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5 DE FEVEREIRO DE 1948 273

O Orador:- Parece-me que efectivamente esse mal está atenuado; simplesmente parece-me que o mal do urbanismo se agravou.
Sr. Presidente: a matéria do aviso prévio, embora referindo-se essencialmente ao trigo, abrange, numa generalização feliz, o problema do pão.
Ora entre as matérias panificáveis tem o milho um lugar de destaque e, dado que pertenço a uma região grande produtora de milho, a ele me referirei especialmente.
Embora o milho seja um cereal, por assim dizer, plebleu, o certo é que alimenta uma grande parte da população do País.
Precisamente onde a população atinge maior grau de densidade aí se consome essencialmente o pão de milho.
Todo o Minho, todo o Douro Litoral, toda a Beira Litoral, parte da Estremadura e unia apreciável parte do Ribatejo produzem abundância de milho e os seus habitantes fazem dele um consumo habitual.
Em muitas partes mesmo o pão de milho é, por assim dizer, o elemento-base.
O trabalhador, o operário, o agricultor dessas regiões, desde que tenha à refeição um caldo e um pedaço de broa, já se satisfaz.
Pode mesmo dizer-se que para essas regiões o trigo não pode fazer suprir a falta da broa, alimento pesado, compacto, que, além do seu valor intrínseco em poder de alimentação, como pelo seu peso e compacidade, desempenha um papel importante no equilíbrio da alimentação rural.
O pão de milho satisfaz, preenche. É indispensável à constituição fisiológica dos habitantes daquelas regiões.
Seguramente o milho é um cereal de nacionalização muito mais recente do que o trigo, pois a sua implantação no continente europeu não vai para além de meados do século XVI.
Trazido possivelmente da América, adaptou-se tão bem e tão depressa às condições climáticas e geológicas do continente que em certo momento constituiu uma miragem embaladora pela facilidade com que se desenvolvia e pela abundância como frutificava.
Por isso não admira que a cultura do milho se desenvolvesse entre nós rapidamente e a tal ponto que tende a ultrapassar de novo a cultura do trigo, como já ultrapassou. A cultura do milho aproxima-se da cultura do trigo em área e produção.
E, assim, vejamos:
Cotejando a estatística agrícola referente a 1944 verifica-se:
Superfície semeada de trigo (hectares) 605:093
Superfície semeada de milho (hectares) 497:849
Menos (hectares) 107:244

E a produção foi:

Trigo (quintais) ............ 3.680:936
Milho (hectolitros) ......... 5.577:018

Mas, quanto à área de superfície semeada e quanto u produção do milho, há que rectificar os dados estatísticos por forma a repor a realidade no pé que lhe compete.
Ora é sabido que a estatística tem sido feita à base dos manifestos; mas precisamente não há que nos fiarmos nesses manifestos, pelo menos quanto ao milho, pois a verdade é que com o preço irrisório que lhe foi atribuído, em flagrante contraste com os preços reais do mercado livre, tais manifestos pecam por defeito, e por defeito grave.
O mesmo não acontecerá, porém, para o trigo, visto que, sujeito desde há muito à Federação Nacional dos Produtores de Trigo, e por isso integrado num apertado círculo de mecânica corporativa, não era fácil fugir com ele ao manifesto.
Os manifestos do trigo são por isso muito mais (rigorosos do que os do milho.
E assim, se às considerações acima feitas se juntar mais esta, que é palpável, é fora de dúvida que a produção deve aproximar-se muito da produção trigueira.
Nem por isso, todavia, se poderá deixar de pôr o problema do milho, assim como se põe correntemente o problema do trigo.
É que, ainda assim, ao que parece, o milho e o trigo e os demais cereais juntos não bastam ao consumo do País.
E eis a questão.
Pretendendo trazer à discussão o meu contributo, embora modesto, mas sincero, permita-se-me que comece por formular algumas considerações de ordem geral:
O problema do pão é, sem dúvida, um problema transcendente. E parece que entre nós um problema crónico.
A história regista em várias passagens o esforço despendido: pelos governantes no sentido de promover uma maior abastança de cereais panificáveis, podendo afirmar-se que a lei das sesmarias, de D. Fernando (1375), é já a condensação de determinações régias anteriores e a codificação de preceitos que, em certo sentido, já se vinham executando anteriormente.
Tinha então Portugal 1.000:000 de habitantes, ou ainda menos. No entanto o problema do pão já preocupava grandemente os nossos reis, ao ponto de se estabelecer como sanções preceitos deste rigor:

E se os senhores das herdades esto nam quiserem consentir, e contra elo fôrem, ou ho embargarem per qualquer maneira por seu poderio, percam essas herdades e des entam sejam apricadas ao comum pera sempre; e a renda delas seja filhada, e recebida pera prol do comum do lugar, em cujo terrentório essas herdades jouverem (Lei das sesmarias).

O fenómeno de carência que então se observava agravou-se para os tempos presentes por uma forma incalculável.
A população do País deve atingir presentemente mais de 8.000:000 de habitantes; mas enquanto o ritmo de crescimento, desde os primórdios da nacionalidade até ao ano de 1800, se faz numa escala, embora progressiva, muito lenta, de 1800 em diante o crescimento dá-se por uma forma extraordinariamente acelerada.
Assim, enquanto que desde o começo da nacionalidade até ao ano de 1800 não ultrapassamos os 2.900:000 habitantes, de então para cá, apenas em século e meio, quase que triplicamos aquele número.
Só o apontamento deste dado é bastante para atribuir ao problema do pão um aspecto transcendente.
O fenómeno, aliás, não é apenas nacional. E particular a toda a Europa, senão mesmo a todo o Mundo.
A humanidade está em franco crescimento; o que é mais grave (não digo que é mau ou que deixe de ser) é que esse crescimento não se faz em ritmo perfeito e proporcionado.
A este respeito ocorre-me citar aquele dado estatístico que o economista Werner Sombart apontou algures e que vem citado e considerado por Ortega v Garret no seu livro La Rebelión de las Masas e também por N. Politis em La Morale Internationale.
Esse dado é o seguinte:
Enquanto a Europa desde o século VI ao século XVIII, ou seja em doze séculos, pouco ultrapassou a cifra dos