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19 DE FEVEREIRO DE 2005 11 __________________________________________________________________________________________________

Seja qual for a leitura jurídica que se faça desta situação, a verdade é que para muita gente se trata de uma interferência no poder judicial, o que põe em causa a credibilidade da justiça. Compreende-se, assim, que no Relatório do Secretário-Geral das Nações Unidas sobre a evolução da situação na Guiné-Bissau, de 13 de Dezembro de 2002, se considere que o STJ não é um tribunal independente.

A questão das relações entre o Presidente da República e o Supremo Tribunal de Justiça foi de tal modo importante que mereceu a análise da Assembleia Nacional Popular, que através da Resolução n.° 11/PL/ANP/2001, de 23 de Outubro, condenou a exoneração e nomeação de juízes do STJ pelo Presidente da República como violação da Constituição e da lei e um atentado grave «contra o regime democrático, a estabilidade política e o primado do diálogo».

A resolução acima referida traduz um conflito aberto não só entre o Presidente da República e os tribunais, mas também, agora, entre o Presidente da República e o Parlamento.

O conflito com o Parlamento é patente não só na condenação pelo órgão representativo da Nação dos actos de nomeação e exoneração de Juízes do Supremo Tribunal de Justiça, como actos inconstitucionais e de interferência no poder judicial, como também no facto de o Presidente da República ter-se negado a promulgar o texto de uma lei de revisão constitucional, aprovada a 5 de Abril de 2001, quase por unanimidade dos deputados presentes. O conflito constitucional tem concretamente a ver com dois pontos essenciais que retiram alguns poderes ao Presidente da República:

a) O Presidente deixa de poder presidir ao Conselho de Ministros, sempre que o entender; b) O Presidente deixa de poder nomear os embaixadores mediante mera audição não vinculativa do

Governo, para passar a nomear os embaixadores sob proposta do Governo. A Constituição da Guiné-Bissau prevê um prazo de 30 dias para o exercício do direito de veto. Consta que

neste prazo o Presidente da República nem promulgou nem exerceu o direito de veto expresso. Aliás, é duvidoso que o Presidente da República tenha poder para vetar uma lei de revisão constitucional, de mais a mais por razões meramente políticas.

Em nosso entender, o conflito poderia ser resolvido quer com a simples promulgação do acto em tempo devido pelo Presidente da República quer ainda com um compromisso, quanto à data da entrada em vigor das emendas que afectarem sensivelmente os poderes do Presidente eleito. Este foi eleito à sombra de um dado quadro de poderes e não aceita pacificamente que lhe seja no meio do mandato alterado o volume de poderes de que dispõe. Por outro lado, a Assembleia Nacional Popular não aceita que o seu poder de revisão fique condicionado à vontade de um outro órgão de soberania que não detém poderes de revisão.

Estes dois conflitos estão aparentemente na origem não só da dissolução do Parlamento da Guiné-Bissau, como também de um conjunto de práticas relacionais que afectam o normal funcionamento das instituições da República, como adiante se verá.

Assim, a 19 de Setembro de 2002, através do Decreto-Presidencial n.° 44/2002, o Presidente da República dissolveu a Assembleia Nacional Popular, tendo estabelecido de imediato que as eleições legislativas antecipadas se realizariam no prazo de 90 dias a contar da data da entrada em vigor do decreto-presidencial. No seu decreto o Presidente da República alega uma pretensa «falta de credibilidade e de confiança» das instituições da República e particularmente da Assembleia Nacional Popular e do Governo do seu próprio partido, para concluir que havia uma crise política grave.

Na mesma data foi exonerado o Primeiro-Ministro e nomeado um novo Primeiro-Ministro para gerir os assuntos correntes e garantir condições para a realização do acto eleitoral.

A relação entre os titulares dos mandatos da Assembleia Nacional Popular dissolvida e o Presidente da República parece não terem-se desenvolvido normalmente. Assim, segundo informações recolhidas, a Assembleia Nacional Popular é considerada como ex-Assembleia, como o «de cuius» Parlamento…, o Presidente da Assembleia como ex-Presidente da Assembleia. O mais grave é que terão sido incumpridas as regras de substituição interina do Presidente da República nas suas ausências ao exterior, atribuindo-se tal competência ao Primeiro-Ministro, e não ao Presidente da Assembleia Nacional Popular, como decorre da Constituição (Artigo 71.°). Além disso, consta que o Parlamento deixou de ser convidado para certos actos oficiais. Acresce que os deputados há mais de sete meses que não recebem quaisquer salários, o mesmo acontecendo também aos funcionários e membros da Comissão Nacional de Eleições.

É num contexto destes que, a 30 de Dezembro de 2002, invocando uma «intervenção do Presidente da República relativa à necessidade de se efectuar uma auditoria a nível da Assembleia Nacional Popular», foi produzido um despacho conjunto do Conselheiro-Presidente do Tribunal de Contas, do Ministro da Administração Interna e do Procurador-Geral da República com vista à realização de uma auditoria ao Parlamento no prazo de 60 dias.

Este despacho conjunto causa alguma perplexidade e interrogações sobre o objectivo concreto da medida. Perplexidade porque não é normal um despacho de mão-conjunta entre titulares do Poder Judicial e do Executivo, interrogações, porque não se pode deixar de notar que a auditoria se vai realizar no período que antecede a apresentação de listas de candidatos para o próximo Parlamento.

A situação da Guiné-Bissau é ainda preocupante em virtude de acontecimentos que têm tido lugar relativamente à imprensa. Assim, a Rádio Bombolom, emissora privada de larga audiência no país, foi