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DIÁRIO DAS SESSÕES —N.º 190
gravamentos tributários e a realização de certas despesas que se afigurem convenientes ao interêsse colectivo.
É assim na Inglaterra.
E não se diga que isto constitue um simples platonismo.
Uma moção desta natureza formulada em termos imperativos, tem, no aspecto político, muito mais fôrça vinculante do que à primeira vista pode supor-se.
Vozes: — Muito bem!
O Orador: — Não pretendi, Sr. Presidente, responder ao Sr. Dr. Mário de Figueiredo.
Quis apenas, modestamente, prestar o meu depoïmento sôbre esta questão.
Disse.
Vozes: — Muito bem, muito bem!
O Sr. Albino dos Reis: — Sr. Presidente: o assunto pode considerar-se iluminado suficientemente pela exposição que dele fez o Sr. Dr. Mário de Figueiredo e depois pela que acaba de nos dar também o Sr. Dr. Ulisses Cortês.
Entretanto, em questão tam delicada como é a da iniciativa dos Deputados em matéria, financeira, isto é, quanto a propostas de alteração ou projectos de lei que envolvam aumento de despesa ou deminuïção de receitas, não será demais chamar a atenção da Câmara para o melindre da posição que ela vai tomar em relação ao texto constitucional em que fique definido o âmbito da sua iniciativa a tal respeito.
Em primeiro lugar ocorre que, tendo a Constituïção de 1933 delimitado a iniciativa dos Deputados em matéria financeira, por forma que lhes não é lícito apresentar projectos de lei ou propostas que envolvam aumento de despesa ou deminuïção das receitas do Estado, e tendo esta Câmara e o Govêrno vivido bem com êsse regime até hoje, logo surge a dúvida: Para que alterar aquilo que até agora parece ter dado bons resultados? E isso aumenta naturalmente a responsabilidade de quem tiver de se pronunciar sôbre êsse aspecto.
Claro que o facto de ser o próprio Govêrno, presidido pelo Sr. Presidente do Conselho, que manda para a Assemblea Nacional sôbre tal assunto uma proposta que amplia a iniciativa dos Deputados em matéria financeira poderá dar à Câmara uma grande dose de tranqüilidade de consciência, visto que se trata não só do responsável máximo pela administração pública, mas porque se trata ainda do grande homem de Estado que equilibrou as finanças e as contas públicas do mesmo Estado.
Entretanto, não há homens infalíveis, e eu posso dizer a V. Ex.as que, neste ponto, a proposta de alteração consignada no texto governamental, ampliando por forma difìcilmente determinável as faculdades dos Deputados, não traduz hoje inteiramente o pensamento de quem redigiu essa proposta.
Examinando a proposta governamental, vêem V. Ex.as que a restrição consignada na segunda parte do artigo 97.° teria, aplicação apenas aos projectos e propostas de alteração que, convertidos em lei, importassem, por si mesmos um aumento de despesa ou uma deminuïção de receitas cuja cobrança já houvesse sido autorizada pela Assemblea Nacional.
Portanto, sempre que a Câmara, tomasse a iniciativa de um projecto ou de uma alteração a qualquer proposta do Govêrno que não importassem por si mesmos, uma vez convertidos em lei, aumento de despesa ou deminuïção de receitas, cuja cobrança tivesse sido autorizada pela Assemblea Nacional, estava a Câmara no uso do seu direito e podia assim aumentar a despesa ou deminuir a receita.
Vou pôr um caso a V. Ex.as.
Admitamos a hipótese de que a Assemblea toma a iniciativa de um projecto de lei em que se estabelece a deminuïção de horas de trabalho nos estabelecimentos industriais do Estado.
Pregunta-se: Nesta hipótese o texto governamental permite o seguimento do projecto?
Há ou não há aumento de despesa motivado pela deminuïção de horas de trabalho? Há, evidentemente.
Êsse aumento de despesa, resultaria directamente da iniciativa tomada pela Câmara, ou resultaria por via indirecta.
Se resulta indirectamente parece ser autorizada pelo texto governamental.
Se resulta directamente, não. E não haverá muitos casos em que será difícil determinar se o aumento de despesa resulta directa ou indirectamente de certo projecto de lei?
Pode dizer-se, é certo que a proposta ou projecto acarretariam por via indirecta aumento de despesa se da sua conversão em lei resultasse a necessidade imediata da inscrição ou reforço de verba orçamental, e por via directa em caso contrário. Mas não se corta inteiramente a dificuldade; e não há dúvida de que fica aberta uma porta para aumentos de despesa, com reflexos perigosos na gestão financeira do Estado.
Relativamente à receita, suponhamos que o Govêrno nos primeiros meses do ano reconheceu a necessidade, para manter o equilíbrio orçamental, de criar certas receitas mediante o lançamento de determinado imposto e publicou para êsse fim o respectivo decreto-lei. Trata-se, como é óbvio, de impostos cuja cobrança não foi autorizada pela Assemblea Nacional. Dentro do texto da proposta governamental qualquer Deputado podia apresentar e a Câmara votar um projecto de lei revogando aquela medida do Govêrno, e atingir, por esta forma, o equilíbrio financeiro do Estado.
Mas a proposta de lei de revisão fala de proposta ou projecto que importem por si mesmos aumento de despesa ou deminuïção de receita. E esta expressão «por si mesmos» afigura-se-me ainda mais obscura e perigosa quanto a determinar-se em cada caso se a despesa é aumentada e a receita deminuída pelo próprio projecto em si ou por conseqüência acidental.
Não quero, nem está no meu espírito, dar uma resposta completa à argumentação brilhante que aqui produziu o ilustre Deputado Dr. Mário de Figueiredo. É difícil acompanhar as deduções do seu esplêndido talento. E não só do seu talento, mas do seu saber, porque sentimos que estudou o assunto como S. Ex.ª costuma fazê-lo. Mas as dificuldades que pus e os exemplos que apontei parecem-me de molde a fazer ponderar a Câmara, que, naturalmente, deseja seguir a solução mais própria à continuação da disciplina financeira da Nação.
Dada a importância do assunto, senti-me na obrigação de vir à tribuna fazer os reparos que acabei de expor. A Câmara relevará as deficiências da minha intervenção.
É que, não obstante a doutrina do digno Deputado Antunes Guimarãis de que os Deputados hão-de saber de tudo um pouco para poderem tomar a sua posição nos debates, confesso que, fazendo o meu exame sincero de consciência, reconheço não corresponder àquela exigência, e que de poucas cousas sei alguma cousa e de muitas não sei nada.
Mas, tendo examinado a questão em debate e tendo concluído que era de reprovar o texto governamental, julguei do meu dever marcar na tribuna essa atitude