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como daqui decorreria, que pode caber neste tipo de situações. Dito de outra forma, esta norma apenas poderá ter efeitos para o chamado direito europeu de aplicação directa e não para outro, e, no entanto, ambos são aqui referidos ao utilizar-se a expressão "ou emanadas de órgãos da União Europeia", porque sabemos que a legislação europeia abarca um conjunto de situações que são qualificadas de forma diversa face à sua aplicabilidade directa ou indirecta nas ordens jurídicas internas.
Para mim, a dificuldade resulta exactamente deste acrescento à Lei do Tribunal Constitucional, acrescento que, do meu ponto de vista, torna a alínea incorrecta, porque não pode ser assim, de facto. A Dr.ª Eduarda Azevedo está-me a fazer sinal de que também tem a mesma opinião e, eventualmente, ela poderá clarificar este ponto ainda melhor do que eu.
Em todo o caso, penso que o Sr. Presidente já percebeu a dúvida colocada. De facto, não se pode utilizar a expressão "ou emanadas de órgãos da União Europeia" tout court, porque tal torna incorrecto o preceito em causa.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, percebo perfeitamente a sua questão, mas não posso concordar consigo, porque esta norma não pretende resolver esse problema! Esta norma não pretende resolver em que medida, como, com que autoridade é que o direito internacional ou o direito da União Europeia prevalece sobre o direito interno, apenas pretende resolver um problema processual que é o seguinte: sempre que um tribunal, bem ou mal, com fundamento ou sem ele, recusar a aplicação da norma de direito interno invocando como fundamento que ela é desconforme com uma norma de direito internacional, com uma norma de direito europeu, essa decisão é recorrível para o Tribunal Constitucional. Portanto, argumentar que as directivas, por exemplo, nem sempre são vinculantes… Isso é óbvio! Todos nós, os que estamos minimamente familiarizados com o direito europeu, sabemos que assim é.
Todavia, repito, não é esse o problema que queremos aqui resolver. O problema que carece de resolução é o de admitir um recurso de uma decisão judicial que, bem ou mal, haja recusado a aplicação de uma norma de direito interno. Imagine que um tribunal, contrariando essa boa doutrina que, aliás, não é discutível, recusa a aplicação de uma norma de direito interno com base numa directiva que…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Que não está transposta!

O Sr. Presidente: - … não está transposta, que não seja de aplicação directa. O que nós queremos é que essa decisão seja recorrível, exactamente para que o Tribunal Constitucional possa dizer: "Caro Sr. Tribunal, independentemente de saber qual é a eficácia do direito da União Europeia sobre o direito interno, nesse caso claramente não tinha razão nenhuma para desaplicar a norma!" Portanto, vale para o direito europeu o que já vale hoje, segundo a Lei do Tribunal Constitucional, para o direito internacional. Um tribunal pode desaplicar uma norma de direito interno invocando uma norma de direito internacional, que até pode já não estar em vigor por ter caducado.
Portanto, o que nós queremos é que, independentemente de se apurar se, no caso concreto, a norma externa - utilizo norma externa para dizer norma do direito internacional ou norma da União Europeia - vincula o Estado português, se se aplica na nossa ordem jurídica e se prevalece ou não sobre a ordem interna, sempre que um tribunal se recusar a aplicar uma norma de direito interno com fundamento nisso, bem ou mal, essa decisão poderá ser recorrível para o Tribunal Constitucional.
Fazemo-lo justamente para permitir que o Tribunal Constitucional, quanto mais não seja, diga quais são os casos em que não há norma internacional vinculante, ou, havendo-a, que ela, apesar de tudo, não deve prevalecer se, porventura, o Tribunal acolher a doutrina que o jurisconsulto Barbosa de Melo defende matéria de direito internacional.
Por exemplo, eu também entendo que nem em todos os casos uma norma de direito internacional prevalece sobre o direito interno e, porventura, uma norma de um simples acordo administrativo não há-de prevalecer sempre sobre a norma da Assembleia da República. Mas a Constituição não diz em que casos é que é assim, essa matéria está aberta à doutrina com a liberdade que ela tem mantido até agora e, portanto, está aberta também à jurisprudência. Assim sendo, apenas queremos que haja a possibilidade de um tribunal qualquer recorrer para outro, cuja capacidade de uniformização se explica apenas pela autoridade do seu juízo, mesmo que não tenha capacidade de fazer assentos nessa matéria. De qualquer modo, o Tribunal Constitucional, pela autoridade do seu juízo, servirá de instância de interpretação na área do direito internacional e na área do direito interno.
Como sabem, a grande polémica que se criou na primeira fase do Tribunal Constitucional foi a propósito de saber se um decreto-lei que alterava os juros das dívidas tituladas por letras era ou não contrário à lei uniforme sobre as letras e se, sendo contrário, a norma de direito internacional prevalecia, situação que deu lugar às mais desencontradas decisões dos tribunais comuns. Ora, se essa questão tivesse surgido já depois da revisão da Lei do Tribunal Constitucional, uma coisa é certa, todas essas decisões teriam ido para o Tribunal Constitucional e teriam tido uma decisão porventura uniforme: boa ou má, mas pelo menos uniforme!
No entanto, o que aconteceu foi que se gerou a maior confusão na nossa ordem jurídica, com tribunais a julgar que a norma já não estava em vigor porque tinha caducado ou, então, dizendo que, mesmo que ainda estivesse em vigor, não prevalecia sobre o decreto-lei que a tinha alterado em desconformidade com ela. Alguns consideraram mesmo que essa era uma questão de constitucionalidade; outros consideraram que não era uma questão de constitucionalidade; uns admitindo recurso para o Tribunal Constitucional, outros não admitindo. E, no Tribunal Constitucional, uns (uma secção) considerando que o recurso era admissível, outros, noutra secção, julgando que não era admissível. Na secção que julgava o recurso admissível, uns juizes pensando que a questão era de constitucionalidade e outros que não era de constitucionalidade. E, por fim, dentro dos que entendiam que a questão não era de constitucionalidade, uns pensando que a norma devia prevalecer e outros que a norma não devia prevalecer. Mas o juízo que acabou por dominar na secção que conhecia do recurso era o de que era uma questão de constitucionalidade.