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7 DE NOVEMBRO DE 1988 1735

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sra. Deputada Maria da Assunção Esteves.

O Sr. Maria da Assunção Esteves (PSD): - Sr. Presidente, gostaria de me pronunciar sobre as propostas do Partido Comunista, do Partido Socialista e do Partido Renovador Democrático, mais concretamente sobre o problema da transparência da Administração e do acesso dos cidadãos aos seus documentos e arquivos.

A primeira questão que se colocou com estas propostas - e que foi claramente sublinhada pelo Sr. Deputado José Magalhães - foi a da criação de um novo conceito de legitimidade. Isto é, no âmbito do acesso dos cidadãos à informação da Administração criou-se um alargamento da noção de legitimidade em relação àquela que vem delimitada no âmbito do contencioso administrativo. As três propostas comportam um sentido de legitimidade que extravaza o nexo de interesse directo legítimo ou de direito subjectivo que está na base do acesso aos tribunais administrativos.

A primeira questão que se coloca aqui é exactamente a da concatenação da legitimidade no âmbito do contencioso com esta legitimidade que aqui se abre no âmbito das propostas. A questão é esta e o Sr. Presidente referiu-se a ela muito claramente. É o problema do acesso de terceiros a processos que não lhes dizem directamente respeito. As fórmulas das propostas são excessivamente abertas e comportam um certo sentido de legitimidade, com alguns tónus moderadores - é o caso das propostas do Partido Socialista e do Partido Renovador Democrático -, mas que nem por isso deixam de causar algumas preocupações.

Esta ideia de legitimidade aberta a terceiros, isto é, a possibilidade do acesso dos cidadãos à Administração em processos em relação aos quais não há aquele nexo de titularidade de direito ou de interesse legítimo, choca ou não com a eficácia da Administração? Mais: choca ou não com a razão de ser do próprio acesso à informação? Parece-me que o problema do alargamento da noção de legitimidade exige uma pergunta num outro nível e que é a seguinte: o problema do acesso é um problema com vista à defesa de direitos ou é um problema com vista ao controle da Administração? Se é um problema com vista à defesa de direitos, é muito importante que se mantenha este nexo de titularidade e que se ponham alguns freios no alargamento da legitimidade ou na criação da nova noção de legitimidade, como, aliás, referia o Sr. Deputado José Magalhães. É que em meu entender o controle da Administração não é uma incumbência directa dos cidadãos. Faz-se no âmbito do controle inter-orgânico pelos tribunais administrativos e mesmo através do controle difuso de normas no âmbito do controle da constitucionalidade.

O interesse da informação visa directamente a salvaguarda dos direitos dos cidadãos e nessa medida exige uma conformação concreta no âmbito da legitimidade destes no acesso à Administração. Essa questão é fundamental. Há que saber se ò problema da legitimidade deve estar ou não no seu âmbito de acordo com a função que desenvolve o acesso dos cidadãos à Administração nestes dois sentidos que referi e que são os seguintes: ou a defesa de direitos ou controle da Administração ou as duas coisas.

Pretendia deixar claro que, em meu entender, há aqui um choque desnecessário entre o alargamento do conceito de legitimidade e a necessária eficácia da Administração, o necessário arredar de um certo caos no seu funcionamento e, de certo modo, um necessário acautelar da necessidade que tem a Administração, no âmbito da defesa clara dos direitos dos administrados, de desenvolver a sua finalidade de defesa do interesse público. Há de facto margens de abertura muito grandes deixadas pelas presentes propostas: não foi só a do PRD, no meu entender, que o fez - e o Sr. Deputado Rui Machete referiu-se também, aliás, às outras - o PS põe alguns limites, o PCP põe muito menos, põe tão poucos que a lei fica aqui com a possibilidade de criar um novo conceito de legitimidade desfasada do próprio interesse que ele pretende preservar. Para dar um exemplo concreto, o número proposto pelo PCP não acautela a diferença entre os actos administrativos de eficácia externa e actos administrativos de eficácia interna. Haveria um acesso em bloco, indiscriminado, desnecessário, de quaisquer cidadãos a quaisquer processos relativamente a quaisquer interesses, o que, no nosso entender, é excessivo.

O Sr. José Magalhães (PCP): - A Sra. Deputada estava a fazer do preceito a mesma leitura feita em relação ao preceito do actual artigo 267.°, n.° 4, quanto à participação dos cidadãos na formação das decisões e deliberações que lhes disserem respeito...

A Sra. Maria da Assunção Esteves (PSD): - É totalmente diferente.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Não, Sra. Deputada. Evoco o debate que aí tivemos com o Sr. Deputado Rui Machete sobre esta matéria e a reflexão que foi feita quanto à delimitação do alcance desse normativo. Ninguém sustenta que conduza à necessidade de sentar ao lado do administrador o cidadão para que este acompanhe, a par e passo, tudo o que lhe diga respeito, em todos os momentos da formação da decisão, incluindo em todos os momentos que antecedem, naturalmente, a publicitação da decisão. Não há ninguém na doutrina, não há ninguém na jurisprudência que interprete o preceito nesses termos, tal como não haverá ninguém que interprete como V. Exa. fez um preceito como este que o PCP apresenta. Obviamente pode ser melhorado e, nesse sentido, a sua intervenção é uma contribuição, mas é insustentável que o nosso texto implique que, ao lado do Ministro da Defesa Nacional, sentemos o cidadão interessadíssimo em saber o que é que vai acontecer às relações com os EUA em geral, à estação de rastreio de Almodôvar em concreto, para dizer ao Ministro: "Não, não, eu quero saber tudo o que tu estás a preparar sobre esta matéria, e, designadamente, o que consta da última mensagem contida em disquette entre a Administração americana e o teu Ministério. Diz-me imediatamente porque o artigo 267.°, n.° 5, aprovado na revisão constitucional garante-me o acesso a todos os documentos, incluindo naturalmente todos os suportes computadorizados."

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Magalhães, não resisto a dizer que a experiência revela que, por vezes, há requerimentos desse tipo.