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21 DE JUNHO DE 1988 559

respeita à segurança social. Entretanto, sucede que é extremamente difícil que se reedite hoje a polémica que presidiu à aprovação do artigo 63.° da Constituição, sendo certo que esse preceito foi objecto de um debate na primeira revisão constitucional, que conduziu à alteração, ainda que sem distorção de sentido, de algumas das características do sistema. De facto, ao alterar o n.° 3 do referido artigo 63.° e ao precisar a margem constitucional de actuação possível para as instituições particulares de solidariedade social, avançou-se no sentido de adoptar uma determinada clarificação da margem não pública de actuação consentida. Acontece, porém, que isso não tem a mínima confusão possível com a concepção que o PSD tem do que deve ser a Segurança Social. O PSD tem, como, aliás, o seu projecto revela, uma concepção contrária a um verdadeiro sistema social unificado e descentralizado. Mantém naturalmente a expressão "unificado" no n.° 2 do artigo 63.°, mas na proposta de alteração do n.° 3, que será atempadamente discutida, prevê a instituição de um verdadeiro direito à criação de instituições particulares de solidariedade social e de segurança social, sem especificar quais sejam os limites e, naturalmente, as fronteiras de cada um dos sistemas que se edificariam desse modo.

Portanto, o modelo de que o PSD parte não é o constitucional, mas sim aquele que deseja ver consagrado constitucionalmente e que na acção governativa concreta procura ir aplicando através da multiplicação de esquemas paralelos, complementares e outros. Refiro-me até aos esquemas que procuram fazer com que muitos dos riscos a que o sistema unificado de segurança social visa dar resposta sejam cobertos por outras formas, como seja por via de financiamento privado ou não público. Nesse sentido várias modalidades são imagináveis e algumas delas já estão em aplicação.

Ora, o PCP parte, sem nenhuma imaginação (o que, aliás, aqui só será mérito), do sistema constitucional na sua presente arquitectura e insere-lhe alguma coisa que o Sr. Deputado António Vitorino sublinhou muito bem não passar de uma explicitação daquilo que hoje consta da alínea b) do n.° 2 do artigo 57.° O PCP poderia ter adoptado uma técnica legislativa diferente daquela que adoptámos e limitarmo-nos a reescrever a alínea b) do n.° 2 do artigo 57.° Era um caminho possível, mas optámos por não o fazer. Seguimos como regra que, quando houvesse aditamentos que se traduzissem em meras explicitações, deveríamos subscreveras sob forma de novos números, ou até, em certos casos, de novos artigos, unicamente para não reescrever, com particularizações, aquilo que está bem escrito. Neste caso, entendemos que o n.° 2 do artigo 57.° está bem redigido. É comummente entendido que o direito de participação na gestão das instituições de segurança social inclui a própria gestão, ou seja, não se compadece com a mera relegação para actividades em órgãos de fiscalização e consultivos. Do mesmo modo, julgamos que, tratando-se na alínea b) do n.° 2 do artigo 57.°, das instituições de segurança social, uma interpretação restritiva que leve a que onde a Constituição alude a essas entidades se coloque tão-somente a expressão "certos níveis de instituições de segurança social" é inadequadamente limitativa. Não tem, aliás, fundamento.

Portanto, nesse sentido, as propostas referentes ao artigo 63.° do PCP não são senão, como o Sr. Deputado António Vitorino observou correctamente, a explicitação de alguma coisa que já flui da alínea b) do n.° 2 do artigo 57.° No entanto, sabemos que a interpretação desta norma constitucional e sobretudo a prática, a orientação legislativa, têm sido particularmente hostis e adversas à ideia de consagrar com a amplitude adequada o direito de participação assim entendido. A virtude da proposta apresentada pelo PCP é precisamente a de não deixar nenhuma dúvida quanto ao alcance que se deve dar a este direito. A pergunta de alguns será saber se isto tem alguma coisa a ver com Portugal dos anos oitenta/noventa. A nossa proposta traduzirá uma atitude onírica, puramente imbuída de uma utopia de carácter saudosista ou ultra-revolucionária? Nós entendemos que não! Pensamos que, por um lado, a Constituição, no seu teor actual, deve ser cumprida e não o está a ser. Para isso há, naturalmente, os mecanismos de resistência adequados, cujo exercício, como sabem, enfrenta muitas dificuldades, e não é propriamente uma pletora o conjunto de meios disponíveis para o efeito. Porém, quem queira engenhar ou conceber um modelo de organização social, designadamente no tocante à importância da Segurança Social, poderá dificilmente conceber que o sistema seja todo ele arquitectado com preterição de uma normal participação daqueles que são os maiores contribuintes possíveis para o financiamento, isto é, aqueles a quem se destina basicamente - embora não exclusivamente? Que concepção é que, razoavelmente, se pode reclamar da supressão dessa participação? Essa é que é a pergunta a que o PSD não responde. E deve a participação ser simbólica, participação castrada?

Não! É evidente que a proposta do PCP deve ser lida face à Constituição que há, e não face à do PSD, que não há. Na Constituição do PSD, que não há, haveria que ponderar-se qual poderia ser o lugar para a participação dos trabalhadores nas instituições privadas. Que participação é que seria concebível? Que níveis de intervenção das associações sindicais? Eis a questão que nós, à partida, não equacionámos, porque o modelo em que assentou esta construção era e é um modelo que não comporta a componente que o PSD quer meter-lhe. Se o PSD lhe conseguir meter essa componente -coisa que é tudo menos certa ou, pelo menos, não tem resposta neste momento-, haveria que pensar se precisamente esse sistema não teria obrigatoriamente que comportar uma componente significativa de participação para menos desnaturação. Essa é uma questão que não colocámos, porque o PSD nem sequer explicitou como é que configura as fronteiras entre o sistema público e os múltiplos sistemas privados.

A nossa proposta, em todo o caso, pode ser bastante importante para garantir a ultrapassagem de algumas das perversões e principais defeitos e vícios do sistema de segurança social, tal qual está a ser orientado, com resultados que se perfilam como quase catastróficos.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado, quando diz "quadros catastróficos", refere-se ao défice?

O Sr. José Magalhães (PCP): - Exactamente, Sr. Presidente. Refiro-me ao défice e à vossa gestão.