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78 II SÉRIE-OE — NÚMERO 2

Sr. Presidente, vou tentar dizer em 5 minutos o que penso, pedindo a sua compreensão para o facto de não termos utilizado todo o tempo na intervenção anterior, mas vou tentar ser muito sintético.
Não sou membro desta Comissão, pelo que intervenho como Deputado mas até mais como professor universitário e presidente de uma unidade de investigação financiada pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT) e, portanto, avaliada internacionalmente. Por isso, sei alguma coisa do que estou a falar, aliás, como todos os que aqui estão presentes.
Em primeiro lugar, quero dizer que considero que este Orçamento tem três características que marcam o seu modelo: um corte entre 3,5% e 4% no funcionamento das universidades e dos politécnicos; um reforço bastante substancial do investimento em ciência e tecnologia, de 77%; e um reforço da acção social escolar de cerca de 5%. É com base nestes três grandes eixos do Orçamento que eu gostaria de abordar algumas questões.
O Sr. Ministro seguramente não pode desconhecer que na universidade vivemos hoje uma crise séria, a qual tem dois factores. O primeiro é a degenerescência da aplicação do modelo de Bolonha, o que é uma coisa muito séria.
Bolonha transformou-se, na maioria das escolas do ensino superior deste país, num exercício patético de tentar meter em três anos o que se dava em quatro e de tentar salvar os empregos daqueles que estão ameaçados com esta redução. Os aspectos pedagógicos, as outras coisas que sabemos que são positivas, tudo isso está, neste momento, na esmagadora maioria das escolas… Nas humanidades é sem dúvida o que se passa, admito que nas tecnologias se tenha, aqui ou acolá, encontrado boas soluções para isto, mas esta é, neste momento, a situação.
O que acontece é que está a viver-se uma situação de «salve-se quem puder» em matéria de emprego, porque está tudo reduzido de quatro para três anos. E, depois, no segundo ciclo, o que será o quinto e o sexto ano dos mestrados, como o sistema de financiamento é diferente quer a nível da segunda parte quer ao nível do doutoramento, ou seja, é mais caro, o que estamos a fazer neste momento nas universidades é a criar situações em que quem não tem dinheiro não faz pós-graduações, pura e simplesmente, a não ser que estas bolsas que agora aumentaram vão de alguma maneira compensar essa carência, mas a meu ver nunca a poderão compensar suficientemente.
Temos, portanto, uma situação de deturpação do Processo de Bolonha. Junte-se a isto — e estou a resumir, necessariamente — os cortes financeiros. Percebo o Sr. Ministro, tem razão, as universidades têm de ser eficientes. Nas universidades há coisas boas e más, nenhuma universidade é em si mesma boa e má; há dentro das universidades coisas boas e coisas más, não há nenhuma escola que não seja assim, e a política de educação deve ser no sentido de consolidar as coisas boas e de tentar superar as más.
Portanto, sim, senhor, as universidades devem ser competentes, devem alargar-se para fora, mas o corte financeiro que está a fazer-se — e estou lá, sei do que estou a falar — não é maneira de resolver o problema.
Maneira de resolver o problema, se calhar, é arranjar um novo modelo de financiamento, uma nova política de financiamento. As fórmulas que estão a ser usadas neste modelo estão a originar nas nossas universidades — e chamo-lhe a atenção para isto, Sr. Ministro — a regressão curricular e científica, ou seja, a aplicação de Bolonha leva à regressão curricular e científica.
Estamos a formar uns semianalfabetos funcionais com três anos de escolaridade e que, depois, não se sabe o que vão ser a seguir. É a tal geração de que falam, a «geração dos 1000 €», ou seja, depois vão para o mercado de trabalho por 1000 € fazer qualquer coisa em qualquer lugar.
Portanto, a aplicação de Bolonha significa regressão curricular e científica e não renovação do corpo docente. Neste momento, com os cortes financeiros, há anos e anos que não renovamos o corpo docente.
Dentro de 10 anos, as nossas universidades são corpos de gente caquéctica, a começar por mim, que já tenho 60 anos, porque não se renova. Estamos a deixar ir embora os melhores valores, não conseguimos segurá-los. O Sr. Ministro dirá que «temos aí a carreira científica que vai abrir», mas não se pode fazer isto porque a carreira científica é alimentada pela qualidade da universidade.
A universidade, em Portugal, é o «caldo» onde se faz investigação científica. É certo que pode haver, e há, outros modelos lá fora em que existem carreiras científicas auto-sustentadas. Em Portugal não é assim! Em Portugal, a universidade é o «caldo» de formação dos cientistas e se estamos a estrangular financeiramente a universidade, se não conseguimos recrutar gente nova porque não há dinheiro para o fazer, não só não estamos a renovar o corpo científico como estamos a desaproveitar a elite, os nossos melhores alunos estão todos a ir-se embora.
Portanto, não se pode pensar em fazer o que o senhor quer, e que eu também quero, que é melhorar a qualidade das universidades, potenciar o bom e deixar o mau para trás, através de soluções administrativofinanceiras. Essa não é a solução, ela passa por formas de financiamento pensadas em conjunto pelo corpo docente.
O Sr. Ministro sabe que os reitores não são um bando de perigosos populistas acerca desta questão. Naturalmente, eles têm os seus interesses a defender, por vezes corporativos, mas há questões reais, como a do desemprego sem subsídio, como o Sr. Ministro sabe.