10 DE DEZEMBRO DE 1946 77
a eficácia do ensino e até, algumas vezes, o prestígio da escola.
Esta crítica, que tem seu fundamento, precisa de solução - mas de solução real, que as imaginárias não são susceptíveis de tradução em factos.
O número de técnicos da indústria ou do comércio com formação superior é, reconhecidamente, ainda muito escasso em Portugal; vastíssimos ramos da nossa actividade desconhecem a existência deste fruto do século XIX que é o técnico de formação universitária ou até o técnico de formação média; e destes poucos técnicos só uma restrita camada reunirá as condições óptimas. Uns, que já atingiram posições de desafogo ou, pelo menos, de responsabilidade, não se interessam em geral pelo professorado; outros, os que começam, ainda sem experiência profissional, mas para quem o ensino constitui um recurso ou uma ajuda que se busca com interesse, formam o alvo da crítica que se apontou; e fica a faixa intermédia dos que já têm bastantes luzes da vida para poderem ensiná-las mas não subiram ou envelheceram o suficiente para se desinteressarem de o fazer.
Depois, nova dificuldade reduz ainda o número de candidatos; as exigências orçamentais do Estado, obrigando os professores a cumprir certos tempos mínimos de serviço, dificultam a acumulação do trabalho verdadeiramente profissional com o trabalho lectivo; e cai-se na posição criticada de haver muitos professores sem a escola activa, a escola que faz personalidade, da fábrica ou do escritório. E mesmo assim dificilmente se preenchem as vagas fora dos grandes centros.
E evidente que não pode, para as disciplinas de cultura geral, voltar-se atrás na exigência de estágios e de preparação (pedagógica que tem permitido melhorar o nível do ensino; mas não deve contar-se com esta via normal como ineio de obter em todos os casos professores idóneos para as disciplinas de feição nitidamente profissional.
A fórmula adequada está, porém, prevista na proposta: o contrato de profissionais de reconhecida competência, em condições a fixar em cada caso. A ideia já vem da reforma de 1931 (artigo 37.º), que prevê excepcionalmente a existência de professores contratados para disciplinas de carácter especial, para as quais não existam professores com habilitações legais; mas com tantas restrições em série, a satisfazer simultaneamente, o princípio tem tido reduzidíssima aplicação, limitada a dois ou três casos.
A redacção da proposta em estudo, embora ofereça menos obstáculos que a actual, impõe a manifesta conveniência do serviço, o que poderá dar a algum mais pusilânime a sensação de uma coisa ainda extraordinária a aplicar em casos de manifesta transcendência. Por isso se propõe a supressão da palavra manifesta, consignando-se o voto de que a experiência seja tentada e que o princípio não fique letra morta, a atestar uma boa intenção que, por timidez, não chegou a ser realidade. E consigna-se também o voto oposto de que a intenção não seja desvirtuada pelo abuso.
Sob este aspecto, é legítimo esperar que o ensino particular feito nas fábricas e, na parte tecnológica, presumivelmente pelos seus próprios engenheiros, se caracterize por uma adaptação fiel à vida profissional. E mais uma razão para que se experimente dar-lhe o relevo que atrás se mencionou.
Resta passar rápida revista aos princípios novos da base XI.
O primeiro consiste em criar no quadro privativo de cada escola, actualmente constituído pelos professores efectivos, as duas categorias de professores ordinários 4 extraordinários, competindo a primeira aos indivíduos habilitados com um curso superior e a segunda aos habilitados com os cursos médios industriais ou comerciais, os quais, ao contrário do que sucede agora, em que só podem ser professores provisórios, passam a poder ser professores efectivos.
Nenhum reparo levanta a novidade, que vem repor uma situação existente antes de 1931; trata-se de prestar justiça a indivíduos que têm sido aproveitados como provisórios e a que é forçoso recorrer pela impossibilidade, já registada, de prover todos os lugares de professores, por falta de concorrentes, com indivíduos habilitados com um curso técnico superior.
Aparece também como princípio novo a inclusão dos licenciados pelas Faculdades de Ciências como candidatos aos lugares de professores efectivos das escolas técnicas, onde hoje só podem entrar como provisórios na falta de outros. Não se indicam os grupos de disciplinas a que podem concorrer, mas é intuitivo que o deverão fazer apenas nos de índole geral que respeitem à sua preparação escolar. E julga-se que aí, devidamente instruídos durante a sua preparação pedagógica sobre o carácter prático e intuitivo que é mister dar ao ensino, serão perfeitamente capazes de cumprir.
Apenas uma inovação levanta duas dúvidas: uma, nascida da falta de clareza do texto; outra, entendido o texto, quanto à matéria em si. Essa inovação é a de que podem concorrer a professores os Indivíduos habilitados nos cursos especiais que vierem, para o efeito, a ser organizados com matérias professadas naqueles estabelecimentos de ensino.
O período da base XI, de onde se tira esta frase, é tão extenso e fula em tantas escolas que não é clara a significação das últimas palavras: naqueles estabelecimentos de ensino; e a expressão cursos especiais que vierem, para o e/eito, a ser organizados, assim desacompanhada de uma explicação bastante, toma ar de certo mistério.
Informações complementares permitiram esclarecer que se trata de cursos a organizar com algumas cadeiras das Faculdades de Letras ou Ciências, a fim de obter, para as disciplinas gerais dos cursos técnicos, professores de formação média que possam considerar-se equiparados aos diplomados com os cursos técnicos médios. A quem se habituou a ouvir dizer que há por colocar muitos diplomados em Letras e Ciências, a proposta causa certa estranheza; mas a informação de que o preenchimento das vagas de professores continua difícil nas escolas da província e a perspectiva de que essa dificuldade aumente se novas escolas forem criadas parece justificarem a proposta.
Nestes comentários relativos à situação do pessoal docente cabe uma referência à base XXI, que se ocupa dos vencimentos. Dela se infere que o Governo se propõe rever o mapa VIII anexo ao decreto-lei n.º 26:110 no que se refere aos professores do ensino técnico elementar e médio. Nada a objectar, salvo a maneira obscura como a base se encontra redigida.
A intenção que parece haver, e se considera justa, resume-se simples e claramente desta maneira: os professores do ensino médio sem diuturnidades são equiparados, quanto a vencimento, aos engenheiros de 2.ª classe; os professores ordinários do ensino elementar nas mesmas condições equiparados a engenheiros de 3.ª classe, isto é, aos professores do liceu; os professores extraordinários, também sem diuturnidades, equiparados a agentes técnicos de 3.ª classe.
Esta revisão de vencimentos parece indispensável para criar um equilíbrio que se afigura não existir. No ensino médio, que faz sequência ao 2.º ciclo liceal e excede em muitos aspectos o 3.º ciclo, a remuneração dos professores não fica mal quando colocada acima da dos professores do liceu; e no ensino profissional, para-