O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

II SÉRIE-C — NÚMERO 16

16

Citando Flávio Almada “Quanto à habitação, as pessoas tentam alugar as casas e é-lhes dito: «Não posso

alugar a casa, porque, sabe, o último negro que esteve aqui causou problemas»“.

Territorialização periférica de bairros e “acampamentos”

A localização territorial dos bairros de habitação social, de habitação não clàssica e de habitação de génese

ilegal, situa-se, na maior parte dos casos, na periferia da malha urbana das localidades. Nas Áreas

Metropolitanas de Lisboa e do Porto, a maioria destas realidades habitacionais encontram-se em concelhos

periféricos das cidades de Lisboa e do Porto, mas também nas periferias desses mesmos concelhos, longe das

centralidades. Realidade que também se observa noutras cidades do país, como, por exemplo, em territórios do

Algarve e em Coimbra.

No interior do país, em zonas menos urbanas, estes aglomerados populacionais estão normalmente

afastados das localidades, muito em particular os “acampamentos das comunidades ciganas”.

Esta organização territorial tem em si mesma fatores de segregação associados, porque afasta as pessoas

que aqui vivem dos centros urbanos habitados pela comunidade maioritária, promove o isolamento destas

comunidades e o surgimento de “culturas de bairro” com códigos e vivências próprias, isola as crianças e

concentra-as em determinadas escolas mais próximas, e, reproduz modelos de pobreza e de exclusão.

Muitas vezes, no que diz respeito à qualidade dos meios e serviços que servem estes bairros, há um

decréscimo de qualidade e acesso, nomeadamente, nas acessibilidades, há pouca resposta de transportes

públicos e o acesso ao mesmo é mais dificultado, por vezes não há transporte escolar e as crianças distam

alguns kms das escolas que frequentam, e, na maioria destes locais, sobretudo quando estão longe das

centralidades urbanas, não há serviços públicos e comércio disponível.

Diz Flávio Almada sobre este tema: “Ainda em relação à habitação, por exemplo, quando se faz o

realojamento, nós chamamos àquilo de arquitetura policial ou urbanização policial, porque tem uma saída e uma

entrada e, quando a polícia as fecha, é para toda a gente, e transformando-os em guetos. Não é apartheid

jurídico, mas é um apartheid de facto, porque é segregação. A partir das nove e meia, 10 horas da noite, quase

não tens transporte, estás muito longe e como é que uma pessoa vai sair? Estamos a falar da questão da

mobilidade. Para além disso, na periferia, o transporte é mais caro, e estes são problemas concretos”.

Acrescenta: “Também assistimos a várias outras coisas, porque estão interligadas. Tem a ver com a

educação, com a forma como se organiza o território, com as políticas de educação, com a criminalização da

juventude negra neste país, porque as pessoas, se ficam nos bairros (…) é porque quando cinco jovens negros

vêm para o centro de Lisboa, são perfilhados de criminosos. Isso é um facto, são coisas a que assistimos

diariamente, é uma coisa sistemática, uma dominação estrutural. Se for para resolver coisas concretas, que

sejam palpáveis, que alterem a condição material e de vida das pessoas, sim; o resto pode ser manobra política”.

Ainda na audição a afrodescendentes e à comunidade brasileira, diz Jakilson Pereira, “Mas as pessoas

socialmente, dentro do tecido social, estavam melhor quando viviam na Pedreira dos Húngaros do que em Porto

Salvo. Isto porque, as pessoas estavam no centro, tinham acesso a muitas coisas, a relação com as instituições

era muito mais fácil, e agora colocam as pessoas em sítios onde, a partir das 9 da noite, não há transporte. Isso

aconteceu no período da crise, por exemplo, em Mira-Sintra, que é um exemplo tão claro. Em Mira-Sintra,

chegou-se a um momento em que a CP teve que tomar decisões. Ao sábado e ao domingo não há comboio, as

pessoas têm comboio só de segunda a sexta para virem limpar no centro. As pessoas não têm direito ao lazer

e a outro tipo de acessos, e isso tem repercussões na saúde mental da nossa comunidade”.

Sobre o Alentejo e a realidade das comunidades ciganas, refere Prudêncio Canhoto, “Falando do distrito de

Beja, tenho comigo fotografias que, depois, posso mostrar, dos acampamentos. Este distrito tem muitos

acampamentos ciganos, onde há muitas barracas e panos de lona. Temos o Bairro das Pedreiras, que se fez

para os ciganos. Fez-se um gueto, está ali, fora do perímetro urbano, onde só lá vai quem tem interesse, por

exemplo, para procurar votos. Quanto ao resto, ninguém passa por lá. E vocês sabem que este bairro foi

construído, são 50 habitações que têm mais de 500 ciganos. Só vêem que há ali um acampamento. É do

conhecimento de várias pessoas, mas, para terem uma noção, no acampamento que está ao lado desse bairro,

já estão mais pessoas fora do que dentro das casas”.

E acrescenta, “As câmaras estão limitadas, não têm dinheiro — é o que eles dizem. O Governo tem dois

programas — e eu pensei, no ano passado, «Agora é que é!»: o 1.º Direito e o Porta de Entrada. Pensei: «Agora

é que vai ser feita qualquer coisa». Já passou um ano e o que foi dito na Câmara Municipal de Beja é que vão