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4 DE MAIO DE 1971 763

tico pelas regras estabelecidas, o abuso de horas extraordinárias não remuneradas, a privação do descanso semanal" como motivo para se ter enraizado "no espírito dos trabalhadores um sentimento de amargura que não concorre para consolidar a paz social". Lembrando que a obrigatoriedade do descanso dominical fora imposta havia mais de um quarto de século e que as horas extraordinárias, pelos vistos abusivas e não remuneradas, deveriam ser pagas pelo dobro do salário normal nos termos da legislação do imediato pós-guerra, ter-se-á ideia ao desencanto que ocasionaria tão patente desfasamento entre a "regulamentação do trabalho" e os factos da vida laboral.
Referindo-se às disposições que ao tempo vigoravam, dizia o citado preâmbulo:

Destas, muitas teriam necessàriamente de subsistir, por já estarem nos costumes e nas leis ou por nos prenderem a elas obrigações de carácter internacional. Restava fazer a sua revisão à luz dos princípios estabelecidos pelo Estatuto do Trabalho Nacional e preparar a sua integração no moderno direito corporativo.

O novo diploma não se eximira, com efeito, a ser tributário da "filosofia" corporativa do Estatuto e a orientar-se pelos rumos que ele definira.
Certos princípios basilares expostos no artigo 24.° acham um mínimo de concretização no decreto-lei e constituem pressupostos dos comandos administrativos da sua aplicação. Vale a pena aproximar o texto desse artigo 24.° do preâmbulo mais de uma vez transcrito.
Um dos princípios, além enunciado e aqui explìcitamente referido, traduz reacção contra o desacreditado sistema de "actuar mais em superfície do que em profundidade", que havia contrariado os excelentes propósitos da legislação de 1919: a regulamentação da duração do trabalho não seria desta feita impregnada pelo desejo de a moldar em regras absolutas, antes deveria ter em conta, com "normas suficientemente elásticas", as características específicas e as condições internas das diferentes actividades.
Outro principio, em boa medida dedutível do primeiro, afirma, sem prejuízo de o Estado não poder enjeitar a obrigação de fixar limites máximos, certa subsidiariedade da regulamentação por via legal em face da competência normativa dos contratos de trabalho e dos regimentos corporativos 96.
Deste se infere lògicamente um terceiro: a regulamentação da duração do trabalho nem deve ser "imposta arbitràriamente pelo Estado" nem dimanar dos eventos "de conflitos de natureza social", mas ser articulada "segundo plano apropriado aos interesses da Nação, das empresas e dos trabalhadores".
No E.T.N. encontrou, de resto, o legislador, além da sua inspiração doutrinária, algumas soluções de um programa de regulamentação. É o caso, por exemplo, da regra da melhor retribuição do trabalho nocturno (§ 1.° do artigo 24.°), da excepcionalidade do dia de descanso semanal fora do domingo (artigo 26.°) e do pagamento pelo dobro da remuneração normal do trabalho que venha a ser prestado nesse dia (§ 2.° do artigo 26.°).
O ambiente em que então decorria a vida portuguesa era de calma política virtualmente consolidada e propícia à mobilização dos espíritos mais doutrinados e mais combativos para as tarefas da estruturação corporativa e da acção social, que o primeiro Subsecretário de Estado das Corporações, Dr. Pedro Teotónio Pereira, designou por "batalha do futuro".
Porque entretanto se criara o Instituto Nacional do Trabalho e Previdência, aconteceu que a chamada legislação de 33 não dispunha sòmente da sua própria dinâmica: aproveitava em pleno do dinamismo da primeira geração de delegados distritais e de assistentes dos serviços de acção social.
Convém recordar que, pelo seu carácter um tanto pragmático e relativa simplicidade, a regulamentação da duração do trabalho logrou ser concluída e posta em execução antes de qualquer outra, salvo naturalmente as constantes, dos decretos-leis que em 23 de Setembro de 1933 se seguiram no Diário do Governo ao Estatuto do Trabalho Nacional e respeitavam, na maior parte, à organização corporativa.
O Decreto-Lei n.° 24 402 precedeu desta sorte diplomas mais complexos, como a Lei n.º 1884, sobre previdência social, a Lei n.° 1942, sobre acidentes de trabalho e doenças profissionais, e a Lei n.° 1952, sobre o regime jurídico do contrato de trabalho.
A cronologia destas leis essenciais permitiria supor, se a informação de documentos da época e o testemunho pessoal dos intervenientes directos não bastassem como prova irrefragável, que durante alguns meses o I.N.T.P. se empenhou acima de tudo em explicitar, fomentar a aplicação e fiscalizar o cumprimento do Decreto-Lei n.° 24 402. O próprio serviço destinado à fiscalização das leis sociais, hoje intitulado "Inspecção do Trabalho", depois de ter sido denominado "Fiscalização do Trabalho", começou por chamar-se simplesmente "Fiscalização do Horário de Trabalho".
Todas as circunstâncias descritas encaminharam, de facto, para que, pela primeira vez entre nós, o problema da duração do trabalho fosse tomado, como pretendera o legislador, segundo exarou nas palavras introdutórias do decreto-lei, na conta de "problema sério".
Dentro da mesma óptica, não será demasiado adiantar que, apesar das consabidas imperfeições e obscuridades e não obstante inevitáveis dificuldades de execução e deficiências de acção fiscalizadora, o decreto-lei teve o papel histórico de passar ao concreto certo número de ideais até aí mais ou menos sepultados em vistosos e platónicos diplomas de lei, habituando os seus destinatários à disciplina mínima da duração do trabalho.
Não será decerto razão despicienda da posição que definitivamente ocupa no quadro da legislação de natureza social.

§ 8.º

O projecto de decreto-lei

31. Vem o Governo consultar a Câmara Corporativa sobre o projecto de decreto-lei n.° 5/X, destinado a regular a "duração do trabalho prestado por força de contrato de trabalho". Propõe-se, com o instrumento legal projectado, substituir, mediante revogação expressa, o Decreto n.° 22 500, de 10 de Maio de 1933, e o Decreto-Lei n.° 24 402, de 24 de Agosto de 1934.
Cumpre, antes de mais, à Câmara Corporativa pronunciar-se acerca da oportunidade de novo diploma e a respeito dos princípios legais constantes do projecto.

32. Como se recordou, o Decreto-Lei n.° 24 402 foi publicado em 24 de Agosto de 1934. Equivale a dizer que completou trinta e seis anos de vigência. É verdade que já por duas vezes lhe foram introduzidas modifica-

96 Sobre a questão convenções colectivas como fonte de horário de trabalho, Dr. A. Silva Leal, ob. cit., fls. 105 e segs.