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7 DE NOVEMBRO DE 1988 1747

A minha ideia é que nesta matéria há que marchar também com cautela. Não estão suficientemente exploradas as vias da personificação de interesses difusos, seja no campo da defesa dos consumidores, seja no campo do ambiente, seja no campo da qualidade de vida e do património cultural, que são zonas privilegiadas e em que é relativamente simples que a lei venha facilitar e tipificar as formas de acção colectiva personalizada que hão-se traduzir essa defesa e, portanto, dar-lhe essa legitimidade. Terei alguma relutância em consignar desta forma, tão indefinida quanto aos seus contornos, a possibilidade de os cidadãos agirem, em termos de procedimento colectivo, para defesa destes interesses difusos hoc sensu, sem nenhuma limitação do ponto de vista da legitimidade. Reconheço que é um ponto extremamente interessante. Posso eventualmente admitir que, num ou noutro caso, a maturação dos processos venha a permitir dar esse passo, mas também nesse ponto não deve ser o legislador constituinte a fazê-lo, mas, sim, o legislador ordinário.

Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Compreendo, Sr. Presidente, que a altura seja má para abordar estes temas interessantes. Há épocas em que os interesses são outros. Não creio que seja este o tema que tira o sono aos negociadores do acordo PS/PSD.

Gostaria somente de realçar que o PS não foi, nesta matéria, mudo em relação a alguns afloramentos do problema. Porém, não foi claro nem exprimiu ideias avançadas e transparentes quando a este ponto. Digo isto, sobretudo, porque o PS não distinguiu entre a acção popular clássica e o direito a verdadeiros e próprios procedimentos colectivos ou difusos ou interesses públicos latentes, como também pode ser o caso. É uma problemática totalmente nova, em relação à qual não desesperamos que o PS, no processo de revisão constitucional, venha ainda a adquirir algum interesse.

Gostaria também de dizer que as propostas do PS sobre, por exemplo, o artigo 66.°, em matéria de defesa do ambiente, nos merecem toda a simpatia, mas não dão resposta a esta problemática.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Desculpe interrompê-lo, Sr. Deputado, mas o melhor é traduzi-la já na acção popular.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Não, Sr. Deputado. A acção popular é uma coisa que tem a ver só com um dos meios de intervenção dos cidadãos. Acontece, porém, que os procedimentos colectivos têm a ver com a intervenção dos cidadãos junto da Administração Pública sem a mediação dos tribunais...

O Sr. Almeida Santos (PS): - Só que aqui está somente previsto o princípio e nada mais!... De facto, a lei teria de referir quais eram os outros meios além da acção popular.

Portanto, não somos contra um princípio genérico. Contudo, esta formulação só abre a porta para que a lei refira o que é que está para além da acção popular. VV. Exas. ainda não disseram quais são os instrumentos factuais de defesa dos direitos e garantias dos administrados, ou seja, o que é que se pode incluir dentro desta moldura. Qual é o retrato?

O Sr. José Magalhães (PCP): - De qual das molduras, Sr. Deputado? Da moldura do artigo 66.°?

O Sr. Almeida Santos (PS): - Não, é a do n.° 5 do artigo 268.°

De facto, este articulado, na redacção dada pela vossa proposta de aditamento, refere a expressão "procedimentos colectivos perante a Administração Pública para defesa...". Sabemos que nela cabe a figura da acção popular por nós proposta.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Não, Sr. Deputado, o problema está nesse ponto. Aí é que a intervenção do Sr. Presidente foi interessante, tendo em vista o desnatar dos meios colocados ao serviço dos cidadãos e a definição de qual é o âmbito próprio de cada um desses meios e qual pode ser o interesse da sua gestão em concreto.

Acontece que o artigo 66.° é uma amálgama, pois prevê todos os meios, desde uma honesta e simples petição (qualquer cidadão pode alertar as entidades competentes para o facto de, por exemplo, estarem a rebentar com a Igreja do Carmo!) até à verdadeira e própria acção junto dos tribunais...

O Sr. Almeida Santos (PS): - Diga-me em que é que, no seu entendimento, pode traduzir-se este novo n.° 5 do artigo 268.° que não seja a acção popular. E formulo-lhe esta questão a fim de raciocinar em concreto.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Deputado, isso é elementar! Pergunto-lhe: perante quem é que a acção popular se exerce?

O Sr. Almeida Santos (PS): - Perante os tribunais, Sr. Deputado!

O Sr. José Magalhães (PCP): - Exacto, Sr. Deputado, mas os procedimentos colectivos não se exercem obrigatoriamente perante os tribunais como tais. Podem (e devem, prima fade) exercer-se perante a Administração Pública, ela própria.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Até o direito de petição!...

O Sr. José Magalhães (PCP): - Esses procedimentos não são mero direito de petição, são mais do que isso: um verdadeiro e próprio procedimento.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Não sendo um direito de acção popular, nem um direito de petição, o que é que, então, será?

O Sr. José Magalhães (PCP): - É um direito a desencadear junto da Administração Pública um verdadeiro e próprio conjunto de actos articulados tendentes à obtenção de um efeito jurídico...

O Sr. Almeida Santos (PS): - Como é que se desencadeia? Formulo-lhe estas questão porque sou um prático e, essencialmente, um advogado!...