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13 DE SETEMBRO DE 1988 1091

O Sr. José Magalhães (PCP): - Só para estabelecermos a margem entre a nossa inovação pérfida virtuosa e a Constituição vigente, embora suscitando esta ou aquela dificuldade interpretativa.

O Sr. António Vitorino (PS): - É evidente, só que o problema que existe aqui é o seguinte: através do artigo 201.°, n.° 1, alínea c), o que resulta é que o qualificativo sobre íeis de bases cabe à Assembleia da República, e a competência para desenvolver essas leis de bases cabe ao Governo. O que está em causa é a pretensão do PCP de que esse desenvolvimento seja sempre feito por acto legislativo, isto é, seja sempre feito por decreto-lei, e a circunstância de na cópia do projecto do PCP o desenvolvimento de uma lei sobre matéria da reserva absoluta de competência legislativa da Assembleia da República poder ser feito parte por decreto-lei, parte por simples acto regulamentar.

É aqui que detecto, na minha humilíssima opinião, um certo desequilíbrio, o que não significa que a nossa proposta seja ela própria isenta das dificuldades que identifiquei em relação à do PCP.

Porém, parece-me que a força expansiva do acto legislativo, isto é, do decreto-lei nos casos em que se trata de regulamentação de leis sobre matérias da reserva absoluta de competência da Assembleia da República, me parece ser mais defensável do que no caso das meras leis de bases.

O n.° 6 do projecto do PCP também é interessante e corresponde a uma preocupação, que é, tanto quanto possível, a de estabelecimento de um prazo máximo de três meses para aprovar diplomas de desenvolvimento e regulamentos necessários à execução das leis. Contudo, creio que se trata de uma proposta que anuncia uma ária da A ida e acaba por apenas tornar audíveis uns vagos trinados em termos de eficácia prática. Isto porque a lógica da proposta seria compreensível se eventualmente ela cominasse uma sanção. Mas, sem sanção, trata-se de uma proposta em si mesma maximalista - três meses como prazo geral -, ou então um convite a que o Governo estabelecesse sempre prazos extensíssimos para a regulamentação das leis que via aprovadas, à semelhança do que já hoje se passa com as autorizações legislativas, e que não se pode deixar de considerar escandaloso, que os governos apresentem propostas de lei de autorização legislativa (acompanhadas às vezes do respectivo decreto-lei) com artigos finais que dizem, por um lado, que a lei de autorização entra imediatamente em vigor (prescindindo pressurosamente dos pobres cinco dias da vacatio legis) e que, simultaneamente, dizem que o uso da autorização poderá ser feito em longos 120 dias ou 180 dias. É um contra-senso e é ridículo, mas a verdade é que receio que a inexequibilidade de um preceito deste género sem sanção, como consta da proposta do PCP, seja um convite a que sistematicamente, em matéria de leis, os governos passem a pedir extensíssimos e escandalosíssimos prazos de regulamentação para evitarem a violação da Constituição pelo incumprimento do prazo de três meses, ainda que o incumprimento não acarretasse nenhuma consequência técnico-jurídica prática.

Claro está que o Sr. Deputado José Magalhães me dirá que isto se destina a impedir que certos governos recalcitrantes não regulamentem leis aprovadas por maiorias patrióticas na Assembleia da República.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Estou encantado pelo facto de o Sr. Deputado estar a dar respostas. Eu vou, rigorosamente, oferecer o mérito das suas respostas ...

O Sr. António Vitorino (PS): - Sr. Deputado José Magalhães, faço-o sem qualquer dificuldade, porque ao fim de o ouvirmos tantas horas nesta comissão até já consigo adivinhar o seu pensamento.

O problema que vejo nessa lógica do PCP é que este mecanismo acabará por ser apenas um espartilho (mais um!) para governos minoritários, isto é, teria como consequência prática o dificultar a vida a governos minoritários. Naturalmente que o Sr. Deputado José Magalhães tem sobre os governos minoritários um estado de desamor que em muito difere da maneira como eu encaro esses processos.

Só que não creio que seja muito defensável que se tente, por esta via, resolver um problema que é essencialmente um problema da responsabilidade política do Governo perante a Assembleia da República, que é o incumprimento por parte do Governo de obrigações de desenvolvimento legislativo ou regulamentar cometidas aos governos por actos legislativos da Assembleia da República.

Parece-me ser mais credível a sanção política, qual seja até a de a própria Assembleia da República chamar a si a regulamentação das suas próprias leis em caso de relaxe do Governo, do que recorrer a uma norma deste género, que é, apesar de tudo, uma norma pia, porque sanções non habemus.

Vou acabar esta extensíssima intervenção de que me penitencio, peço desculpa, com uma referência ao n.° 7 da proposta do PCP, embora reserve ainda uma breve observação final para a proposta do PSD.

O n.° 7 proposto pelo PCP pretende resolver um problema que é o da inconstitucionalidade dos assentos. Não é hoje matéria pacífica que os assentos tenham sido inconstitucionalizados pela revisão de 82, mas a proposta do PCP é uma proposta a meio caminho, porque se é verdade que legitima inequivocamente os denominados "assentos interpretativos", já não procede da mesma maneira quanto aos assentos integrativos, isto é, se a proibição abrange apenas a criação de actos que, com eficácia externa, integrem, modifiquem, suspendam ou revoguem preceitos, fica apenas aberta a porta para os demais actos interpretativos. Só que, como nós sabemos, os assentos podem situar-se em áreas onde é muito difícil estabelecer a fronteira entre o que é a mera actividade interpretativa e o que é também uma actividade integrativa das lacunas da lei. Portanto, o objectivo que o Sr. Deputado José Magalhães pretende alcançar só é alcançado a metade, dependente da interpretação do conteúdo de cada assento. Um assento será constitucional se apenas se limitar a interpretar a lei, já não o será se interpretar e integrar, ou se até em exclusivo integrar, uma lacuna da lei.

Nesse aspecto o PSD vai mais longe, embora eu não concorde com o Sr. Presidente, que interpreta a redacção deste número da Constituição, na sua versão actual, em termos que poderiam levar a questionar a legitimidade das próprias sentenças transitadas em julgado, já que sempre se deverá entender que neste caso não estamos no domínio da legislatio mas sim pura e simplesmente no domínio da jurisdictio e haverá sempre uma tarefa interpretativa da lei congénita à natu-