setembro] coloca as pessoas referidas no artigo 4°, n." 1, em situação de desigualdade pela perda irreparável sofrida.

96." O superior interesse nacional defendido em situação de guerra pelo militar ou pelo médico «no combate de quaisquer epidemias de moléstia infecciosa ou contagiosa contraída em serviço público de assistência sanitária» [artigo 2.°, n.° 1, alínea e), do Decreto-Lei n.° 404/82, de 24 de Setembro] onerou de modo igual a comunidade.

97." O interesse público terá feito pesar encargos a uns mais que a outros e, na medida do possível, pretende compensar os primeiros, atribuindo-lhes a referida pensão de sangue.

98.° Escapa ao bom entendimento — parece-nos — que tais pessoas tenham de contribuir, nessa parcela do seu património, para a satisfação das necessidades públicas e correcção das desigualdades.

99.° Estaria, aí, então, a visar-se a diminuição de algumas desigualdades pelo incremento injustificado de outras.

100 ." Tudo isto vai ao encontro —estamos em crer — das palavras de Gomes Canotilho e Vital Moreira, quando afirmam:

Quanto ao princípio da necessidade, parece ser cabido aplicar-lho, não sendo concebível um imposto arbitrário, um imposto pelo imposto, que não seja exigido pelos objectivos dos sistema fiscal. [Consumição da República Portuguesa Anotada, 2.' ed., Coimbra Editora, 1984, p. 464, anotação vn ao artigo 106.°]

101.° Assim sendo, por desrespeitar os objectivos enunciados ao sistema fiscal, nomeadamente «ajusta repartição