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Sessão de 4 de Novembro de 1924

Entendo que o enunciado das questões, como se faz na declaração ministerial, não acrescenta nada, nem ao prestígio do Govêrno, nem aos conhecimentos do País.

O estudo das questões faz-se dentro dos gabinetes e, quando apenas se trata de enunciar problemas, aliás enunciados de há muito e cuja solução há muito se anuncia, apenas se atinge uma virtude: a de ocupar espaço na declaração ministerial.

Pela pasta do Comércio, o Govêrno afirma o desejo de realizar uma vasta obra e traz ao conhecimento da Câmara algumas das cousas que já realizou — e vamos que dessas nem todas se explicam muito bem.

O Sr. Ministro do Comércio vem dizer, por exemplo, que mandou fazer uma sindicância à Direcção Fiscal dos Caminhos de Ferro. Que me conste, não mandou fazer só essa, mas várias, e, se são justas, honra seja ao Sr. Ministro do Comércio.

Mas não vejo razão para trazer aqui a Direcção Fiscal dos Caminhos de Ferro, uma entidade e um serviço público sindicados, quando outros de muito mais importância também o estão sendo, sem que o Govêrno a êles se julgasse na obriga-, cão de se referir na sua declaração. Parece-me até que talvez não seja inoportuno lembrar ao Govêrno que, sendo a lei igual para todos, quando se mande proceder a sindicâncias, os sindicados devem ser suspensos das suas funções, mas todos, sem que uns sejam tratados como filhos e outros como enteados, a fim de que as sindicâncias decorram com perfeita independência de poderes e todas as responsabilidades se possam apurar.

Agora, Sr. Presidente, parece-me que estão a correr pelo Ministério do Comércio sindicâncias em que os sindicados continuam nos seus lugares.

Dizem-me, por exemplo, que, na Direcção do Minho e Douro, está a ser sindicado o engenheiro-director, que continua ao serviço, emquanto o director dos serviços de fiscalização suponho que está suspenso.

Sr. Presidente: o Sr. Ministro do Comércio podia ter trazido factos mais importantes da sua vida administrativa. Podia, por exemplo, com o seu espírito de justiça, que já tive ocasião de aqui elogiar sinceramente, dizer-nos que prestou, em nome do Govêrno, uma justa homenagem ao grande mestre António Augusto Gonçalves, dando o seu nome a uma escola de Lisboa. Mas o Sr. Ministro do Comércio não quis apoucar o mestre António Augusto Gonçalves.

O Sr. Ministro esqueceu-se de que por um motivo de simpatia muito interessante e louvável, por aquele princípio de que «quem meus filhos beija a minha boca adoça», ao mesmo tempo que dava a uma escola de Lisboa o nome de António Augusto Gonçalves, dava a uma escola de Vila do Conde o nome de uma criança, filha de um amigo seu.

Eu sei, Sr. Presidente, que êstes casos em nada acrescentam o libelo que a oposição, porventura, faça a S. Exa.; sei que êles não retiram a S. Exa. as suas florescentes glórias, mas sejamos justos e sérios na função administrativa. Não caiamos em cousas ridículas, que colocam mal o Poder.

Eu compreendo que o Sr. Ministro do -Comércio, querendo adoçar a boca a todos os filhos dos seus eleitores, pensasse em criar muitas escolas, para lhes dar os nomes de todos êles, mas fazer isso só a uma filha de um eleitor é descontentar os outros.

Sr. Presidente: eu bem sei que isto é uma cousa mínima, e que em nada deminui o Sr. Ministro do Comércio, mas a verdade é que não se devia fazer essa partida ao mestre António Augusto Gonçalves, porque outra cousa não se pode chamar ao facto de, paralelamente a dar-se o seu ilustre nome a uma escola, dar-se o nome de uma petiza a outra escola.

O Sr. Ministro do Comércio, que, aliás, tem procurado trabalhar, bem podia dispensar-se de cousas ridículas, que mais fazem supor partidas dos seus adversários.

Como se compreende que venha o Govêrno declarar que está disposto a organizar o ensino comercial, e o Sr. Ministro do Comércio esteja transformando as escolas industriais sem esperar a reorganização?

Este caso é daqueles que podem colocar o Sr. Ministro do Comércio na lama das ruas, politicamente falando, e só traz desprestígio para o Ministro e para o Govêrno.