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1298 II SÉRIE - NÚMERO 42-RC

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Presidente, decorre, naturalmente, da proposta que acabou de ler, da autoria do PCP, uma preocupação com a vertente dos deveres do deputado, na sua ligação aos eleitores e, portanto, nessa incindível ligação com o país real que exige actos jurídicos concretos, e não apenas a titularidade passiva e residual de uma qualquer vaga informação mais ou menos regular.

Nós sabemos que o que aí propomos pressupõe, de alguma forma, o melhoramento das condições de trabalho de todos os deputados. Mas entendemos que sem se caminhar para aí não se aperfeiçoará minimamente o regime democrático, nem o próprio estatuto do parlamentar, enquanto tal considerado. A esta luz o que vem proposto pelo PRD para o artigo anterior, e que, portanto, não vamos discutir, afigura-se-nos compatível e até desejável. Filia-se num modelo segundo o qual, tal como hoje já a lei prevê, deve haver disponibilização, nos círculos, de espaços para o contacto entre o deputado e o eleitor, e também outras formas de apoio ao exercício da função parlamentar.

A alínea d) que nós propomos interfere directamente com esta vinculação do deputado ao povo, e menos com aquilo que é o conjunto das suas obrigações no interior da Assembleia da República. A constitucionalização de uma norma deste tipo enriquece significativamente o perfil constitucional do que deve ser a função do deputado. E, pela nossa parte, sendo tão óbvio o que pretendemos, apenas desejaríamos verificar a anuência pronta e irrestrita dos restantes grupos parlamentares.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sra. Deputada Maria da Assunção Esteves.

A Sra. Maria da Assunção Esteves (PSD): - Esta proposta do PCP, se bem que claramente bem intencionada, levanta-nos algumas inquietações, mais do ponto de vista técnico-jurídico do que do ponto de vista do tipo de dever que pretende consagrar.

É óbvio que há um certo dever de os deputados informarem os cidadãos sobre o exercício do seu mandato. Esse dever é um dever co-natural à natureza do mandato que exercem, mas é importante, do ponto de vista até de um certo rigor técnico-jurídico de inserção do conjunto dos deveres fundamentais dos deputados na Constituição, ver o que deve figurar na Constituição e o que deve ser excluído.

O conjunto de deveres que figuram no texto actual são deveres de contornos concretos, claramente definidos, de certo modo mais claramente controláveis do que aquele que se vem inserir na alínea d). De facto, quando o PCP propõe que a alínea d) prescreva "informar os cidadãos regular e directamente sobre o exercício do mandato" está mais a consagrar uma espécie de obrigação moral-política por parte do Poder, e neste caso por parte dos deputados, do que, propriamente, a assinalar um certo dever jurídico de exercício de determinada componente do mandato. Portanto, parece-me que há aqui um desvio ao teor técnico e à carga técnica dos outros deveres que refere o artigo 162.°

Por outro lado, não sei se, do ponto de vista de uma certa interpretação genérica deste dever de informar, não haverá o efeito perverso de interpretar isto como um dever que, de certo modo, sonega a natureza livre do mandato do deputado. Nós sabemos que há outras disposições constitucionais que claramente apontam para o princípio do mandato livre. Isso não será aqui - ao sentir o PCP a necessidade de expressar de modo evidente este dever de informação dos cidadão - uma constrição desse sentido livre do mandato?

Mas estas observações são menos importantes em relação a uma segunda que pretendemos deixar aqui clara, no que diz respeito à segunda parte da mesma alínea d), quando se diz "dar seguimento, quando fundamentadas, às reclamações, queixas e representações que lhes sejam dirigidas". Há aqui, no nosso entender, um certo menosprezo pelo próprio mecanismo e processamento do direito de petição, reclamação ou queixa. De facto, são direitos de reclamação, petição ou queixa, sabendo-se que o direito de petição é, também, um direito consagrado na Constituição com uma definição e uma textura concreta e definida. Dirige-se, também, do ponto de vista da Constituição, a entidades concretas, a órgãos de poder definidos, a sujeitos próprios, não aos deputados como componentes da Assembleia da República. Isto é, há reclamações, queixas ou petições que são dirigidas à Assembleia da República - aliás, sabemos que é até a 1.ª Comissão o lugar da discussão dessas petições; não há, do ponto de vista da textura deste tipo de direito, um processamento em que um cidadão individual, ou -um grupo de cidadãos, se dirija a este ou àquele deputado. O que nos parece aqui é que, do ponto de vista da alínea d), se cria uma espécie de distorção à legitimidade da entidade a quem as pessoas se devem dirigir para exercer o direito de petição, isto é, o deputado não é a entidade legítima para receber esse tipo de solicitações. A entidade legítima é a Assembleia da República, enquanto tal, e, nesse sentido, o PSD entende que seriam de manter as três alíneas tal como estão, obviamente em conjunção com outro tipo de deveres que a Constituição consagra com algumas explicitações desses deveres também regimentalmente registadas, e que deixássemos, portanto, a alínea d), pelo menos, no teor e com a redacção que o PCP acaba por lhe imprimir.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Almeida Santos.

O Sr. Presidente (Almeida Santos): - A seguir estava inscrito para usar da palavra o Sr. Deputado Seiça Neves e depois o Sr. Deputado António Vitorino.

Tem a palavra o Sr. Deputado Seiça Neves.

O Sr. Seiça Neves (ID): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Comparando com a enumeração dos direitos e dos poderes dos deputados, a enumeração dos seus deveres é escassa. Daí que todo o esforço que se faça, no sentido político e no sentido jurídico, para complementar a enumeração, tanto quanto possível taxativa, dos deveres dos deputados seja de aplaudir e apoiar.

Por outro lado, o Prof. Manuel de Andrade falava de direitos difusos, isto é, direitos que, no fundo, poderiam ou não ser exercidos, como falava de poderes difusos a propósito dos poderes-deveres. Digamos que os deveres dos deputados já são em si mesmos difusos, pois não têm contrapartida nenhuma. Não há nenhum ónus de responsabilidade na sua enumeração taxativa, pelo menos no que diz respeito ao artigo em discussão. Digamos que estes deveres são deveres gerais de desempenho do mandato (não passará muito disso).