Quanto à questão de transportar algo para o artigo 7.ºda Constituição, tal como já referi, e aliás o Sr. Deputado Luís Marques Guedes também já respondeu a esta questão, entendemos que não se trata de um novo fixismo. Excluindo agora a questão de saber se isto implica que o Estatuto seja revisto daqui a sete anos, ou não, e se encaixa na nossa redacção, já que se trata de uma questão de redacção do último ponto, pelo que a devemos remeter para mais tarde, julgo que a introdução de princípios que para nós não são fixistas, porque o fixismo é apenas de determinadas soluções, é uma questão diferente.
Como sabe, sou contra o determinismo (aliás, às vezes penso que já deve estar farto de me ouvir), sou contra o fixismo, a política não tem realidades finais, não há objectivos finais, não há paraísos na terra… Mas, atenção: eu faço a distinção entre o que é permanente sem ser fixista, que são os princípios, por exemplo o direito à vida e os demais princípios ligados ao respeito pelos Direitos do Homem. Aqui, não se trata de uma questão de fixismo, mas de permanência de valores, existindo uma grande diferença. Com efeito, o fixismo prende-se com as soluções, com as regras jurídicas, etc. - e podemos debater esta matéria quando chegar a altura, ouvindo os seus argumentos. Outro aspecto é a proclamação dos princípios que são permanentes, o que já nada tem a ver com fixismo.
Não vale a pena entrar em mais debates jurídicos, estritamente de técnica jurídica - aliás, temos outros especialistas que o podem fazer melhor do que eu -, porque ainda estamos muito longe desse estádio. Com certeza que o Sr. Presidente quer avançar depressa, mas ainda estamos na primeira reunião, e como dizem os franceses (para ver que nada tenho contra eles) "à chaque jour suffit sa peine", veremos essas questões no momento adequado.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, suponho que não é o Presidente que quer avançar depressa, somos todos nós que queremos cumprir determinados calendários.
Como o PS fez uma apresentação conjunta do TPI e do espaço de liberdade, de segurança e de justiça, vamos dar possibilidade fazer perguntas sobre esta matéria a quem o queira fazer, a menos que o PS queira acrescentar algo.
Para pedir esclarecimentos, inscreveu-se o Sr. Deputado Luís Marques Guedes, a quem vou dar a palavra de seguida.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, vou ser breve, até porque o essencial está basicamente dito. Vou colocar apenas uma questão sobre o espaço judiciário europeu, uma vez que esta proposta retoma, de alguma forma, o debate que tivemos a propósito da proposta do TPI.
A primeira referência que gostaria de deixar para contribuir para a reflexão de todos, em particular do Deputado Jorge Lacão, é a seguinte: relativamente a esta matéria, é curioso que o Partido Socialista, no artigo 7.º, onde se estabelece a habilitação constitucional para as nossas convenções sobre o aprofundamento da União Europeia, tivesse considerado importante afirmar princípios e defender objectivos. Chamo a atenção do Sr. Deputado Jorge Lacão para o facto de - e foi por essa razão que o PSD apresentou a proposta sobre o TPI, incorporando critérios e objectivos, ou valores, como disse o Deputado Pedro Roseta - ser exactamente por esta ordem de razões, que os senhores aparentemente também sentem em relação problema da União Europeia, que nós, na formulação da adesão ao TPI, entendemos que também era preciso afirmar princípios. Este é que é o nosso acervo constitucional.
À semelhança do que o Partido Socialista propõe para a adesão ao TPI, o n.º 6 do artigo 7.º da CRP poderia estabelecer que Portugal podia aderir à construção da União Europeia nas condições previstas no tratado de Maastricht. Ou seja, a revisão constitucional feita em 1992, para acrescentar este número 6.º à Constituição, podia ter estabelecido que assim era, o que seria semelhante àquilo que o PS agora nos propõe. Mas não foi essa a solução da nossa Constituição, porque a Lei Fundamental tem uma matriz própria. O que se disse na altura foi que "Portugal pode, em condições de reciprocidade, com o respeito pelo princípio das subsidiariedade e tendo em vista a realização da coesão económica social (…)". Estes são os valores defendidos pelo Tratado de Maastricht.
Foi esta a forma como os Deputados imbuídos de poderes constituintes, na altura, entenderam que se iria criar a habilitação constitucional do Governo e do Estado português para ratificar o Tratado de Maastricht, tendo a Assembleia da República entendido que era importante afirmar na Constituição da República princípios fundadores desta nossa opção e valores que deveriam, e devem necessariamente, ser prosseguidos na participação de Portugal na construção europeia.
De igual modo, propomos o que propomos para a criação da justiça internacional e estabelecemos determinados valores que devem e têm de ser prosseguidos por Portugal, como disse o Deputado Pedro Roseta, ao aceitar entrar nesta aventura - porque de uma aventura se trata, mas a qual o PSD considera ser externamente positiva para a regulação de um mundo melhor e do respeito pelos direitos da pessoa humana -, que é a tentativa de criação, pela primeira vez, de uma justiça penal internacional que não seja pontual e virada apenas para os vencedores.
Esta questão entronca na pergunta que quero colocar ao Sr. Deputado Jorge Lacão e que se prende com o seguinte: o n.º 6 do artigo 7.º foi feito para ratificar o Tratado de Maastricht, o qual já continha, com toda a clareza, o terceiro pilar, que é o da construção do espaço judiciário, da segurança e da justiça dos cidadãos. E, portanto, se o n.º 6 já foi introduzido, consciente e objectivamente, com o intuito de ratificar Maastricht, e se Maastricht já continha com toda a clareza o terceiro pilar, qual é a necessidade, a razão, a mais-valia do acrescento que se quer fazer? É que a razão de ser do n.º 6, na redacção actual da Constituição, repito, já foi para incorporar um tratado que pressuponha como terceiro pilar a construção do espaço de segurança e justiça europeia.
De resto, devo dizer ao Sr. Deputado que, neste caso, não colhe a ideia de que a Constituição deveria ter alguma estabilidade, que foi o argumento que utilizou para justificar a inserção sistemática da proposta do PS nas normas transitórias, alegando que as matérias que constam do artigo 7.º são aquelas que já estão conformadas. Acontece, Sr. Deputado, que não foi assim com o Tratado de Maastricht - e como prova disso temos o n.º 6 - e, aparentemente, também não é assim com a proposta que agora nos apresentam!
Com efeito, quando fez a apresentação da proposta do PS, o Sr. Deputado Jorge Lacão foi o primeiro a deixar claro que os contornos deste aprofundamento ainda não estão definidos e estão muito longe de estarem concluídos. Mas, como diz o Sr. Deputado Pedro Roseta, ainda bem que assim é, porque é sinal que não há "perfeições" e que a construção europeia é um trabalho continuado, sem fim.