18 DE JANEIRO DE 1997
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de Deputado à Assembleia da República em simultáneo, em acumulação e pela mesma pessoa.
Dada, porém, a legitimidade e a justificação das dúvidas apresentadas pelo Sr. Deputado Alvaro Barreto [...] concedeu-lhe o prazo de 30 dias para pôr termo a tal incompatibilidade (...] pela suspensão ou renúncia, ou daquele cargo ou deste mandato.»
O Sr. Deputado Álvaro Barreto suspendeu durante algum tempo o seu mandato de Deputado, mas acabou por retomar o respectivo exercício. O Presidente da Assembleia da República solicitou então o parecer da 1." Comissão, em cumprimento do disposto no artigo 38.°, alíneas é) e d), do Estatuto dos Deputados, e esta Comissão emitiu também o seu parecer, por imposição da referida alínea c).
5 — Principais argumentos técnico-jurídicos da 1.* Comissão a fundamentar a conclusão de que não existe a incompatibilidade que a Comissão de Ética entendeu existir:
A Lei n.° 7/93, de 1 de Março (Estatuto dos Deputados), já tinha de facto declarado que existia incompatibilidade entre o mandato de Deputado e o exercício de funções de «membros dos conselhos de gestão das empresas públicas, das empresas de capitais públicos ou maioritariamente participadas pelo Estado e de instituto público autónomo». [Artigo 20.°, alínea p).)
Mas não é exacto que a redacção da alínea a) do n.° 2 do artigo 21.°, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.° 24/95, de 18 de Agosto, não inove em relação ao que já constava da transcrita alínea p) do artigo 20.° da Lei n.° 7/93.
Pelo contrário, o seu objectivo foi indubitavelmente o de «alargar as incompatibilidades a todos os órgãos das pessoas colectivas públicas, sociedades de capitais maioritária ou exclusivamente públicos, em vez de se aplicarem apenas aos conselhos de gestão, e ainda [...] aos titulares de pessoas colectivas públicas e concessionárias de serviços públicos.
A dúvida reside na clarificação do sentido a conferir às expressões 'empresas de capitais públicos' e 'empresas de capitais maioritariamente participadas pelo Estado' [artigo 20." da Lei n.° 7/93] quando confrontadas com a expressão 'sociedades de capitais maioritária ou exclusivamente públicos' utilizada na alínea a) do n.° 2 do artigo 21.° da Lei n.° 24/95.
A expressão 'empresa de capitais públicos' é identificável com a de 'sociedade de capitais exclusivamente públicos' ou com a de 'empresa pública'.
Já no que se refere às empresas de capitais maioritariamente participados pelo Estado, que não empresas públicas, ai ideia de participação maioritária do Estado [e não se diz participação dominante do Estado (cf. artigo 486.° do Código das Sociedades Comerciais)] inculca a necessária interpretação literal, identificável com sociedade de capitais maioritariamente públicos.
Vai nesse sentido (da interpretação literal) a doutrina, que, ao identificar as sociedades de economia mista, distingue as empresas com participação de capital público em empresas controladas (se, pela detenção do capital, bs poderes públicos exercem sobre ela um efectivo controlo) e empresas participadas (se o capital público não permite o controlo público da empresa).» Ainda que maioritário, subentende-se. Isto é: da maioria do capital de certa sociedade não decorre necessariamente o controlo dela.
[A 1." Comissão retira da efectiva existência de novidade da redacção da alínea a) do n.° 2 do artigo 21.°
da Lei n.° 24/95, relativamente à alínea p) do artigo 20.° da Lei n.° 7/93 (Estatuto dos Deputados), a total desvalorização do argumento da Comissão de Ética, em abono da sua tese, deduzido a partir do falso pressuposto da inexistência de qualquer novidade).]
Relativamente ao argumento da Comissão de Ética no sentido de que o legislador terá sobreposto a consideração das possibilidades reais às legais ou estatutárias para aferir do risco de uma relação de dependência entre o Deputado que é simultaneamente administrador de uma sociedade de capitais maioritariamente participada pelo Estado e o mesmo Estado, a 1.' Comissão perfilha e defende a tese contrária, isto é, a da sobreposição do disposto na lei ou nos estatutos da sociedade de que se trate a considerações decorrentes de uma concreta situação real.
Para o efeito, começa por socorrer-se do parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria Geral da República n.° 83/93, de 10 de Maio de 1996, o qual discorre precisamente sobre «o significado da expressão [...] 'sociedade anónima de capitais exclusiva e maioritariamente públicos', no contexto de uma indagação em tudo paralela à que neste momento nos compete: o regime de incompatibilidades e impedimentos dos titulares de cargos políticos e altos cargos públicos».
E assim para concluir que também aquele venerando Conselho começa por clarificar que a «alternativa apresentada» quanto à interpretação daquela expressão consiste em «apurar se ela pode representar uma mera situação de facto, variável em função de operações de compra e venda de acções no respectivo mercado, ou se a mesma tem de corresponder a uma situação juridicamente definida, abrangendo apenas os casos em que sejam a lei ou os estatutos da sociedade a determinar que o seu capital tenha de pertencer exclusiva ou maioritariamente a entidades públicas».
«A melhor interpretação — aí se diz — é claramente a segunda», militando desde logo a favor desta «um argumento literal, que não pode ser desagregado».
Acrescenta-se no mencionado parecer que «o entendimento a ela contraposto daria azo a uma situação de insegurança deveras intolerável». E é sabido que «a segurança é um dos valores do direito».
Essa insegurança — reforça — manifesta-se a dois títulos: «O da susceptibilidade de constante (porventura mesmo diária) variação de situação das sociedades em causa e o da inviabilidade do atempado conhecimento, a cada momento, dessa situação.
À insegurança relativa às situações em si mesmas consideradas acresceria a insegurança respeitante ao conhecimento que acerca delas poderiam ter, ou não ter, em cada momento, as entidades interessadas.»
Os próprios titulares de cargos políticos teriam dificuldades em saber de ciência certa «se estariam ou não afectados por incompatibilidades» semelhantes aquela sobre a qual a Mesa tem de pronunciar-se. (Dado o dinamismo do mercado das acções, poderiam, em sede caricatural, estar num dia sim noutro dia não!)
A mesma Procuradoria-Geral da República poderia, enquanto órgão fiscalizador, ver-se em apuros para saber se ocorria ou não infracção a demandar «o desencadeamento do processo sancionatório legalmente previsto».
Quanto à defesa pela Comissão de Ética da'tese de que a expressão «sociedades de capitais maioritariamente públicos» deve ser interpretada no sentido de abranger tanto a participação directa como a indirecta fui supra) a