52 DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 61
Há disposições na proposta de lei, disse, que merecem o meu maior aplauso, e essas são as do artigo 5.º, que se referem ao valor dos prédios para efeitos de liquidação de sisa e de imposto sobre as sucessões e doações.
Li com todo o cuidado o aliás douto parecer da Câmara Corporativa, mas encontrei nele algumas afirmações que não me parecem inteiramente exactas. E, assim, o parecer declara que há inovações de ordem social do protecção à família, o que é um equívoco do parecer da Câmara Corporativa, visto que, na sua parte III, subordinada à designação de a Inovações da proposta de lei, declara que o artigo 4.º é uma inovação, quando é certo que tal artigo nada inova, apenas se limitando ao que já se dispunha no artigo 5.º do decreto n.º 35:423, de 29 de Dezembro de 1945.
Este artigo 4.º refere-se ao adicionamento ao imposto sobre as sucessões e doações e foi criado pelo decreto n.º 19:969, do 29 de Junho do 1931, apenas em taxa uniforme de 20 por cento. Mas logo apareceu o decreto n.º 20:558, de 2 de Dezembro de 1931, onde ela foi fixada em 3 por cento, para se elevar a 5 por cento pelo decreto n.º 21:426, de 30 de Junho de 1932. Mais tarde, pelo decreto n.º 26:151, de 19 do Dezembro de 1935, fixou-se essa taxa em 4 por cento, mantida até à publicação da lei n.º 1:973, que a reduziu a 3 por cento nos casos de transmissões a favor de descendentes até 5.000$.
Não posso deixar de considerar este adicionamento como um filho espúrio do imposto sobre as sucessões e doações, que ninguém pode perfilhar, mas teve a arte de enganar o próprio relator do parecer da Câmara Corporativa, que, tomando a nuvem por Juno, supôs que no artigo 4.º da proposta se legislaria também no sentido de alterar a própria taxa do imposto, o que, afinal, não é exacto.
Poderia aplicar-se aquele princípio facile credimus quod volumus.
O ilustre relator do parecer da Câmara Corporativa, com o desejo de ver realmente inovações de ordem social de protecção à família quis ver no artigo 4.º da proposta inovações que, infelizmente, lá não existiam.
Diz ainda o parecer que:
A desvalorização da moeda é afinal a causa determinante das inovações fiscais da proposta.
Ora o certo é que as determinantes da inovação da proposta, no que diz respeito ao sen artigo 5.º, são muito diversas das que lhe atribui o parecer da Câmara Corporativa. E eu dou o meu caloroso aplauso a esta inovação do Sr. Ministro das Finanças, que vai pôr cobro a desmandos graves que se verificavam por esse País além e que já no relatório apresentado ao Sr. Ministro das Finanças pela comissão encarregada de estudar as bases da reforma tributária eram escalpelizados desta forma:
O direito absoluto reconhecido à Fazenda de promover, sempre que o julgue conveniente, a avaliação dos bens funciona teoricamente como uma ameaça em relação ao contribuinte, que, ciente dos baixos valores da matriz, tem interesse em evitar a avaliação, para o que se resolve a declarar valores superiores aos que da matriz se podiam deduzir. Em teoria seria esta a sua acção. A prática porém tem demonstrado que este princípio, aliás tão razoável, está servindo de preferência interesses que não são positivamente os do fisco. Devido a causas que não vale a pena referir aqui, generaliza-se por esse País, no que respeita à liquidação da contribuição de registo, um sistema de relações entre o contribuinte e os representantes da Fazenda, em que o Estado paga mais do que seria natural ... as despesas de amizade.
Estamos a ver nestas palavras a clara inteligência e perspicácia de quem as escreveu. E, se em tempos o mal já era grande, muito mais elo se tam avolumado.
Para pôr cobro a esses desmandos e evitar várias perseguições de que em muitas terras os contribuintes se vinham queixando é que o Sr. Ministro das Finanças abertamente, com este artigo 5.º da proposta, vem acabar com aquilo a que poderíamos chamar só mercado negro do Ministério das Finanças».
É claro que, ao terminar com as avaliações extraordinárias, por certo a Fazenda Nacional vai ter algumas diminuições nos seus rendimentos, e certamente por isso no artigo 6.º estabelece-se um adicional de 10 por cento sobre a contribuição predial rústica.
Os números que apontam as Contas Gerais do Estado relativamente a 1944 não coincidem com os do Anuário Estatístico, havendo uma pequena diferença. No entanto vê-se que os valores declarados para as liquidações do sisa em 1944 foram de 1.070:925 contos e os que serviram de base à liquidação foram de 1.270:462 contos, sendo a sisa, que tinha sido orçada em 85:000 contos, liquidada no valor de 116:472 contos.
É natural que haja um pequeno abatimento destas receitas, mas creio que esse pequeno abatimento na receita deve ser sobejamente compensado pela tranquilidade que é dada ao contribuinte, que não terá de haver-se com aquelas desigualdades do fisco.
Há, Sr. Presidente, vários outros preceitos da proposta que merecem aplauso. E, assim, parece-me não merecer dúvidas o que se refere às especialidades farmacêuticas, à isenção do imposto profissional em certo limite e aquele que se refere também à proibição de criação e unificação de taxas ou de receitas de idêntica natureza. Tenho tido, Sr. Presidente, grande dificuldade em poder acompanhar o estado da legislação financeira, em virtude da multiplicidade de textos que actualmente se encontram em vigor.
Foi já várias vezes chamada a atenção desta Assembleia para este facto e eu não posso deixar de referir-me ao que aqui foi dito na sessão de 9 de Abril de 1935 pelo então ilustre Deputado Pinto de Mesquita, que afirmou:
Parece realmente uma tendência acentuada da nossa vida política e legislativa esta do legislar profusa e difusamente.
O Estado Novo, que tem procurado e conseguido, em grande parte, nos serviços da nossa administração pública, estabelecer ordem, não conseguiu na acção legislativa atingir esse desiderato.
São inúmeras as queixas que surgem de todos os lados contra a confusão da legislação, sobretudo da legislação fiscal. Procurando reagir um pouco contra tal confusão, vi, com prazer, nas disposições do decreto-lei n.º 32:322, de 15 de Outubro de 1942, que reorganizou os serviços da Inspecção Geral de Finanças, determinar-se, no seu artigo 26.º, que esse decreto-lei e os demais diplomas sobre inspecção geral de finanças seriam reunidos num só diploma, ajustando-se as respectivas disposições para lhe dar uniformidade.
Creio que há toda a necessidade em generalizar este procedimento.
Há absoluta necessidade de consolidar a nossa legislação porque a forma como actualmente se está legislando cria tantos embaraços que por vezes o próprio jurista se vê em sérios apuros para se aperceber qual é a verdadeira disposição em cansa.
Ainda há pouco tempo me sucedeu ter de consultar o decreto n.º 35:776, que traz um claro relatório, a que se segue o respectivo articulado. Esse articulado é curto apenas vinte e dois artigos.