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19 DE OUTUBRO DE 1988 1433

tura política. Portanto, Srs. Deputados, não me venham com o pragmatismo, porque o pragmatismo é outro e tem um nome bastante feio.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à análise do artigo 185.°, em relação ao qual há uma proposta do PCP que altera a definição de governo,...

O Sr. António Vitorino (PS): - Seria melhor que fosse uma proposta do Governo a alterar a definição do PCP!...

O Sr. Presidente: -... ou melhor, que tem ínsita na sua redacção duas expressões de igual teor, ou seja, a expressão "sem prejuízo".

A primeira parte da proposta refere que o Governo é o órgão de condução da política geral do País, sem prejuízo das atribuições do Presidente da República e da Assembleia da República. E digo isto porque, na sede própria, o PCP propôs também ou, pelo menos, realçou competências da Assembleia da República e do Presidente da República na área do Executivo. A proposta de alteração do artigo 185.° do PCP acrescenta ainda o seguinte: "[...] e o órgão superior da Administração Pública, sem prejuízo da independência da administração das regiões autónomas, das autarquias locais e dos demais órgãos constitucionais independentes previstos na Constituição".

Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, em tudo o que respeita ao Governo, as propostas do PCP não visam mais do que corrigir certos aspectos, para os quais a experiência constitucional tem vindo a chamar a atenção, sem alterar o sistema.

A primeira das alterações visa corrigir inexactidões manifestas, hoje contidas na definição constitucional de governo. É evidente que, sendo o Governo o "órgão de condução da política geral do País", tal não pode entender-se como prejuízo das atribuições do Presidente da República e da Assembleia da República. Por outro lado, sendo certo que o Governo é, e tem de ser, "o órgão superior da Administração Pública", tal deve ser entendido sem prejuízo da independência da administração das regiões autónomas, das autarquias locais e dos demais órgãos constitucionais independentes previstos na Constituição. Aquilo que o PCP visa é a supressão de elementos de equivocidade que, em termos de hermenêuticas correctivas, sempre teriam de ser devidamente eliminados e superados, por forma a restituir o Governo à dimensão definitória, que é correcta face ao leque das suas competências e poderes e ao lugar que lhe cabe no sistema constitucional de órgãos de poder.

Este é um dos objectivos do nosso projecto de revisão constitucional: criar aperfeiçoamento de carácter institucional à Constituição da República Portuguesa, sem lhe introduzir qualquer alteração de fundo.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sra. Deputada Maria da Assunção Esteves.

A Sra. Maria da Assunção Esteves (PSD): - Sr. Deputado José Magalhães, a simplicidade com que V. Exa. apresenta a proposta de alteração ao artigo 185.° não parece, no entendimento do PSD, harmonizar-se com aquilo que na nossa perspectiva podem ser as consequências da mesma alteração. E digo isto porque se V. Exa. diz que a alteração ao artigo 185.° não modifica o sistema, também é verdade que duvida da interpretação inequívoca da relação entre os vários órgãos de soberania aí existentes com o Governo. Refiro-me ao facto de que ao alterar-se a redacção actual, o PCP propõe que se salvaguarde as atribuições do Presidente da República e da Assembleia da República, e no que respeita à competência administrativa do Governo que se salvaguarde a independência da administração das regiões autónomas, das autarquias locais e dos demais órgãos constitucionais independentes previstos na Constituição, está a colocar em causa que a delimitação das competências do Governo é uma delimitação que não decorre de modo inequívoco do conjunto de todos os preceitos que respeitam às competências dos vários órgãos aqui previstos.

Acontece, entretanto, que essa questão nos parece de realçar de sobremaneira. No entanto, há mais questões que pretendemos colocar em matéria da competência do Governo. Assim, penso que esta nova redacção dada ao artigo 185.° pelo PCP parece inviabilizar, de certo modo, algumas relações necessárias do Governo com a administração não directa que tenham obviamente a ver com as atribuições normais do Governo como órgão de condução de política geral. Pergunto-lhe, então, se esta redacção, além de colocar em dúvida as relações que normalmente já se estabelecem entre os vários órgãos de soberania com o Governo, não inviabiliza certos poderes de direcção, de superintendência ou de tutela que cabem ao Executivo no âmbito da sua tarefa de condução da política geral.

Há ainda outras questões a colocar, sendo esta referente a eventuais efeitos perversos destas salvaguardas que o PCP acrescenta à redacção actual do artigo 185.° De facto, depreende-se do texto actual deste preceito que o Governo é um órgão de soberania que tem por tarefa fundamental a condução da política geral e ser o órgão superior da Administração Pública, isto é, extrai-se desta formulação uma interpretação que assinala primeiramente ao Governo uma função política e administrativa, que não uma função legislativa de primeira água. Direi ainda que se depreende que esta redacção está combinada com aquilo que a Constituição pretendeu salvaguardar em primeira mão, ou seja, o primado legislativo da Assembleia da República.

Deste modo, pergunto-lhe se não será que com esta salvaguarda, inserta nesta nova redacção, o PCP não pretende, de modo imprudente, equiparar a função legislativa do Governo ao lado da função legislativa da Assembleia da República. Isto é, esta necessidade de demarcação não pressupõe, de certo modo, uma promoção automática da função legislativa do Governo? Pergunto isto, porque quando o PCP pretende inserir aqui estas alterações entende-se, ou é fácil depreender, que pretende acautelar os outros órgãos de soberania em face do Governo. Não será assim que o PCP vai conseguir o contrário ao demarcar o Governo desses mesmos órgãos, insinuando, do ponto de vista de uma certa interpretação do artigo, uma competência básica equivalente, nomeadamente no que respeita à Assembleia da República, e, neste caso, uma competência legislativa equivalente?