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0460 | II Série C - Número 038 | 12 de Abril de 2003

 

No polo oposto, há os que levam a ideia do serviço público até às últimas consequências.
Neste sentido, e dado que o mesmo foi atribuído, desde sempre, à RTP, há quem defenda que todas as acções da RTP, do campo do investimento à área da produção, são serviço público, pela simples razão de que seriam (mas todavia, não são) pressuposto da sua realização.
É uma concepção formal e maximalista, que não ajuda a clarificar quaisquer ideias sobre o assunto, para além de levar a hipóteses absurdas como considerar alguns programas, de violência ou outros similares, como uma manifestação desse mesmo serviço prestado ao público.
Mas, para além disso, é uma concepção falaciosa, na medida em que inevitavelmente leva à identificação desse serviço com a concentração numa única entidade de todas as infra-estruturas susceptíveis de contribuir para a prestação do mesmo, mas da qual o público em nada beneficia.
É esta concepção desajustada do serviço público que leva à criação de infra-estruturas e aparelhos produtivos (ou não produtivos) pesados, burocratizados, lentos, desorganizados, caros e desproporcionados aos serviços que prestam.
É esta ainda uma concepção que não leva à distinção na empresa do que lhe é essencial e do que é acessório (sendo que em qualquer ser ou ente há que distinguir a substância do acidente), e no caso da RTP, não leva a que se distinga entre o que só ela pode fazer e o que outrem fará melhor e mais barato.
É, aliás, uma concepção que justifica as suas raízes no tempo histórico em que a empresa nasceu, num país pouco desenvolvido e pouco dotado de pessoas com formação específica nos vários ramos em que se desdobrava a actividade da televisão e, naturalmente, se fortaleceu e cristalizou com o decorrer dos tempos.
As empresas com forte cultura e administrações fracas não se dão geralmente conta das alterações do quadro em que actuam e, em economia livre, acabam por sossobrar.
O país evoluiu, novos métodos de trabalho apareceram, o know-how em matéria televisiva tornou-se acessível, equipamentos mais ligeiros inundaram o mercado, em suma, o hardware televisivo deixou de ser algo de distante e tornou-se instrumento do dia a dia fora das estações de televisão.
Chegou-se, pois, a um quadro em que foi ultrapassada a concepção magestática que esteve na base do início de funcionamento da RTP (e que tinha o seu fundamento, como atrás se referiu), empresa de serviços e empresa industrial, na qual confluíam a emissão de programas, mas também a sua produção, a rede de emissão, mas também a sua concepção e construção, a cobrança de taxas e as montagens cenográficas, a carpintaria e a criatividade da realização e até a venda de televisores, tudo justificado pela criação de condições para o exercício do serviço público.
Confluíam e, lamentavelmente, ainda confluem (com excepção da Rede de Emissão e das Taxas)!...
Trata-se de uma filosofia que estaria colocada totalmente em causa por uma gestão adequada, ou então, e à falta desta, quando se fizesse sentir uma maior vigilância sobre os custos e benefícios da actividade da empresa, levando a comparações que não fossem de molde a admitir subvenções estatais desadequadas ao serviço prestado.
Caberia à RTP organizar-se de molde a que o serviço público que lhe está cometido, e que essencialmente se traduz na emissão de programas e na produção e emissão de informação, se fizesse com a maior qualidade e o menor custo.
O que a levaria a ponderar sobre o destino a dar ao que lhe é acessório e instrumental: a produção de programas, a distribuição dos mesmos, a manutenção de um arquivo audiovisual, etc.
A abertura da televisão à iniciativa privada poderia ter sido uma ocasião soberana para alterar o estado das "artes".
Todavia, tal oportunidade não foi devidamente aproveitada para tal fim, nem, nos anos posteriores, o estado das "artes" foi também alterado.
Com efeito, não se definiu a natureza do serviço público de televisão atribuído à RTP, nem se deu a consequente reestruturação da empresa, nem nessa época nem posteriormente.
Por outro lado, não foi criado um modelo novo de televisão, antes surgiu um modelo ambíguo e híbrido, o qual persistiu até ao momento, por nunca corrigido (excepcionando as medidas tomadas nos últimos meses).
Ambíguo e híbrido, porque baseado em graves equívocos, e porque baseado em equívocos, gerador de alguns paradoxos.
Falemos primeiro dos equívocos.
Por economia de prosa, referirei apenas os dois seguintes:

Primeiro equívoco: Traduzido na definição implícita do novo modelo como uma mera justaposição ao existente, e não como algo enformador de uma nova realidade.
Segundo equívoco: Derivado naturalmente do primeiro, e que foi manter o serviço público de televisão com a mesma extensão e compreensão que a RTP lhe dava e face a uma realidade que não iria ter nada a ver a existente.

A abertura da televisão à iniciativa privada, mais do que um fim em si, deveria significar a oportunidade de provocar uma rotura com o modelo existente de serviço público, baseado numa estação propriedade do Estado e detentora do monopólio.
Para construir, como pareceria curial, um modelo novo, o modelo existente ou teria que desaparecer ou adequar-se ao que viesse a ser implantado; no entanto, não foi isso que aconteceu, já que se partiu do princípio de que o que estava era de manter, arranjando-se um novo modelo por justaposição ou adição de um novo segmento. No que deixou esse modelo falho de qualquer lógica, sem consistência e sem coerência (ou com a pseudo coerência dos modelos ecléticos).
Por outro lado, ao não definir ou delimitar a extensão e compreensão do conceito de serviço público, o resultado foi perpetuá-lo com o mesmo conteúdo que a RTP lhe vinha dando, o que significou levá-lo até às últimas consequências. E as últimas consequências corporizavam-se na concepção formal e maximalista, mas que constituía doutrina da nossa estação pública, de que todas as acções da RTP, do campo da programação à área do investimento, eram serviço público.
Esta concepção falaciosa do serviço público (porque assente numa confusão entre o substancial e o instrumental, e porque identifica a essência do serviço com as infra-estruturas que o servem, como atrás se referiu), se esteve no passado na base da concentração numa única entidade de todo o hardware susceptível de contribuir para a prestação do mesmo (construção e propriedade da rede de emissão, produção de programas propriedade e exploração