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1218 II SÉRIE - NÚMERO 39-RC

O Sr. Costa Andrade (PSD): - O exemplo que coloquei foi, naturalmente, académico. Mas, em rigor, "função privada" ou não significa nada, não é uma expressão jurídica, ou então tem o significado que lhe dá a teoria sociológica para a qual todos os papéis representados e todas as funções desempenhadas por uma pessoa para o funcionamento, a preservação, a manutenção e a adaptação do sistema ao ambiente são funções privadas. Foi apenas isto que pretendi dizer e, de resto, a minha intervenção -não me pronunciei sobre o mérito da proposta- tinha implícita uma certa concordância com a proposta. Simplesmente, penso que esta expressão deveria ser eliminada ou, pelo menos, substituída.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Srs. Deputados, quanto à questão terminológica, façamos uma reformulação. Substituamos "função privada" por "cargo privado", por exemplo, apenas para adiantar e encurtar razões. É evidente que Parsons não foi chamado para aqui, não o seria a título nenhum e de certeza não entra no hipódromo do direito constitucional sem ser convidado. Neste caso concreto, ele não foi por nós convidado e só cavalgaria neste articulado contra a nossa vontade, na medida em que não fizemos nada que legitimasse sequer a sua aproximação; foi aqui introduzido pela mão do Sr. Deputado Costa Andrade por conveniências de generalização e de argumentação, a fim de tornar caricaturalmente mais polissémico aquilo que é, realmente e em certa medida, polissémico, como o Sr. Deputado Almeida Santos anotou. O interesse deste debate consiste, sobretudo, em nos conduzir ao terreno da sensatez, no qual não quereríamos senão permanecer desde o início. A discussão é, aliás, particularmente interessante quando posta perante exemplos. É nesse terreno que nos devemos mover.

Por um lado, quis-se na nossa proposta estabelecer uma divisão entre os cargos ou funções de carácter público que o Presidente pode exercer e os que lhe estão vedados (já iremos às funções privadas). Objectou o Sr. Deputado Almeida Santos: "como há uma reserva de competência e como não há uma possibilidade de alargamento, a questão resolvida está"... Ora não está, porque, como este clausulado e esta reserva não são aparentemente impedientes da criação de estruturas, mesmo de carácter público - pensemos, por exemplo, numa fundação de carácter público instituída pelo poder legislativo - presididas pelo Presidente da República...

O Sr. Presidente: - O Prémio Nobel.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Não, pense numa instituição de carácter público nacional, como, por exemplo, uma imaginária Fundação Afonso Costa enquanto estrutura com funções de estudo e investigação, de pesquisa, de arquivo histórico, de prospecção, etc., existindo na dependência da Presidência da República, com funções que lhe seriam adstritas e presidida, suponha-se, pelo próprio titular do cargo.

Dir-se-á que a factibilidade desse tipo de estrutura é dúbia. Sabemos que não é dúbia: há precedentes e pode haver consequentes. A questão é saber se o argumento da reserva de competências que foi utilizado pelo Sr. Deputado Almeida Santos tem tanta valia ou se tem apenas uma valia tão relativa que devamos configurar a necessidade de levar a reserva da Constituição até ao seu limite. Este é um primeiro aspecto.

O segundo aspecto é relativo às "funções privadas", assim chamadas e porventura mal baptizadas, pelo que passo a utilizar a expressão "cargos privados ou actividades profissionais". As hipóteses são repugnantes e o Sr. Presidente desde logo o sublinhou: alguém que exercesse - a admitir-se que isso é permitido - funções deste teor e simultaneamente fosse presidente do conselho de administração da "Trólaró, S. A.", desqualificar-se-ia. Isso seria uma coisa absolutamente absurda ...

O Sr. Presidente: - É por isso que não é necessário dizê-lo, o absurdo não tem de ser proibido pela Constituição... Estamos a tratar do Presidente da República!...

O Sr. José Magalhães (PCP): - Extacto... Mas não se trata apenas do absurdo e o debate é insusceptível de ser travado senão no terreno da prospecção, e portanto com o terreno limpo nesse sentido.

Já quanto às actividades profissionais, o que é que é uma actividade profissional? Tudo depende da profissão do eventual titular.

O Sr. Presidente: - Mas terá dignidade prevermos que o Presidente da República não pode ser nem comerciante, nem professor primário, nem médico?

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, não teria dignidade se isso fosse encarado como uma norma ad hominem - o que é absolutamente de postergar -, ou se fosse encarado como uma norma discriminatória, prevista só para o titular de um cargo político e não para outros. Ora sucede que nós prevêmo-la também, em sede de artigo 185.°-A, para os membros do Governo e inserimo-la na nossa reflexão, que de resto tem vindo a ser feita, ao longo destes debates, sobre o estatuto de todos os titulares de cargos políticos...

O Sr. Presidente: - Para os membros do Governo, já não me choca tanto que estas coisas se digam. Aliás, talvez até convenha na medida em que a experiência tem demonstrado que há inclusivamente membros do Governo que continuam a exercer actividades profissionais. Mas prever a Constituição que o Presidente da República não pode ser profissional de coisa nenhuma, quando já sabemos existir uma reserva de competência, consagrada implicitamente na Constituição...

O Sr. José Magalhães (PCP): - É óbvio! Mas, Sr. Presidente, em relação ao exercício de cargos, é necessário ter em atenção que existem outros exemplos, além daqueles que o Sr. Presidente aqui aventou - de resto, têm carácter não taxativo. A hipótese honrosa "Prémio Nobel" é uma, mas imagine-se a hipótese de uma fundação de direito privado - não vou baptizada -, ou imagine-se a questão suscitada pelas hipóteses de presidências "honorárias", assim chamadas, quaisquer que elas sejam: é evidente que a sanção para tudo isso pode situar-se no terreno político...

O Sr. Presidente: - Aí é que está o Prémio Nobel! Que me dera que o Presidente da República Portuguesa fosse escolhido para presidente do Prémio Nobel!...

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, aí seria difícil saber se o seria na qualidade de Presidente da República. Aliás, entendo que não...