142 DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 49
Seria, porém, necessário procurar o critério jurídico a que terá obedecido a reforma prisional para diferenciar a competência dos órgãos directivos dos estabelecimentos prisionais e a do Conselho e do Ministro da Justiça para, em caso de dúvida, se encontrar uma solução rigorosa.
Pensamos não ficar longe da verdade supondo que o critério seguido pela reforma prisional teria sido o que vamos esboçar.
Na execução da pena imposta na sentença condenatória, pode o director do estabelecimento prisional respectivo convencer-se de que não é o regime penal executado ne55e estabelecimento o que convém à índole do delinquente, ou que a duração da pena aplicada é insuficiente ou excessiva para a sua readaptação, e que seria necessário ou transferir o delinquente para um estabelecimento mais adequado ou modificar a pena na sua duração, prorrogando-a quando insuficiente ou encurtando-a quando excessiva, pondo o recluso em liberdade condicional. Estas modificações têm de ser decididas por alguém. A reforma atribuiu ao Conselho ou ao Ministro da Justiça a competência para decidir e aos directores dos estabelecimentos prisionais a competência para propor e para executar as medidas deliberadas pelo Conselho ou pelo Ministro.
Sendo assim, o critério da delimitação de competências entre o tribunal e a administração dos estabelecimentos prisionais poderá ser formulado nestes termos: ao tribunal compete marear, quer na sua primeira decisão (a sentença condenatória) quer nas decisões de modificação da pena, a espécie e a duração do regime penal adequado ao delinquente, indicando naturalmente o estabelecimento onde a pena deve ser cumprida; os directores dos estabelecimentos prisionais executam, nos termos da lei, o regime fixado pela sentença e, dentro desse regime, têm toda a liberdade de acção e todo o poder discricionário que a lei lhes confere para a readaptação social do delinquente, aplicando-lhe o princípio da progressividade, como ele se encontra legalmente estabelecido, observando os progressos morais do delinquente ou notando que ele é refractário e inadaptável à disciplina do estabelecimento e propondo, quer a alteração da duração da pena, quer a mudança de regime prisional, isto é, a mudança de estabelecimento prisional. Quere dizer: o tribunal fixa o regime penal e os directores dos estabelecimentos prisionais ou o executam ou propõem a sua modificação ou substituição, quando o julguem necessário. De tal maneira, a judicatura e a administração estarão sempre no seu lugar.
II) Organização e competência do tribunal de execução das penas. - Diante das divergências doutrinais e mesmo legislativas acêrca do modo de constituir o órgão da jurisdicionalização do cumprimento das penas e das medidas de segurança, decidiu-se a proposta pela criação de tribunais especiais, formados por juizes singulares em 1.ª instância, e por um tribunal colectivo de recurso.
A Câmara Corporativa aceita o princípio da especialidade, dada a natureza particular das funções que os tribunais de execução das penas são chamados a desempenhar, mas entende que devem ser tribunais colectivos, com uma composição tal que dêem garantia, ao mesmo tempo, da especialização necessária à resolução das questões submetidas à sua apreciação e da informação quanto possível completa de todas as circunstâncias que podem influir nas suas deeisões. E também entende que, para se conformar com o preceito da Constituição (artigo 93.º alínea f) que diz ser necessariamente matéria de lei a organização dos tribunais, lhe cumpre indicar qual deve ser, no seu modo de ver, a composição dos mesmos tribunais.
O tribunal deverá ser composto, segundo o seu pensar, de cinco membros: um juiz de um tribunal superior, que será o presidente e que, pela soía experiência, pela sua cultura e pelo poder de intuição adquirido no exercício do ofício de julgar durante longos anos, imprimirá às decisões do tribunal o cunho da autoridade própria das deeisões de justiça; dois licenciados em direito, especializados em ciências penais, que serão juizes adjuntos e constituirão, com o presidente, o órgão de decisão das questões de direito que o tribunal tenha de resolver; um médico criminalista e um director de um estabelecimento prisional com cinco anos, pelo menos, de exercício do seu cargo, que serão juizes assessores, com a função de prestar ao tribunal as informações de ordem técnica e de ordem profissional, sempre valiosas para a apreciação dos factos alegados em favor ou contra os condenados, e que terão voto sobre todas as questões de facto.
Pela sua própria composição, pelos dados que os juizes poderão colher, quer directamente quer por intermédio dos assistentes sociais, e pelo auxílio eficaz que lhe deverão prestar os institutos de criminologia, o tribunal decidirá com a probabilidade de acerto que pode haver no exercício da difícil tarefa que é a de qualificar e medir com justeza aproximada a forma e o grau de delinquência de um condenado, e de lhe adaptar a pena adequada ao seu modo de ser pessoal e até de, por vezes fixar o momento em que pode ser posto em liberdade condicional ou definitiva.
A Câmara Corporativa ainda entende que no momento actual, dada a distribuição da população prisional, que se encontra concentrada na sua grande parte em estabelecimentos penais situados em Lisboa ou nas suas proximidades, e atendendo a que se trata de uma instituição nova que deve criar jurisprudência e tradição num sector novo e delicado da judicatura, se deve constituir um só tribunal, com sede em Lisboa e com jurisdição em todo o País, que seja, por assim dizer, um tribunal de ensaio quanto ao modo de intervenção dos órgãos da jurisdição no período da execução das penas e das medidas de segurança.
A medida, porém, que a rede dos serviços prisionais se for alargando e completando e que as exigências ou conveniências práticas o impuserem ou aconselharem, novos tribunais poderão ser constituídos, nos centros onde possam encontrar-se e conjugar-se os elementos necessários à sua organização.
As deeisões do tribunal, em regra, não são susceptíveis de recurso. Poderá, porém, recorrer-se das deeisões que ordenem a prorrogação das penas ou a revogação da liberdade condicional e sejam contrárias ao parecer da direcção do estabelecimento em que o condenado esteja a cumprir a pena ou medida de segurança, ou de que ele dependa se tiver sido posto em liberdade condicional.
O recurso será interposto para um tribunal colectivo com sede em Lisboa e composto por dois juizes do Supremo Tribunal de Justiça, dos quais o mais antigo será o presidente, por um professor de direito penal, por um professor de medicina legal e pelo director geral dos serviços criminais, o qual julgará de facto e de direito.
5. O TRIBUNAL DE EXECUÇÃO DAS PENAS E A LIBERDADE CONDICIONAL. - Pela reforma prisional, a concessão da liberdade condicional pertence, em regra, ao Ministro da Justiça (artigo 393.º). Pela proposta, a sua concessão passa a ser função do tribunal da execução das penas,