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282 DIÁRIO DAS SESSÕES -N.º 74

das edificações escolares, através do plano chamado dos Centenários.

O Governo, como V. Ex.ª sabem, paga metade e empresta a outra metade; é um bom auxílio, mas há que pagá-lo. Quando o Governo resolve fazer seis ou sete escolas num concelho, ao mesmo tempo, esse facto é um motivo de alegria e de justa preocupação. Poderá, no rigor da palavra, chamar-se administração, se quem administra não pode controlar as suas despesas?

Poderá aplicar-se esta expressão quando quem administra vae surgir-lhe abruptamente a necessidade absoluta de ocorrer a um empréstimo valioso som qualquer contrapartida de receita?

E absolutamente indispensável fazer escolas, mas eu pergunto: para a grande maioria das câmaras será possível a satisfação dos encargos que esse empréstimo lhes vai causar?

Mas não ficaremos só por aqui, porque já aí vem também, e felizmente, o problema da electrificação do País, o qual trará ainda maiores encargos para as câmaras municipais o que eu continuo a dizer que não sei como se hão-de saldar.

Esqueci referir um facto que me impressiona. São as sentenças que as direcções de finanças pretendem dar aos presidentes das câmaras municipais.

As câmaras são obrigadas a fornecer às secções de finanças casa e móveis, mas, talvez porque ainda nos levam uma percentagem pelo dinheiro que cobram, julgam-se as direcções do finanças no direito de exigir que essas secções sejam instaladas por forma que excede às vezes o razoável e o necessário, sendo certo que mesmo em Lisboa há instalações verdadeiramente vergonhosas. Não podem suas exigências, quando injustificadas, ser atendidas, quando há tantas coisas absolutamente indispensáveis que reclamam atenção e providências urgentes.

Eu não quero que as câmaras possam tributar ad libitum; isso seria absolutamente inconveniente e poderia dar lugar a abusos.

Mas acho igualmente inconveniente que elas não possam ter as receitas indispensáveis para satisfazer as suas obrigações, pois que não é decoroso, não está bem e a administração pública não ganha nada com isso que as câmaras vivam uma vida de tristeza e de miséria, sem poder acudir às necessidades dos seus munícipes, às necessidades mais instantes e clamorosas. Essas necessidades existem, por toda a parte, e eu, que estou a 50 quilómetros de Lisboa e sei bem o que sucede no meu concelho e limítrofes, faço ideia do que sucederá para o interior do País, nos pequenos concelhos, onde as receitas devem ser tão minguadas que não sei como se possa fazer qualquer coisa que se pareça com administração municipal.

O aviso prévio em discussão foi trazido em boa hora à Assembleia Nacional e faço votos por que da sua realização saia uma situação mais humana e que as câmaras municipais sejam postas em condições de bem poderem cumprir o seu dever.

Tem o dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Sr. Mário Madeira: - .Sr. Presidente: nunca têm, nem poderiam ter, as minhas palavras nesta Câmara outro significado que não seja o de um depoimento sobre factos que, de longe ou de perto, eu tenha razão e obrigação de conhecer.

Tendo exercido, durante dois anos e meio, as funções do governador civil e exercendo hoje o cargo de vice-presidente das Casas do Povo, que me obriga a manter contacto com as câmaras de grande parte do País, tenho razão para conhecer o problema das câmaras.

Isto sem querer acrescentar uma outra razão, esta de ordem pessoal, que bastaria. Vivendo eu em Lisboa há trinta anos, ainda não fui absorvido pela vida da capital, mantenho-me fundamente provinciano e nem sequer estes doze anos de funcionário, passados no Terreiro do Paço, me fizeram esquecer que uma grande parte da vida da Nação está nos 80 por cento da sua população espalhada pelo País, fora das grandes cidades.

Julgo que é preito da mais inteira justiça dizer

- e eu posso fazê-lo, pois nunca exerci esse cargo, ao contrário dos precedentes oradores- que existem por esse País fora muitos presidentes de câmaras municipais merecedores das nossas mais sinceras e justas homenagens pela sua posição de excepcional sacrifício e devoção.

São eles, Sr. Presidente, que na primeira linha se encontram em contacto directo com as populações, arcando com a antipatia e má vontade muitas vezes das populações, pois representam, o símbolo e a expressão de uma política que não pretende ser popular e que muitas vezes não vai ao encontro dos interesses e da feição demagógica das populações. São eles - pelo menos muitos deles, sem exagerar, a ponto de me querer referir a todos - que, além de tudo isto, fazem um sacrifício pessoal enorme e que na grande maioria ainda tem tempo, coragem e disposição para percorrer dias e dias os corredores dos Ministérios, instando, pedindo, quase mendigando .para os interesses do seu município, com uma dedicação e perseverança que poucos reconhecem e ainda mais raros agradecem.

O Sr. Melo Machado: - Obrigado pela justiça.

O Orador: - Se realmente as instituições municipais, como se disse aqui, mergulham no melhor da nossa tradição nacional, se a elas deve Portugal grande parte da sua formação (histórica, se existem presidentes da câmara que tão bem merecem da gratidão pública, como se compreende e é lícito perguntar porque assistimos neste País a uma indiscutível decadência das instituições municipais.

Talvez pudéssemos encontrar uma explicação em causas de ordem geral, porque todos nós conhecemos os portugueses pelas suas qualidades e defeitos, e com relativa facilidade poderíamos apontar à frente dessas causas o individualismo inato do português, o português patriota como nenhum, bairrista em todos os casos, mas no fundo profundamente individualista, e esse individualismo exacerbado hoje perante a posição tomada pelo Estado, aqui como em todos os países, de um exagerado intervencionismo.

E assim se está perdendo a boa tradição municipalista. As populações de cada concelho vivendo e sentindo os seus problemas, juntando-se em volta da sua camará, apoiando-a moral e materialmente, procurando e colaborando na solução dos seus (problemas, isso não se encontra, e poucos ou caríssimos casos, tão raros que não conheço nenhum que possa apontar como expressão perfeita do que deveria ser regra a apontar como exemplo.

O remédio deste mal, difícil mas possível, reside essencialmente na reeducação do civismo das populações.

E mais do que por teorias, mais do que por discursos, mais do que por processos platónicos, a única forma real e "positiva seria e é a de prestigiar perante os povos as suas câmaras municipais, começando por dar-lhes possibilidades de exercer a sua acção - aquelas múltiplas formas de acção que a leilão se esqueceu de numerar e as circunstâncias de alargar e que se contêm, creio, nos artigos 45.º a 50.º do Código Administrativo, setenta e cinco .finalidades, a acrescentar mais