5 DE FEVEREIRO DE 1948 275
vezes de cultura, preferindo outras porventura mais compensadoras.
Embora se compreenda a diferença de preço entre o trigo e o milho (aquele, em todo o caso, sempre mais elevado), a verdade é que a cultura do trigo é compensada por várias formas de protecção, quer pelo mecanismo do crédito, quer pelo mecanismo dos subsídios de cultura.
A cultura do milho, ao contrário, não goza de qualquer protecção económica.
Quando há milho de menos, aperta-se o rigorismo dos manifestos; quando há de mais, dificilmente se lhe assegura escoamento capaz.
Quanto a protecção técnica, muita coisa se tem feito, quer directamente pelos serviços, quer pelo esforço de algumas estações agrárias, como a do Porto.
Mas muito mais há a fazer.
E se os grémios da lavoura podiam prestar neste capítulo um relevantíssimo papel, a verdade é que neste capítulo pouco se tem feito sentir a sua acção.
E, no entanto, que bela missão seria a dos grémios da lavoura ensinando o lavrador a produzir mais e a produzir melhor, indicando-lhe a melhor forma de preparar o agro, de o adubar racionalmente, de o cultivar com eficiência, numa palavra, de o granjear em vista a uma melhor produção!
Antes de tudo, porém, é preciso estimular o produtor.
Sem um estímulo eficiente ele não mudará de rumo e até é possível que de cada vez abandone mais as suas culturas tradicionais, com prejuízo, portanto, das culturas do pão.
Reedito considerações que já em tempos formulei nesta Assembleia quando me referi às dificuldades da lavoura: «É preciso atribuir aos produtos da terra um preço remunerador, um preço justo».
O preço tabelar do milho é inferior e nunca acompanhou o preço tabelar do trigo, pois, enquanto este de 1936 para o presente subiu cerca de 100 por cento, o milho apenas teria subido, no mesmo período, o máximo de 85 por cento, sendo sempre certo que desde 1939 em diante o preço do milho em mercado livre, como quem diz em mercado negro, foi sempre apreciavelmente superior ao preço tabelar.
Parece-me que é altura de fazer aproximar o preço tabelar do milho do seu preço em mercado livre, uma vez .que este Atingiu presentemente um nível razoável, que o próprio consumidor aceita.
É sabido que os preços das despesas da lavoura, desde os salários às alfaias e aos adubos, subiram, no período considerado, a mais de 100 por cento. E, sendo assim, parece razoável que o custo de produção, tendo aumentado na proporção referida, implique o reajustamento do preço do produto para um nível equivalente.
Antes da guerra, e, por exemplo, na minha região, o preço do alqueire do milho equivalia normalmente ao salário de dois dias de trabalho de qualquer operário da construção civil.
Hoje qualquer operário da construção civil, mesmo nos meios rurais e trabalhando as horas regulamentares, não ganha menos de 30$ por dia.
E assim, com o salário de apenas um dia de trabalho, pode adquirir em mercado legal o alqueire de milho que dantes comprava com o salário de dois dias, e ainda lhe sobra dinheiro.
Por aqui se avalia quanto o preço actual e tabelar do milho é inferior ao que devia ser, em comparação com o que se passava nos anos anteriores à guerra ou mesmo nos primeiros anos desta.
Ponho, portanto, como condição imediata de melhoramento de produção uma melhoria do preço do milho, que aliás se impõe como medida da mais elementar justiça.
Se outra não for a protecção económica, essa será bastante para estimular o produtor.
Não se poderá, porém, dispensar a protecção técnica, e essa só o Estado a pode dar com eficiência, quer agindo directamente, quer actuando por intermédio dos grémios da lavoura.
Em muitos casos o lavrador mal se apercebeu ainda dos benefícios que lhe podem advir do grémio.
Para muitos o grémio é ainda, e só, uma nova fonte de encargos, mal compreendida e mal aceite.
Para o comum dos lavradores os benefícios à distância não têm o mesmo poder de sedução dos benefícios a curto prazo, e creio que se não fez ainda junto deles a propaganda precisa para ficarem compreendendo que o seu grémio, antes de ser um encargo, é a sua força.
Ora a melhor propaganda que se pode fazer dos grémios da lavoura, para incutir no lavrador comum a ideia da sua eficiência, é transformar a sua actuação por forma a que o grémio apareça junto deles constantemente, dando os seus conselhos, sugerindo as orientações mais convenientes, ensinando o cultivo mais capaz e o granjeio mais racional e produtivo, numa palavra, pregando e ensinando o lavrador a vencer com melhor resultado a dura e quantas vezes inglória batalha da terra.
Desejaria que os grémios da lavoura fossem menos comerciantes e mais lavradores.
Se durante o tempo da guerra, pelas dificuldades na aquisição dos artigos, se justificou que os grémios da lavoura se fizessem comerciantes, e alguns em grande escala, parece-me que já não se justifica que a sua actividade se confine quase exclusivamente a esses limites, devendo, em meu critério, desenhar-se de preferencia para a actividade da assistência à lavoura.
Sr. Presidente: um outro apontamento me ocorre fazer aqui.
A lavoura do milho é feita em grande parte sob o regime do arrendamento ou de parceria agrícola.
Numa ou noutra forma, porém, a prestação que o rendeiro paga ao senhorio é normalmente em cereal. Serão raros os casos em que a parceria ou a renda se estabelece noutros produtos além daqueles.
Ora em matéria de arrendamento rústico vive-se entre nós em regime de plena liberdade contratual, o que se me afigura trazer mais inconvenientes do que os convenientes advindos dessa situação de mãos livres.
O único condicionamento legal que o decreto n.º 5:411 contém a respeito dessa liberdade absoluta é o de se presumir que o contrato, na falta de estipulação de prazo, não fora feito por menos tempo que o necessário para uma sementeira e colheita, conforme a cultura a que o prédio tenha sido aplicado.
Fora disso, senhorio e arrendatário têm as mãos livres, quer para se despedir, no caso do arrendatário, quer para poder despedir, no caso do senhorio.
Desta liberdade resulta para ambos uma situação de incerteza altamente prejudicial: o caseiro teme que o senhorio o despeça, por qualquer motivo, ou mesmo sem motivo; o senhorio receia que o caseiro se despeça, entregando-lhe as terras finda a colheita.
Resultado: receosos um do outro, nem o senhorio faz melhoramentos fundiários por falta de confiança na estabilidade do caseiro, nem o caseiro se afoita a fazer benfeitorias necessárias ou úteis com receio de ser despedido dum momento para o outro sem garantias capazes.
Bem sei que o artigo 65.º do decreto n.º 5:411 dá ao caseiro, nos arrendamentos por menos de vinte anos, o direito de haver do senhorio, depois do despejo, o valor das benfeitorias agrícolas; mas esse preceito, embora bem intencionado, não resolve, evidentemente, a situação.
Mesmo que por benfeitorias agrícolas se possam compreender quaisquer formas ou métodos de melhoramento de cultura - e a lei não distingue o que sejam benfei-