Este é um conceito importado, como é sabido, da terminologia comunitária e tem vindo a ser contestado, porque é um conceito que engloba simultaneamente, em termos que, a meu ver, não são prestigiantes para as autonomias regionais, por um lado, os Açores e a Madeira e as regiões espanholas e, por outro, os départements d'outre-mer franceses, isto é, se se quiser, os resquícios do império colonial.
Tem surgido a proposta, que me parece interessante, de procurar uma categoria específica, que é exactamente "as ilhas atlânticas" ou "as regiões comunitárias do Atlântico", e, nesse sentido, creio que não deveríamos ser nós a consagrar na Constituição portuguesa uma terminologia comunitária, que, segundo creio, tem sido adequadamente posta em causa, mesmo no seio das nossas regiões autónomas, não apenas nas regiões autónomas mas também nas relações das regiões autónomas com outras, como, por exemplo, as Canárias, etc.
Assim, fica aqui a interrogação sobre esta matéria, com a abertura para a considerar e esperando que aquilo que está presente nesta proposta não seja propriamente um "míssil" em período pré-eleitoral.
O Sr. Presidente (Barbosa de Melo): - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputados: Há aqui vários aspectos que, em minha opinião, devem merecer uma ponderada reflexão para podermos analisar esta proposta, que, no fundo, são duas com sentido semelhante.
Desde logo, vale a pena ponderar o âmbito que se pretende com este texto, porque, como sabemos, o Deputado José Magalhães, ao apresentar, em nome do PS, o conteúdo útil da proposta, restringiu-o - pareceu-me, pelo menos, ser essa a interpretação - às regiões autónomas. No entanto, não é essa a terminologia utilizada na proposta do PS.
O termo regiões, no contexto desta Constituição da República, é utilizado para várias realidades e se a intenção do PS é apenas garantir o desenvolvimento das regiões autónomas, é bom que isso seja dito dessa forma, porque, a não ser assim, o âmbito e o alcance da proposta socialista vai para além daquilo que foi expresso pelo Deputado José Magalhães.
Este é o primeiro aspecto e desde logo, quanto a isto, gostaria de deixar também, com toda a clareza, da parte do PSD, a seguinte nota: nesta discussão não pode ser esquecido que, naquilo que tem a ver com um tipo de regiões, que são as regiões administrativas, também previstas e reguladas nesta Constituição, conforme de resto já foi discutido nos trabalhos desta Comissão Eventual de Revisão, é defendido pelo PSD - e foi, nesta primeira fase, desde já aceite por uma maioria qualificada, penso até que praticamente pela totalidade dos partidos - que a criação das regiões e o seu desenvolvimento, necessariamente, porque são coisas que estão intimamente ligadas, fica condicionado à existência de uma pronúncia, de uma consulta popular.
Neste sentido, se for essa - e que fique aqui desde já claro - a intenção, embora não expressa na apresentação do Deputado José Magalhães, vemos com alguma dificuldade a inclusão deste normativo na Constituição. Obviamente, não podemos deixar, nesta fase, desde já, de chamar a atenção para a dificuldade que poderia resultar de uma redacção menos clara deste preceito quanto ao que ficará salvaguardado, mais à frente, na Constituição e que tem a ver com a necessidade da existência de um referendo e de uma consulta popular favorável a nível nacional para a implantação das regiões administrativas.
Esta é a primeira nota que gostaria que fosse clarificada, num segundo momento, pelo Partido Socialista e que tem a ver com o alcance desta norma.
Repito: a terminologia utilizada pelo PS é equívoca. Na sua exposição inicial, o Deputado José Magalhães apenas se referiu às autonomias, às regiões autónomas, mas o termo "regiões" é utilizado ao longo do texto constitucional para outro tipo de realidades, nomeadamente no artigo 81.º, que tem uma alínea d) onde se coloca como incumbência prioritária do Estado, no âmbito da organização económica, "Orientar o desenvolvimento económico e social no sentido do crescimento equilibrado de todos os sectores e regiões e eliminar progressivamente as diferenças económicas entre a cidade e o campo".
Embora o artigo 81.º esteja inscrito na organização económica e possa ser entendido como um aspecto parcelar do desenvolvimento das regiões, chamo a atenção para o facto de o desenvolvimento económico e social ser tratado expressamente pela alínea d) do artigo 81.º. Portanto, também questionamos, se for esse, genericamente, o intuito desta proposta do PS, a sua necessidade, exactamente pela existência desta alínea d) do artigo 81.º.
Mas, para além dela e cingindo-me agora ao âmbito de aplicação da interpretação inicial do Deputado José Magalhães, que tem a ver com as autonomias regionais, chamo a atenção para o artigo 231.º, o qual, do meu ponto de vista, pode colocar uma dificuldade a esta redacção proposta, se ela se relacionar apenas com as regiões autónomas.
O artigo 231.º diz claramente que o desenvolvimento das regiões autónomas é uma tarefa conjunta, como não podia deixar de ser por causa do próprio conceito de autonomia, dos órgãos de soberania da República e dos órgãos de governo próprio das regiões.
Assim, se vier a prevalecer a intenção de incluir no artigo 9.º - Tarefas fundamentais do Estado a alínea que se destina a promover o desenvolvimento das regiões, temos de analisar e reflectir, desde logo, se isso é desejável e, se assim for, temos de acautelar, necessariamente, a sua eventual compatibilização com o artigo 231.º, não ferindo minimamente aquilo que resulta claramente deste artigo e do próprio conceito e fundamento da autonomia, ou seja, a necessidade de cooperação e de partilha de responsabilidades entre os órgãos de soberania e os órgãos de governo próprio regional na promoção e na salvaguarda do desenvolvimento económico e social das regiões autónomas.
Em conclusão, deixo aqui, por um lado, um pedido de esclarecimento no sentido da clarificação do âmbito exacto das expressões utilizadas, porque a terminologia é equívoca. Por outro, nesta primeira intervenção, deixo também estas cautelas, que devem ser reflectidas por nós todos, de modo a, depois, no decurso da reflexão em conjunto, o PSD poder averiguar mais em definitivo se concorda ou não com um qualquer tipo de melhoria, que não esta, ou não com esta redacção seguramente, para o artigo 9.º.
O Sr. Presidente (Barbosa de Melo): - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Agradeço as observações feitas, que são bastante estimulantes, e gostaria de clarificar algumas coisas, sendo que a primeira tem a ver com o rigoroso âmbito do preceito.