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23 DE ABRIL DE 1940 33

conserve intacta na mão do cultivador mais apto para fazê-la exercer a sua função económica e política?
O elevado objectivo, que as exigências do povoamento o solo colonial por gente da metrópole tornam mais imperioso, justificará, porventura, que se procure atingi-lo, até com sacrifício e preterição dos princípios que dominam o nosso direito sucessório, embora consagrado por tradição secular?
Não faltam categorizadas figuras da ciência moderna que assim pensam. E esta a orientação perfilhada pelo Vrof. Severino Aznar, catedrático da Universidade Central de Madrid e membro da Academia das Ciências Morais e Políticas, o qual, no seu belo livro Despoblación y Colonizatión, afirmando-se estrénuo defensor da indivisibilidade do casal após a morte do seu proprietário, atribue a resistência contra este traço essencial do regime da instituição à formação e tendências ainda demasiadamente individualistas dos modernos pensadores.
Entretanto parece à Câmara Corporativa que é injustificada a doutrina do projecto sobre casais de família por preterir de modo radical os direitos de sucessão dos descendentes do colono proprietário do casal.
Não se desconhecem os nobres e justificados intuitos do projecto que pretende evitar o parcelamento do casal a morte do seu proprietário, escolher o melhor colono para administrar o casal, vincular a família do bom colono à gleba que estava cultivando e promover, assim, a fixação no solo colonial de núcleos sempre crescentes de população branca. Mas nesta orientação não será possível, sem graves inconvenientes, caminhar muito além dos preceitos constantes da legislação pátria sobre casal de família sancionados em legislações estrangeiras anteriormente referidas.
O sistema do projecto, para assegurar a indivisibilidade do casal depois da morte do seu dono, determinaria transformação profunda no nosso direito sucessório, que não seria isenta de inconvenientes; e a crítica das suas disposições anteriormente feita permite avaliar as dificuldades que se oporiam à organização de sistema de normas racionais e justas que assegurassem aos herdeiros privados do casal certas compensações pela perda dos seus direitos de herdeiros.
Diz-se, em contrário desta orientação, que é sempre o critério individualista que inspira a repugnância pela atribuição do casal a um dos herdeiros com exclusão dos outros e que essa repugnância se dissipará atendendo-se a que o colono recebe um benefício do Estado não para o contemplar individualmente e permitir-lhe contemplar os seus herdeiros, mas com o fim social de garantir a famílias da metrópole condições de subsistência necessárias para a fixação nas colónias de núcleos de população europeia; que a função social do casal de família não permitirá estranhar que por morte do colono fiquem privados da propriedade da gleba alguns dos seus herdeiros, sendo certo que a gleba indivisível, em poder do melhor sucessor no casal, do melhor colono, continuará a permitir a manutenção duma família europeia de cultivadores, e que os coherdeiros nenhuma utilidade poderiam produzir, nem apreciável proveito

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(Dr. Luiz de Fina Munique, A fragmentação, da propriedade rústica, Lisboa, 1935, p. 15).
Façam-se paralelamente (na metrópole) o cadastro geométrico da propriedade rústica e o inquérito às condições de vida da população rural e ver-se-á que na região onde a propriedade se pulverizou, e quási se anulou como instrumento de produção, o nível de vida é mais baixo e a miséria maior» (Cf. parecer da Câmara Corporativa cit., loc. cit., p. 842-TTTT).
Todos conhecem, os clamores que se têm levantado contra a excessiva fragmentação da propriedade que se observa em determinadas regiões da metrópole, Atribuída em grande parte à partilha igualitária dos bens da herança paterna pêlos seus sucessores.
A preocupação de remediar tom pernicioso estado de cousas determinou Oliveira Martins a apresentar em 1877 à Câmara dos Deputados o seu conhecido projecto. E outras tentativas se seguiram, a de Elvino de Brito, em 1880, com o projecto de lei sobre fomento rural, e a do Dr. Moreira Júnior, em 1910, com a proposta de lei relativa ao povoamento agrícola.
Vai inspirado por intuitos idênticos e determinado pêlos factos acima referidos o trabalho do Dr. Xavier Cordeiro sobre O Problema da Vinculação - memória apresentada à Associação dos Advogados de Lisboa em 1917. Descrevendo o mal do parcelamento excessivo da propriedade no norte do País, resultante, entre outras causas, do sistema da sucessão por morte, consagrado pelo regime liberal, com a partilha integral da herança por todos os filhos, o malogrado jurisconsulto propugna o restabelecimento dos vínculos.
Diz Oliveira Martins, em certo passo do relatório do sou projecto de lei, muito a propósito citado pelo Dr. Xavier Cordeiro:

