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58 DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 47

O mesmo varão antigo de Plutarco - o Estado-finança!
A mesma administração - sempre impecável!
A mesma ressurreição de Lázaro - levanta-te e caminha!
O mesmo ponto de largada - para a ascensão de sacrifício !
A mesma obra de solidez e confiança em que o discípulo dilecto sucedeu ao grande Mestre!
E pôsto isto, entro propriamente na matéria.
Sem preocupações demasiadamente teóricas, sem grandes desenvolvimentos, tomando até as bases de facto que aqui foram postas, eu pretendo hoje demonstrar duas cousas: a primeira, que todas as guerras têm produzido, uniformemente, altas enormes no custo da vida familiar e as medidas tomadas pelo Estado, sendo elas porventura as mais draconianas, têm resultado, numa apreciável parte, inoperantes.
Em segundo lugar, a origem deste fenómeno, no momento actual, não se pode ter como reflexo das finanças portuguesas, mas deriva de condições económicas de ordem mundial a que se juntam também elementos da nossa vida interior, particularmente da nossa economia monetária.
Particularmente, a finança oficial, compreendida em seu estrito sentido neste capítulo, tem desempenhado apenas uma função benéfica.
Não devo repetir aqui aquilo que já foi exposto tam brilhantemente, sobretudo pelo Sr. Dr. Ulisses Cortês. Claro que as necessidades da guerra, a falta de abastecimentos, a deminuição da produção, o colapso da vida mercantil levam a uma estimação, a uma louvação demasiada das mercadorias e serviços. A isto corresponde, por outro lado, no espírito daqueles que possuem moeda ou disponibilidades, uma menor apreciação dessa moeda, no seu poder de aquisição. Isto explica-se por aquela conhecida figura económica - a equação geral das trocas.
A quantidade da moeda, englobando esta, os títulos circulantes e o cheque bancário, multiplicados pela sua velocidade de circulação, correspondem aos serviços e mercadorias susceptíveis de compra. Qualquer alteração neste estado de equilíbrio - a abundância de bens, a falta de meios, a violência de um serviço - traduz uma modificação de preço, que é expressão numérica desse equilíbrio.
Este estado de equilíbrio, como digo, exposto assim, sinteticamente e quási uniformemente nos economistas que se especializaram nestes assuntos, explica toda a movimentação geral dos preços.
E é curioso que o preço de um automóvel, um objecto de luxo, caro e de difícil construção, provoca a mesma sensibilidade do equilíbrio monetário que o preço de um alfinete.
Portanto, todo o movimento monetário é afectado por uma simples mercadoria.
Vemos, pois, que apesar de uma lei que fixa o valor das moedas, o certo é que o poder do comprador é menor e as exigências de quem vende começam a ser maiores sempre que se dá este fenómeno da sobrestimação dos valores e de menos apreciação de moeda em tempo de guerra. Os bens e serviços têm tendência a negociar-se mais caro - eis tudo.
A história ensina que as vitórias de Alexandre Magno, quando das campanhas asiáticas, de que resultaram enormes despojos, provocaram na Macedónia e na Grécia a chamada, inflação de preços e uma crise de valores - uma crise depressiva da moeda.
A Roma da era imperial, fazendo despesas enormes com as expedições de conquista e de carácter militar, submetendo os países ao confisco de metais preciosos e
de objectos de toda a ordem, debateu-se também numa inflação de valores, numa alta no custo de vida.
A Espanha e toda a península contribuíram enormemente para que esta alta se desse.
E é curioso que Ferrero salienta que, no meio dos grandes despojos e das grandes riquezas adquiridas com as expedições militares, se verificava o empobrecimento da maioria dos cidadãos romanos. Portanto, Roma enriquecia mas o cidadão murmurava porque constatava estar empobrecendo:
As guerras do feudalismo provocaram iguais fenómenos de inflação, iguais fenómenos de altas e baixas, de quebras do valor da moeda, a que correspondiam hipertrofias do valor dos bens.
As guerras por causa da Aquitânia, a guerra dos cem anos, que empobreceu o clero, a nobreza, a burguesia e o povo, salientaram altas dos respectivos valores e conduziram ao empobrecimento geral.
As várias guerras da França, Navarra e da Inglaterra provocaram o mesmo fenómeno.
E entre nós o reinado de D. Fernando I foi caracterizado pelas sucessivas guerras de Castela, acompanhadas de quebras sucessivas do valor da moeda. «Mudou e desfez», diz Fernão Lopes.
Ao mesmo tempo era saliente que os capitalistas e aqueles que guardavam no fundo das suas arcas os respectivos capitais empobreciam devido à constante deminuição do valor da moeda.
Subiram porém sempre os preços, não obstante haver-se tentado resistir. O rei fez « almotaçaria em todas las causas». Os preços quadruplicaram porém.
Com D. João I as cousas foram ainda mais longe e as novas guerras com Castela trouxeram quebras sucessivas do valor da moeda e altas do custo da vida que assumiram então um nível elevadíssimo e inverosímil.
As guerras coloniais de Portugal e da Espanha fizeram entrar no mercado nacional quantidades enormes de metais preciosos e produziram altas no preço dos artigos e deminuições do poder de compra da moeda. É assim que numa das mais belas igrejas manuelinas do País várias figuras ornamentais se desesperam em atitude demoníaca - são aqueles operários que contrataram trabalhar ao ano pelo salário de um vintém por dia, quando os companheiros eram remunerados a alqueire de cereal.
As guerras do século XVI, as guerras de Luiz XIV, a campanha do Russilhão, a revolta da América, a guerra do Oriente, a guerra russo japonesa produziram inevitavelmente a deminuição do valor da moeda e altas no custo de vida.
Unia referência ligeira às invasões francesas. Como se sabe, elas produziram enorme destruição de capital. Assolaram, sobretudo, as províncias da Beira e da Estremadura. Destruíram-se produções e colheitas; imensas pessoas ficaram sem asilo, sem lar, sem roupas, sem mantimentos.
Muitas casas foram incendiadas; algumas, porém, com manifesta satisfação dos seus donos, como o caso do celebrado juiz de Amarelhe, que ficaram só com o que vestiam.
Para evitar a deminuição do valor da moeda, editais de toda a espécie - do Senado, do intendente da polícia e do monteiro-mor, etc. - procuraram fixar os preços, combater a inflação, a exploração e o monopólio de qualquer forma. Emfim, tomou-se um conjunto de medidas destinadas a evitar o fenómeno da alta da vida.
Não falo já da guerra de 1914-1918; ela trouxe-nos o escândalo das negociatas, a criação dos novos ricos, a alta dos preços, a desajeitada reacção do Estado em face do fenómeno e a consequente alta do custo de vida. A repressão foi fraca e desajeitada,