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7 DE NOVEMBRO DE 1988 1733

si, muitas vezes sem atender a nenhuns aspectos instrumentais ou funcionais, ou porque isso significava algum poder para os funcionários ou autoridades, ou porque as pessoas tinham a noção de que os problemas do Estado estavam por natureza rodeados de um certo secretismo. E isto, independentemente, até, da consagração de fórmulas democráticas em termos formais na Constituição ou nas leis. Esse secretismo, ou melhor, essa propensão para o secretismo, existiu em Portugal quer durante a monarquia quer durante a 1.ª República, e depois, mas com um carácter mais acentuado e com uma lógica diferente, sob a ditadura.

Portanto, a ideia que temos é a de que esta norma proposta pelo PS, pelo PCP e pelo PRD é uma norma que deve ser encarada numa perspectiva favorável, embora tenhamos que ver até onde e como, porque os problemas da formulação são extremamente importantes.

Diria que, sem que isso seja um juízo definitivo, a norma actual da Constituição já é muito importante, mas não tem sido devidamente aplicada, o que deve ser sublinhado. O direito a ser informado sobre os processos que digam respeito aos cidadãos já existe. É evidente que isto também tem que ser interpretado com algum cuidado. É justamente por isso que as cautelas que o Partido Socialista coloca podem não ser suficientes, mas são indiciadoras dessa preocupação realista que tem que existir.

Concretamente no que diz respeito à proposta do PRD tenho a seguinte dúvida: compreendo melhor o acesso aos arquivos quando os processos estão concluídos. A formulação que está aqui pode ter um alcance sobre o qual tenho algumas dúvidas. Isto é, vamos aceitar que em relação a procedimentos administrativos que estão a correr e relativos a destinatários individualizados seja facultado o acesso a terceiros pela simples circunstância de o requererem, sem nenhuma justificação? Isso pode colocar questões que são completamente diferentes das que se põem quando o acesso é feito em relação a arquivos. Isto é, os arquivos dizem, em princípio, respeito a problemas que estão julgados, que estão decididos, que estão arrumados. Muitas vezes até já passou algum prazo sobre isso. É claro que reconheço que o aspecto fiscalizador, que, de algum modo, pode propiciar uma norma deste tipo, pode ser importante, mas temos de atender a esta questão da legitimidade do conhecimento por parte de terceiros em relação a processos que estão a decorrer e em que existem diversas informações. Suponhamos um processo em matéria económica, em que o requerente é obrigado a fornecer informações, que são sigilosas e importantes em matéria do seu negócio, e em relação ao qual a Administração está vinculada. Poderá permitir-se, na base da administração aberta, a um terceiro e até, eventualmente, a um concorrente o acesso a esta matéria? A formulação tal como está feita, e muito embora fale em privacidade - mas é uma coisa um pouco diferente da questão que ponho -, levanta dúvidas.

Tem a palavra, Sr. Deputado Miguel Galvão Teles.

O Sr. Miguel Galvão Teles (PRD): - Sr. Presidente, creio que esse é o aspecto mais inovador e mais positivo da proposta do PRD. E esse aspecto é o que diz respeito ao direito ao conhecimento das decisões e do andamento dos processos, mesmo que o cidadão não seja directamente interessado. A ressalva está na expressão "relativamente reservados". A lei que concretizasse o princípio teria de discriminar processos e estabelecer reservas relativas. Por exemplo, num processo de licenciamento em matéria económica poderia e deveria estabelecer-se que tal licenciamento ficaria reservado até à decisão ou mesmo para depois dela. Esse limite seria imposto através da noção de reserva relativa.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, mas o problema é este: é que, porventura, havendo - como me parece indispensável que haja - essa reserva relativa, não sei se justifica esta formulação. É que, na maior parte dos casos, é justamente nesse tipo de processos em que uma fiscalização por uma acção popular, não no contencioso administrativo, mas numa fase anterior, seria mais interessante.

O Sr. Miguel Galvão Teles (PRD): - Sr. Presidente, aí entraria o jogo da reserva relativa. O direito de acesso teria aí uma importante função preventiva: evitaria certos entorses que frequentemente se verificam na Administração ou torná-los-ia muito mais difíceis. É por isso que nós admitimos expressamente a reserva relativa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, é evidente que a compatibilização com os segredos tem que ser feita. Tem que ser feita, tanto com o segredo de Estado, como com o segredo profissional...

O Sr. Miguel Galvão Teles (PRD): - E com o segredo dos particulares, Sr. Deputado.

O Sr. José Magalhães (PCP): - [...] e com o segredo científico, com o segredo comercial, com o segredo industrial, etc., tal como são tutelados legalmente. É uma questão da lei ordinária.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Magalhães, é evidente que isso é uma questão da lei ordinária, mas também é importante a forma como concebemos o funcionamento da Administração Pública e dos procedimentos e até o papel que cabe à fiscalização da Administração Pública por parte dos particulares.

Há aqui três coisas completamente distintas.

Uma é a de assegurar o acesso à informação dos cidadãos em relação àqueles processos que lhes digam respeito. Isso já está previsto no n.° 1 do artigo 268.° Essa matéria é clara, precisamos é de a implementar.

Por outro lado, existe um segundo ponto que é muito importante e sobre o qual existe uma lacuna na lei, e até normas ordinárias e práticas administrativas que são contrárias, e que é o de garantir a quem tenha algum interesse nisso o acesso aos arquivos públicos e aos arquivos administrativos.

Há um terceiro ponto que sobressai da proposta do PRD e que é o seguinte: admite-se que mesmo em relação a processos que não estejam ainda na situação de arquivo, estejam in itinere, haja a possibilidade de conhecimento por parte de cidadãos, incluindo pessoas colectivas, interessados como terceiros.