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II SÉRIE-C — NÚMERO 16

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História e memória

O Professor aborda outro aspeto que diz central que se prende com a história e a memória, através do

processo educativo “no seu sentido mais lato”, referindo duas vertentes:

“Uma, que está mais do que estudada, nomeadamente pelas pessoas presentes, tem a ver com os manuais

de História e de ensino, em geral — não é só na História — e que precisam ser abordados de forma crítica,

provavelmente sob a forma de recomendações, feitas por uma autoridade que tenha não a capacidade de impor,

legalmente, as mudanças, mas a capacidade de as recomendar, com autoridade moral. Isso seria qualquer

coisa indigitada pelos órgãos de soberania, como é evidente, desde logo pelo Parlamento ou pelo próprio

Governo, em que, efetivamente, haja um livro branco ou uma comissão que faz as recomendações que, em

grande medida, já estão coligidas em trabalhos de muitos colegas — nomeadamente a Marta, aqui presente —

mas que transforme isso numa recomendação sobre como lidar com a nossa História de uma forma mais crítica,

mais plural e que assuma os legados que temos”.

A outra vertente prende-se com, “também a nível da educação, no seu sentido mais geral, tentarmos

ultrapassar um nível basicamente humanista da forma como combatemos o racismo, que é a formação,

nomeadamente aquela que é dirigida às crianças, que tem muito a ver com a crítica da noção de raça, com a

definição da humanidade comum, de todos, com a crítica do racismo interpessoal e com a demonstração de

pluriculturalidade e interculturalidade, entre outros”.

“Temos de ir um pouco mais longe na definição do que é o racismo estrutural e o racismo institucional, como

é que eles se reproduzem e como é que a alteração nessas situações pode, então, ela, sim, levar ao princípio

do fim dos racismos interpessoais. Porque estamos, sistematicamente, a começar pelo fim e não pelo princípio,

e isso parece-me ser um erro que, aliás, acontece em muitos países, mas não tão mal como entre nós”.

Ação positiva

Outro aspeto referido por Miguel Vale de Almeida é a necessidade de ação positiva no âmbito do racismo e

da discriminação étnico-racial. Diz o orador: “Além da questão fulcral da história e da memória, e da educação

não só escolar, mas também da formação antirracista que vá mais fundo no plano estrutural e institucional,

temos a questão da ação afirmativa ou da igualdade de oportunidades, que é uma expressão que sempre se

usou mais em Portugal, e que, pura e simplesmente, não existe ao nível das questões do racismo. Isso é uma

grave falha da democracia portuguesa. Há muitas razões que explicam essa falha, a negação em que, a seguir

ao 25 de Abril, ficámos em relação a estas questões — isto era toda uma outra conversa —, mas, efetivamente,

a ação afirmativa no plano da habitação, do emprego, da educação, da política, entre outros, são questões que

têm de ser discutidas rapidamente, e há dois planos em que isso pode, desde logo, ser feito”.

Refere o primeiro plano em que o tema deve ser discutido: “Um deles, que é começo, o conhecimento da

realidade, tem a ver com esta discussão em torno dos censos e das categorias étnico-raciais. (…) Através de

um processo de reflexão e, sobretudo, contactando as pessoas que têm verdadeiro interesse na questão, que

são as pessoas racializadas, acabei por mudar a minha opinião e creio que uma das primeiras políticas

experimentais de ação afirmativa que poderemos fazer a seguir à inclusão das categoriais étnico-raciais nos

censos, podia ser, justamente, tal como no Brasil, a introdução de quotas no acesso universitário. Os sistemas

de acesso são diferentes, mas é uma instituição, a universidade, onde é possível tentar isto de uma forma menos

problemática ou criadora de menos resistências sociais imediatas e, sobretudo, usando o critério que no Brasil

foi utilizado, que é a justaposição entre critérios socioeconómicos — chamemos-lhe de classe — e critérios de

racialização, sob a forma de autoidentificação”.

Agenda política

Miguel Vale de Almeida diz que há um terceiro nível de intervenção, que é a inclusão do racismo na Agenda

Política de uma forma transversal, “Um terceiro nível, portanto, além da memória e da história, além da ação

afirmativa, é, de facto, a inclusão de tudo isto na agenda política, que é um plano não só, passe o pleonasmo,

político e, nesse sentido, importante, mas também com uma importância simbólica muito grande para a

pedagogia social. Isto é daquelas coisas que, enfim, pode-se apenas recomendar, pedir, e implorar que alguns

partidos políticos incluam, com clareza, prioridade e destaque, nas suas agendas políticas — nomeadamente,

nos programas eleitorais, mas depois, também na sua ação política —, o reconhecimento da existência de um

problema de racismo, bem como o desejo dessa comunidade - imaginada como sendo, também,