«Boyd Kinnear, no seu luminoso tratado Principles of property in land, diz-nos que o êrro das leis francesas (que serviram de tipo às nossas) está na divisão de uma propriedade rural em partes iguais entre os herdeiros de um proprietário. B óbvio, acrescenta, que semelhante disposição não só divide a terra mais do que devera ser, mas que vem a dar a um mesmo dono retalhos dispersos separados por distâncias consideráveis. Esta questão acho-se cabalmente discutida nos termos do relatório da comissão geral de inquérito agrícola francês de 1869; e nas suas conferências agrícolas George Ville afirma que, em média, cada dono de terras em Franca possue catorze retalhos!
Numa escala, maior ainda porventura, mas que não é possível determinar numericamente, dá-se o mesmo no nosso Minho.
Os publicistas Foville e Leroy Beaulieu têm chamado instantemente a atenção dos poderes públicos para este mal que em França denominam morcellement e que traduzido devemos dizer fragmentação. Divisão e fragmentação são fenómenos concomitantes no regime francês, que é também o português, das sucessões hereditárias; e dêsses fenómenos resulta a evicção do lavrador por impossibilidade de cultura proveitosa e a reconstituição da propriedade, não já em poder de quem directamente a explora, mas sim na mão de capitalistas, que a compram em praça».

Depois de descrever a situação a que estavam reduzidos as populações rurais de certas legiões do Minho, cuja propriedade se tinha pulverizado pala sucessiva divisão de heranças a ponto de haver courelas que eram impróprias para qualquer aproveitamento, escreve ainda:

«Várias leis têm entre nós concorrido para o progresso da divisão e da fraccionação das glebas. As de 1860 e 1868, que aboliram os vínculos, são as primeiras, e estão a seu lado os de desamortização por virtude das quais se têm vendido os domínios directos das corporações religiosas, transformando assim os bens de prazo indivisíveis em alodiais, divisíveis e fraccionáveis. O Código Civil veio depois abolir todos os privilégios de partilhas e ordenar a divisão igual entre os herdeiros. Ordenou além disso o Código o registo dos ónus reais, mandando registar os foros minúsculos que seus donos preferem vender e a consequente alodialidade e divisão ulterior dos prédios.
For cima de tudo isto veio a lei de 18 de Maio de 1880 impor o pagamento da contribuição de registo por título oneroso os tornos devidos em acto de partilha.
Desapareciam por um lodo todos os vínculos que impediam a divisão da propriedade, ao mesmo tempo que, pelo outro, se onerava o encabeçamento, usual no norte do País, equiparando as tornos a uma venda».

Não é menos grave em nossos dias a situação descrita por Oliveira Martins, com a abertura de novas sucessões, e até com o agravamento dos encargos tributários que origina a morte do proprietário rural.
A experiência da fragmentação da propriedade na metrópole e as suas lamentáveis consequências aconselham a inserção, no projecto, de providencias que, sem derrogação pura e simples do vigente regime sucessório, previnam, tanto quanto possível, a pulverização dos glebas que venham a constituir os casais de família. Convém não esquecer que, pela economia do projecto, se atribue a cada colono a área de terra necessária para a sua sustentação e de sua família, e que, segundo declara o capitão Manuel de Abreu Ferreira de Carvalho, antigo governador da província da Huíla, em ofício de 28 de Fevereiro de 1989 (of. parecer n.° 15), já existem no planalto de Huíla fazendas com a área de 2 hectares!