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19 DE OUTUBRO DE 1988 1435

necessária e a segunda expressão de igual teor pode, pelo contrário, ser foco de confusão. Assim, pergunto ao Sr. Deputado José Magalhães o seguinte: qual é o efeito útil da proposta do PCP?

O Sr. Presidente: - Antes de dar a palavra ao Sr. Deputado José Magalhães, gostaria de dizer que quando a citada proposta refere que o Governo é o órgão superior da Administração Pública não diz que é o órgão único. Se, ao invés, referisse que era o órgão único, poderia colocar-se o problema da necessidade de algumas excepções. No entanto, não refere tal.

Tem então a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começaria por sublinhar que a memória que o Sr. Deputado António Vitorino tem da primeira revisão constitucional, sendo um tanto idolátrica, conduz a deixar na obscuridade o que nela se fez e o que não se fez. Sucede que, neste ponto, a primeira revisão constitucional traduziu-se apenas numa eliminação, pelo que os problemas de definição que hoje estamos a discutir são lidos e legíveis à luz do texto originário que subsistiu e que visávamos agora retocar e aperfeiçoar, por forma a tornar melhor a definição que é caracterizada por tudo aquilo que o Sr. Deputado António Vitorino pôde situar, com larga cópia de movimentos hermenêuticos. Gostaríamos, precisamente, de tornar essas hermenêuticas difíceis em hermenêuticas fáceis.

O Sr. António Vitorino (PS): - Mas então foi a extinção do Conselho da Revolução que tornou claro qual era a força expansiva do artigo 185.°, após a primeira revisão constitucional, isto é, que novos domínios é que passavam a ficar abrangidos pela redacção do artigo 185.°, n.° 1, ora transformado apenas no corpo do artigo, em virtude da extinção do órgão autónomo de governo das forças armadas, o Conselho da Revolução?

O Sr. José Magalhães (PCP): - É um efeito, não directo, da alteração do artigo 185.°, mas um efeito decorrente das alterações em relação à própria estrutura e arquitectura da organização do poder político com o alargamento de âmbito, para a esfera militar, reservado ao extinto Conselho da Revolução. A supressão do n.° 2, que obrigava o Governo a definir e a executar a sua política com respeito pela Constituição "por forma a corresponder aos objectivos da democracia e da construção do socialismo", foi objecto de alguma reconversão, com a supressão do segmento final e com a generalização por assim dizer da obrigação de subordinação de toda a actividade, incluindo a do Governo à Constituição. Em todo o caso a questão central não é essa; é sim saber da utilidade da proposta, como de resto pertinentemente V. Exa. acabou por interrogar. Creio que a interrogação merece resposta.

A primeira resposta há-de situar-se na aclaração de pressupostos. Não há penumbra nenhuma, não há nenhuma zona que não esteja inteiramente iluminada pela mais potente e forte luz, na proposta do PCP. As intervenções da Sra. Deputada Assunção Esteves e do Sr. Deputado António Vitorino são a melhor demonstração de que, para se fazer uma adequada e correcta

interpretação do artigo 185.° da Constituição, é preciso fazer largos esforços de concordância prática da Constituição. É evidente que esses esforços são susceptíveis de ser realizados, têm de ser feitos. Não pode o intérprete atribuir outras funções, outros poderes ao Governo, senão aqueles que decorram de uma leitura integrada da Constituição, designadamente na parte em que define e estipula poderes para outros órgãos de soberania e estabelece que todos são separados e interdependentes. Não creio, porém, que tenhamos razão para nos considerarmos particularmente satisfeitos com as decisões constitucionais neste ponto.

Tomemos a definição da figura do Presidente da República. Segundo o artigo 123.°, ele representa a República Portuguesa, garante a independência nacional, a unidade do Estado e o regular funcionamento das instituições democráticas e é, por inerência, Comandante-Geral das Forças Armadas. Tivemos ocasião, na altura própria, de debater os aspectos problemáticos que esta definição suscita.

A Assembleia da República é a assembleia representativa de todos os cidadãos portugueses, nos termos do artigo 150.°

Os tribunais são os órgãos de soberania com competência para administrar a justiça, em nome do povo, nos termos do artigo 205.°

É evidente que a definição do artigo 185.° há-de ter isto em conta. Desde logo note-se a diversidade de critérios na definição dos diversos órgãos de soberania, a falta de um critério único. Revela-se, também, a necessidade de fazer articulações e leituras, designadamente com recurso ao critério sistemático como todas aquelas que foram feitas pelo Sr. Deputado António Vitorino e pela Sra. Deputada Assunção Esteves.

Qual é a vantagem de fazer a dilucidação que o PCP propõe? É a vantagem de todas a dilucidações! Não complicam: clarificam, simplificam nesse sentido exacto (salvo quando e na medida em que estejam mal feitas e então a questão é outra, que é de rigor e apuro, não de objectivo, não de teleologia). Esta dilucidação parece-nos saudável. A formulação não nos parece, como em todas as propostas do PCP, acima do aperfeiçoamento e discussão. Estamos perfeitamente disponíveis para encontrar outras redacções.

O Sr. Deputado António Vitorino acha que o "sem prejuízo" é "prejudicial", pois elimine-se o "sem prejuízo" e encontre-se uma formulação adequada, que não seja tão "prejudicial". A intenção do PCP não é prejudicar o Governo! É garantir uma leitura correcta daquilo que é a sua própria definição. Exige-o, primeiro, a necessidade de concordância prática entre a função governamental e a função do Presidente da República. Esse é um aspecto crucial. Não estamos aqui a discutir qualquer alteração do cunho do sistema - não é através desta definição que nós vamos alterar os princípios informadores do sistema de governo! Vamos "deslocar", "desenfatizar" o papel do Governo? Não é essa a nossa intenção e não seria a partir daqui que qualquer alteração, nesse sentido presidencializador, se processaria.

Segundo aspecto: por favor, não se confunda aquilo que não merece confusão, mesmo na base da leitura mais desprevenida. O que estamos aqui a discutir são funções de direcção política do Governo. Não estamos aqui a discutir a competência legislativa como tal; portanto não confundamos aquilo que é distinto ou que