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2930 II SÉRIE - NÚMERO 103-RC

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, creio que o que se salienta neste debate e nos articulados que agora vão ser submetidos a votação é, desde logo, a rejeição do fundamental das propostas do PSD nesta matéria.

Vozes.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Foi rejeitada a proposta básica do PSD, tendente a permitir o recurso ao referendo sobre questões de relevante interesse nacional, de transcendente importância política, a solicitação do Governo ou da Assembleia da República, apenas excluindo as questões relativas a matéria orçamental ou tributária, ou que tivessem por finalidade o aumento de despesas ou diminuição de receitas do Estado. O PSD pretendia abrir claramente a hipótese da realização de referendos de revisão constitucional e instituía, mesmo, a possibilidade de forçar o Presidente da República à convocação de um referendo, mediante confirmação de uma decisão presidencial negativa, por uma maioria parlamentar absoluta.

Essa componente plebiscitaria basilar do projecto de revisão constitucional do PSD, foi rejeitada. E o PSD decaiu claramente, logo durante o debate da primeira leitura, dos aspectos mais agressivos do seu projecto, que era claramente perverso, neste ponto. Decaiu e, mais do que isso, assumiu como suas, propostas que se filiam em concepções que sendo, como sempre que se cria um instituto deste tipo, susceptíveis de perversão prática, não têm semelhança, na sua configuração jurídica, com o modelo referendado que aqui nos foi adiantado pelo PSD em Novembro de 1987.

Se, como dizia um republicano insuspeito de qualquer conotação com as ideias políticas que perfilho - "um plebiscito não se discute, combate-se" -, pode-se dizer que essa expressão da sensibilidade republicana foi aqui acolhida, porque nesta segunda revisão constitucional o plebiscito foi combatido e não consagrado!

Essa rejeição é a forma mais concludente de não discutir e combater as operações plebiscitarias, a que a Constituição não dará acolhimento. Bem pelo contrário!

Vozes.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Em segundo lugar, é de sublinhar que foi rejeitada qualquer hipótese de referendo por iniciativa popular. O modelo que aqui está desenhado, só contempla uma iniciativa partindo de órgãos de soberania, isolada ou, porventura, conjugadamente (a norma não é clara sobre esse aspecto); em todo o caso, cabendo a palavra decisiva sempre e só ao Presidente da República. Não há forma de forçar a alteração dessa decisão. Mais ainda, e pelo contrário, são estabelecidos limites - os constantes do n.° 8 deste texto -, limites adicionais e de economia processual, que sublinham esse poder, dando-lhe a natureza de única (e não apenas última) instância.

Por outro lado, são adoptadas cautelas como as constantes do n.° 5 e, sobretudo a constante do n.° 6, quanto à fiscalização preventiva obrigatória da legalidade e constitucionalidade, tendentes a garantir ou contribuir para a não perversão de finalidades e para a defesa da Constituição, impedindo que o instituto exorbite as fronteiras que lhe são traçadas agora, em sede constitucional, mas também em sede de legislação ordinária, à qual é deferida uma larguíssima margem de opção, que torna o trabalho legislativo ordinário extremamente complexo.

Recordo que em Itália o referendo foi constitucionalmente consagrado no pós-guerra, na altura da aprovação da Constituição, só foi regulamentado em 1970 e aplicado, pela primeira vez, em 1974. Não sei se em Portugal será necessário esperar 22 anos pela regulamentação. Em todo o caso, a experiência de regulamentação das consultas populares locais constitucionalmente instituídas em 1982 que ainda agora está por fazer, ecoa no nosso espírito quando analisamos o regime agora traçado.

Em terceiro lugar a filosofia do regime consagrado não opera uma espécie de dualismo entre a soberania dos órgãos de soberania e a soberania do povo. O referendo é concebido (como demonstra o debate da primeira leitura, agora confirmado) como um elemento correctivo (e não substitutivo nem alternativo) da democracia representativa, tendo um papel puramente complementar ou auxiliar não substitutivo do papel, do estatuto dos partidos políticos e dos órgãos de soberania dentro da sua esfera de competência própria. Mais ainda: estabelece-se uma regra de intangibilidade do quadro constitucional e da reserva parlamentar, definida por expressa remissão para o artigo 164.° e para o domínio de reserva parlamentar absoluta em matéria legislativa, que tem implicações directas e indirectas que aqui situei, conduzindo a outras exclusões por razões de conexão ou por razões de lógica inescapável e de protecção indirecta do quadro constitucional. Alguns dos casos que aqui pude trazer, exemplificam este princípio, mas é evidente que seriam multiplicáveis indefinidamente os exemplos porque são tantos quantos as áreas em que a Constituição é imperativa e, como se sabe, ela é dirigente (e continuará a sê-lo!).

Em quarto lugar, prevê-se a subordinação do regime de intervenção mediante referendo a lei emanada das instituições representativas. É à Assembleia da República que cabe definir o regime do referendo e inclui-se essa matéria na sua área de reserva absoluta. Mais do que isso: nos termos do artigo 167.° (na redacção já indiciada pela aprovação feita no dia 24 de Fevereiro) o regime referendário terá de constar de lei orgânica. Com as específicas implicações que disto decorre no sistema desenhado nesta revisão constitucional é a uma lei orgânica quê cabe regular o referendo dentro dos parâmetros que a própria Constituição fixa, dentro dos limites, dentro das exclusões, dentro das regras formais, dentro das regras processuais, dentro das regras procedimentais que aqui são estabelecidas.

Gostaria de fazer algumas observações adicionais: primeira, este processo tal qual está aqui desenhado, não podendo ter origem nos cidadãos e nas minorias, não deve ser encarado como em outros ordenamentos jurídicos que prevêem a iniciativa popular; segunda observação: é um mecanismo demasiado caro para poder funcionar como uma sondagem ao natural; terceira: o referendo não é seguramente, tal qual está aqui traçado, a forma corrente de tomar decisões políticas, mesmo nas áreas em que elas são possíveis através deste