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Sessão de 21 e 22 de Março de 1923
capítulo circulação monetária, que vou ler, Sr. Presidente:
«Não tínhamos ouro, mas Londres despejava sôbre nós as suas libras pela cornucópia da abundância.
Era um negócio, em que a Inglaterra só podia ganhar, e nós só podíamos perder.
Como o Govêrno Britânico apenas concedia uma tolerância de 2 por mil no pêso dos seus soberanos, exportavam-se para Portugal as moedas retiradas da circulação, que vinham ter aqui curso forçado.
A moeda rejeitada lá era moeda boa cá.
Numa média anual de 760 mil libras alguma cousa era, mas o que clava maiores lucros era a diferença de valores, em volta de 4$500 réis invariavelmente atribuídos por nós à libra.
Com o câmbio a 54 3/8, e valendo, assim as libras 4$413 réis em Londres, mandavam-se para Lisboa, onde tinham o valor autorizado de 4$500 réis. Era um lucro certo de 87 réis em cada libra.
Pelo contrário, baixando o câmbio a 52 1/8, e valendo assim a libra em Londres 4$604 réis, fazia-se a operação inversamente.
Iam as libras de cá, perdendo nós então 104 réis em cada libra.
Dêste modo se foi vivendo do ouro, que a Inglaterra alternadamente nos mandava para cá, e de cá nos levava.
Acabou pela bancarrota, essa falsa idade de ouro.
Agora, depois de sumido o ouro, é o delírio da nota...«.
Eis como explica o eminente publicista, alta autoridade na matéria, as consequências do facto insensato de se ter dado curso legal, no nosso país, às moedas inglesas de ouro.
É claro que hoje vivendo nós num regime da inconvertibilidade da nota, no regime do curso forçado do papel fiduciário emitido pelo Banco de Portugal, a questão do curso legal das moedas inglesas de ouro, não tem maior importância.
Mas, por isso mesmo, é que me surpreende a ficção de inscrever nos títulos, libras esterlinas para um empréstimo interno que não visa senão a obter algumas dezenas de escudos papel, para os gastos improdutivos do Estado!
Causas diversas tem provocado, Sr. Presidente, a desvalorização da nossa moeda.
Mas chega a ser inaudito que o próprio Estado consagre e proclame, perante os seus nacionais, essa desvalorização, estimulando mais ainda a sua depreciação.
Em L904, Sr. Presidente, o falecido estadista Sr. Dr. Teixeira de Sousa, conseguiu pôr à discussão nesta Câmara a sua famosa proposta do pagamento dos direitos aduaneiros em ouro.
A proposta não passou.
Mas no decorrer do vivo combate, os seus adversários observaram que não fazia sentido que o próprio Estado não quisesse receber em pagamento a sua moeda legal.
O falecido professor, Sr. Dr. Marnoco e Sousa, que foi mais tarde, como se sabe, correligionário político do Sr. Dr. Teixeira de Sousa, com a sua autoridade scientífica e a sua alta imparcialidade, ensinava em 1909,, na Universidade de Coimbra, aos seus alunos, que o pagamento dos direitos em ouro, em vez de o ser em moeda portuguesa, era um êrro injustificável que concorria para a desvalorização da moeda.
«Ainda bem que não passou a proposta», acrescentou o eminente professor.
O Sr. Dr. Marnoco e Sousa faleceu. Êle fora o meu mestre.
Era um trabalhador incomparável, muito sabedor, um espírito verdadeiramente moderno e progressivo.
Foi irreparável a sua falta na Universidade, e deixe-me, Sr. Presidente, que eu aproveite o ensejo para render, à sua memória, as minhas sentidas e saudosas homenagens.
Estava tam longe de supor o Sr. Dr. Marnoco e Sousa que, alguns anos após a proclamação da República, a medida sôbre pagamento dos direitos aduaneiros em ouro, seria um facto no nosso país
Isso se fez num período de depreciação crescente da nossa moeda. Foi em 1918, em ditadura, sem publicidade prévia, sem qualquer debate contraditório.
O Sr. Anselmo de Andrade, como Ministro da Fazenda, havia formulado uma proposta semelhante em 1910.