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25 DE OUTUBRO DE 1988 1587

De facto, aquilo que se faz no aeroporto é como se fosse feito na Comissão Eventual para a Revisão Constitucional, origina pagamento de factura por inteiro. As duplicidades têm os seus limites numa sociedade organizada e moderna, em que a comunicação social revela todos os dislates que outrora o Atlântico preservaria durante uns meses!

Quanto à figura do ministro da República, gostaria de deixar registadas algumas breves observações. A nossa posição sobre a existência do cargo de ministro da República é conhecida. Vemos nele uma forma de dar corpo a um dos contornos do modelo constitucional da autonomia, designadamente na parte consistente na ligação entre a soberania e a região. O ministro da República tem as competências que tem e não outras. Devem ser exercidas nos seus precisos termos. Nenhum ministro da República é infalível, o que quer dizer que as suas decisões hão-de ser medidas ponto a ponto e caso a caso em função dos parâmetros constitucionais e políticos que cada um entenda desejáveis. Nenhum ministro da República, como nenhum órgão de soberania ou do Poder (salvo, talvez, o Presidente do Governo Regional da Madeira!), é infalível. Portanto, os contornos da figura devem ser lidos tendo em atenção as suas características específicas, mas sem preconceitos.

A caracterização dos ministros da República é extremamente difícil de fazer - ponto esse que está fora de dúvida e que é reconhecido por todos os que tenham de interpretar a Constituição. Sabe-se bem que não são órgãos de soberania, mas também é conhecido que representam a República. Sabe-se que são membros de governo, mas é do nosso conhecimento que têm assento no Conselho de Ministros. Sabe-se que são ministros mas que não têm ministério, pois possuem os seus serviços próprios. Sabe-se que não são órgãos das regiões autónomas, mas que, em certas circunstâncias, podem governar as regiões autónomas. Sabe-se que não representam as regiões autónomas perante os órgãos de soberania (é o contrário, ou seja, representam a soberania face às regiões autónomas), mas podem exercer uma função não despicienda no relacionamento das regiões com os órgãos de soberania (de resto, isso tem acontecido historicamente). Sabe-se que não são órgãos que dependam apenas de um órgão de soberania, porque dependem de dois. Sabe-se igualmente que a sua construção é original e correspondem a um processo em que se procurou inventar algum elemento de articulação com a soberania da República que pudesse funcionar com as virtualidades e limitações que a figura vem revelando ao longo destes anos de experiência, independentemente das vicissitudes que aqui, ali e acolá têm rodeado o exercício dessas funções.

Mudar a nossa posição em relação à existência do cargo só poderia ocorrer face a provadas e comprovadas razões demonstrativas da sua indesejabilidade. Quais são, então, as razões aduzidas?

A primeira "razão" é a de que, ultrapassada a fase dá instalação e arranque das autonomias regionais, o ministro da República seria "dispensável". De facto, os Srs. Deputados admitem que a intervenção do ministro da República, nos contactos da região autónoma com os órgãos do Estado, teria sido noutros estádios do processo (sic) "muito positiva" (é o que diz a Assembleia Regional da Madeira no seu parecer enviado à Assembleia da República sobre a revisão constitucional), mas que, neste momento, "apenas retardaria, sem proveito, um diálogo que as circunstâncias cada vez mais exigem seja directo entre as partes interessadas em ordem à rápida consecução das soluções que se buscam, sendo certo que as demais competências a ele cometidas pela Constituição podem com vantagem ser repartidas por outros órgãos de soberania". Este argumento do diálogo directo parece-nos extremamente falaz, desde logo porque nos casos em que há diálogo directo as dificuldades e as improficuidades desse mesmo diálogo são patentes. Quando o Presidente do Governo Regional da Madeira, na entrevista que hoje venho citando, à partida, no aeroporto, afirmou que "o Ministro da República para a Madeira vai arbitrar a revisão de alguns pontos do protocolo de reequilíbrio financeiro para que sejam definidas as quantias que ainda falta entregar à Região", o próprio Presidente do Governo Regional da Madeira sublinha as virtualidades do Ministro da República para arbitrar (sic) aquilo que não resulta do diálogo!

Srs. Deputados, entendamo-nos: haja coerência! Não se pode invocar às segundas-feiras um argumento que à terça-feira se despe, à sexta-feira se enverga e no sábado se despe outra vez!

Vozes.

O Sr. José Magalhães (PCP): - É impossível! Mais ainda: as dificuldades de diálogo directo, no caso concreto da Madeira e, em particular, com o Ministério das Finanças, são descomunais e colossais. A eliminação do Ministro da República não funcionaria, seguramente, como lubrificante para o reforço das relações dialógicas entre o Ministério das Finanças e o Governo Regional, até porque o que muitas vezes tolhe essa diologia é o facto de a situação, por exemplo, da região da Madeira ser, desse ponto de vista, ruinosa. É extremamente difícil encontrar uma solução que dê resposta aos défices crónicos e às pretensões de um Governo Regional que pretende reequilibrar-se a si próprio à custa, de resto, do sacrifício de prerrogativas da autonomia regional.

A segunda "razão" invocada pelos defensores da proposta é a de que "os Ministros da República vêm implicando despesas e encargos dispensáveis à Nação e burocratizam por acréscimo a Administração Pública, bem como os normais canais de relacionamento entre o Estado e as regiões autónomas".

Srs. Deputados, o argumento dos custos dos Ministros da República não pode francamente ser tido em conta, porque esses custos (que, de resto, são extremamente modestos face aos custos de alguns dislates de má administração financeira dos governos regionais e, em particular, o Governo Regional da Madeira) são ínfimos. Basta fazer a análise dos custos e do défice e da progressão respectiva, a ratio Ministro da República/défices (resultantes designadamente de operações eleiçoeiras da Região Autónoma da Madeira), para se perceber perfeitamente qual é a normal correlação de valores e a monstruosa inversão que o argumento opera. O argumento da poupança é francamente de nenhuma valia e, de resto, aparece tão perifericamente que, curiosamente, os Srs. Deputados tiveram aqui o cuidado de o deitar fora. De facto, vem na petição da Região Autónoma da Madeira a p. 4 do respectivo documento, mas VV. Exas. tiveram o cuidado de o omitir, porque é realmente desastroso.