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19 DE OUTUBRO DE 1996

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Nesta perspectiva, mais se consignou que a «perda de mandato», tivesse esta a origem factual que tivesse, seria decidida e declarada pela Mesa da Assembleia da República, que deveria, obrigatoriamente, obter parecer prévio da Comissão de Regimento e Mandatos (previsto, aliás, naquele artigo 38." do Regimento) e conformar-se com o disposto no Estatuto dos Deputados.

Este sistema jurídico era claro, tinha unidade e não suscitava dúvidas.

2 — No final da legislatura anterior, a Assembleia da República resolveu alterar este sistema. Foi tempo de, com pompa, se imaginar e fazer aprovar um conjunto de leis cognominado «legislação para a transparência e moralização da vida política».

Entre essas leis surgiu então a Lei n.° 24/95, de.18 de Agosto, que, introduzindo alterações apenas no Estatuto dos Deputados, essencialmente contemplou três tipos de questões:

a) Deu nova redacção ao seu artigo 21.°, o qual, mantendo a subordinação à epígrafe «Impedimentos», ampliou, todavia, o número de casos em que se devia considerar estes existirem;

b) Criou um «registo de interesses», como obrigação a cumprir pelos Srs. Deputados;

c) Criou também a Comissão de Ética.

A esta última atribuiu, sobretudo, duas competências: a de verificar os casos de impedimento e, em caso de violação, instruir os respectivos processos; tratar de todos os assuntos relacionados com os chamados e caracterizados «interesses» dos Srs. Deputados.

3 — Para o que agora nos interessa, torna-se evidente que os legisladores quiseram rever apenas o regime legal dos «impedimentos» constantes do Estatuto dos Deputados, relativos aos interesses privados dos Srs. Deputados.

Sem qualquer alteração ficaram os regimes legais das «incompatibilidades» e das «incapacidades».

Todavia, na vertigem de final de legislatura, os legisladores ter-se-ão esquecido de irjtroduzir as adequadas alterações nas disposições normativas constantes do Regimento da Assembleia da República relacionadas com esta problemática dos «impedimentos».

Certo é, porém, que, com notória redundância, na nova redacção do artigo 2Í.° do Estatuto dos Deputados cominou-se com a-sanção de «perda de mandato» a infracção de qualquer dos novos e antigos «impedimentos» — o que não era necessário, pois tal sanção já estava prevista para esses casos no artigo 8.°, n° 5, do mesmo Estatuto dos Deputados, que não sofreu alteração.

Mas, mais grave:

Se à Comissão de Ética foi então expressamente atribuída a competência para a instrução dos processos relativos à violação dos casos de impedimento;

Não se alterando, como efectivamente não se alterou, o normativo constante do artigo 38.°, alínea d), do Regimento da Assembleia da República;

ter-se-ia mantido a competência da Comissão de Regimento e Mandatos para a instrução dos mesmos processos.

Ou seja: a ser tomado à letra o Regimento e não curando de saber se a nova Lei n.° 24/95 teve ou não alguma influência sobre aquele; numa interpretação puramente literal de ambos os textos legais, teria'passado a haver duas comissões parlamentares, com competências idênticas ou sobreponíveis, para a instrução dos processos relativos aos impedimentos.

4 — O mesmo acontece, necessariamente, quanto à qualificação jurídica dos factos apurados nessa instrução processual.

Verificar se existe ou não um impedimento, como a Lei n.° 24/95 veio expressamente esclarecer constituir agora competência da Comissão de Ética, não é, não pode ser outra coisa senão proceder à aplicação da lei aos^ factos apurados; para essa verificação tem, forçosamente, de se julgar se estes factos se enquadram ou não nas situações previstas genericamente na lei; e esta «verificação» tem inerente a capacidade e a possibilidade de a Comissão de Ética definir, sempre que necessário, o âmbito e o alcance em concreto das genéricas previsões normativas sobre os «impedimentos».

Acontece que, não se alterando, como efectivamente não se alterou, o disposto no artigo 38.°, alínea c), e no artigo 4.°, n.° 3, do Regimento da Assembleia da República, ter-se-ia mantido a competência da Comissão de Regimento e Mandatos para proceder a essa mesma «verificação» sobre a existência ou não de um impedimento.

Ou seja: a ser tomado à letra o Regimento e não curando de saber se a nova Lei n.° 24/95 teve ou não influência sobre aquela, numa interpretação puramente literal de ambos os textos legais, teria passado, pois, a haver duas comissões parlamentares com competências idênticas ou sobreponíveis, para a «verificação» dos impedimentos.

5 — Se fosse esta a interpretação a dar aos textos legais em referência, então ninguém de bom senso poderia deixar de considerar que estaríamos perante um absurdo sistema jurídico de sobreposição e de identidade de competências entre duas comissões parlamentares distintas, no âmbito do qual ambas seriam responsáveis pela instrução dos mesmos processos relativos aos «impedimentos» e pela «verificação» destes.

Não pode ser, até porque, como reconhece o Sr. Deputado Barbosa de Melo no seu parecer (p. 5), «o admitir--se aqui uma competência paralela ou concorrente da 1.* Comissão [com a Comissão de Ética] conduziria, inevitavelmente, a disfunções [...] que não favoreceriam a transparência e a moralização da vida parlamentar». • Estamos perfeitamente de acordo!

6 — O Sr. Deputado Barbosa de Melo procurou, pois, resolver tal absurdo, mas, infelizmente:

a) Por um lado, aborda esta problemática principalmente sob o prisma da competência para a «verificação» de um impedimento ou, o que é o mesmo, sob o prisma da competência para dar parecer sobre a existência ou não de um impedimento;

b) Por outro lado, desprezou por completo o estatuído no artigo 38.°, alínea d), do Regimento da Assembleia da República, no qual expressamente se atribui à Comissão de Regimento e Mandatos (hoje integrada na 1." Comissão) a competência para a instrução de todos os processos de perda de mandato e, assim, também para a instrução dos processos relativos aos «impedimentos» que, como atrás se anotou, determinam a perda de mandato.

Nestas condições, no parecer em referência o absurdo da mencionada sobreposição de competências é resolvido com esta fórmula simplista:

«O círculo demarcado pela instrução do processo (relativo aos impedimentos) deve ser entendido como reserva própria da competência da Comissão de Ética», porque como tal está definido no novo