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22 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 55

Governo com base na mesma lei e para os fins de uma reforma tributária.
Com efeito, o artigo 70.º da Constituição diz-nos que os princípios gerais relativos aos impostos devem ser fixados na lei e que esta deve determinar a incidência, a taxa, as isenções a que haja lugar, o as reclamações e recursos admitidos em favor do contribuinte. E, nos termos do § 2.º do referido artigo 70.º, a cobrança de impostos estabelecidos por tempo indeterminado ou por período certo que ultrapasse uma gerência depende do autorização da Assembleia.
Deste modo e desde que na proposta, se não contêm os princípios gerais a que se refere a Constituição, nem se faz menção concreta quer de incidências, taxas e isenções, quer das reclamações e recursos, não pode a Lei de Meios, neste particular, interpretar-se como dando poderes ao Governo para, ao seu abrigo, reformar o nosso sistema tributário. Neste capítulo, ela terá antes de ser entendida como um programa de acção do Governo para aquele fim.

15. Analisemos agora cada um dos artigos da proposta que constituem a parte referente aos réditos fiscais.
O artigo 4.º diz-nos que a carga tributária será proporcionada ao valor verificado do rendimento nacional e distribuída de harmonia com a sua composição. E, pelo artigo 5.º, fica o Governo obrigado a fazer prosseguir os trabalhos do Instituto Nacional de Estatística para a determinação do capital e rendimentos nacionais. Uma primeira estimativa do rendimento nacional - di-lo o § único deste artigo 5.º - deve ficar concluída até 31 de Outubro de 1951, efectuando-se as restantes avaliações no mais curto prazo possível.
O artigo 4.º refere-se, evidentemente, aos chamados impostos directos, ou seja à contribuição industrial, à contribuição predial, ao imposto profissional, ao imposto sobre a aplicação de capitais, ao imposto complementar, ao imposto sobre as sucessões e doações e à sisa sobre as transmissões de imobiliários por título oneroso. Estes são, com efeito, os principais impostos directos.
Em nosso entender, não se pode dizer que, presentemente, a carga tributária não procure ajustar-se ao rendimento nacional. O que é realidade indiscutível é que os meios e as formas adoptadas para tal fim nem sempre correspondem ao rendimento real ou tem sido inspirados em critérios de natureza científica, visando uma absoluta justiça tributária. Na contribuição predial atende-se, conforme os casos, ao rendimento efectivo (rendimento real) ou ao susceptível de ser percebido (rendimento normal); no imposto profissional levam-se em conta os vencimentos, as gratificações e quaisquer outras remunerações recebidas (rendimento real) ou - é o caso das profissões liberais- atende-se aos rendimentos normais ou presumíveis; na contribuição industrial a matéria tributável ou é encontrada através de índices ou por estimativa administrativa, quer dizer, por processos de presunção; no imposto sobre a aplicação de capitais, se há casos em que as situações reais são consideradas, outros há em que tal não acontece, como nos empréstimos gratuitos, que a lei não admite, ou naqueles em que o juro estabelecido é inferior ao que o fisco reputa normal; na sisa e no imposto sucessório considera-se a posição financeira do contribuinte; finalmente, no imposto complementar, dada a sua natureza de imposto progressivo e correctivo, procura-se o englobamento da generalidade dos rendimentos que, isoladamente considerados, são passíveis de tributação.
Em matéria tão delicada, e que atinge a massa geral da população do País, é evidente que melhor seria seguir-se na tributação um critério que em si mesmo contivesse os melhores princípios de justiça tributária.
A verificação do efectivo rendimento nacional e a distribuição da carga tributária de harmonia com a sua composição e em proporção do seu valor satisfariam àquele fim e trariam consigo uma mais perfeita justiça fiscal.
O conhecimento do efectivo rendimento nacional exprimir-se-á por um quantitativo que englobe toda a riqueza do País e que abranja a generalidade das suas actividades produtivas. Serão a agricultura, o comércio, a indústria, as minas, as florestas, a pesca, a caça, os transportes, a navegação, o trabalho, a riqueza imobiliária, os capitais, as sociedades; serão todas estas actividades ou fontes de riqueza a ser consideradas num trabalho que, para merecer crédito e poder servir de fundamento a uma reforma tributária, terá de se basear numa estatística de todos os bens e valores nacionais, completa, perfeita e susceptível de actualização periódica.
A tarefa é gigantesca e embora se saiba que os serviços de estatística em Portugal são dos mais progressivos e muito já têm feito no sentido de alargar cada vez mais a informação estatística, a verdade é que se duvida que a recolha dos respectivos elementos - não por culpa dos serviços mas por virtude da incompreensão do meio relativamente ao preenchimento de questionários e outros processos de informação - tenha atingido já aquele grau de adiantamento e perfeição que permita chegar rapidamente a conclusões sobre matéria da maior complexidade e que exige total conhecimento dos números que em conjunto deverão exprimir o rendimento de cada um dos grandes capítulos da riqueza portuguesa.
O apuramento do rendimento nacional pode dizer-se que é o trabalho culminante dos serviços de estatística de qualquer país. E porque assim é, que se saiba, só a Inglaterra, os Estados Unidos da América e os Estados escandinavos - países onde a estatística, graças à utilização de enormes recursos financeiros e à educação dos seus habitantes, atingiu notável adiantamento - publicam estimativas merecedoras de algum crédito. Nos outros países ou nada há feito ou vai-se tentando, através dos mais variados processos, abrir caminho para as melhores soluções. Os resultados obtidos, porém, são as mais das vezes desconcertantes e fica-se por isso sem saber se não seria preferível continuar a utilizar os processos simples que já deram as suas provas a passar a fazer fé em estimativas que não correspondem à realidade das coisas e dos valores.
Em relação a Portugal, algumas tentativas se fizeram até hoje com vista ao apuramento do rendimento nacional. É curioso notar que todos elas foram de iniciativa particular e que em todas se chegou a números e a resultados contraditórios e inajustados à realidade.
O país que disponha de uma estimativa do rendimento nacional poderá distribuir mais equitativamente a carga tributária e medir o limite das possibilidades dos contribuintes em matéria de pagamento de impostos. Por este processo, se, por exemplo, a agricultura estiver sobrecarregada e o comércio aliviado, a Administração terá meio seguro de corrigir o desequilíbrio, da mesma forma que toda a matéria dos novos impostos e do quantitativo das taxas poderá ser apreciada à luz de uma realidade que não ofenda ou estiole as fontes de produção. O que não parece - repete-se - é que já tenhamos atingido aquele grau de perfeição e de apetrechamento dos serviços sem o qual nenhum trabalho desta natureza é eficiente. Por isso se entende não ser de fixar, por enquanto, um prazo para a elaboração de uma estimativa, mesmo provisória.

16. Onde existem estimativas do rendimento nacional a principal carga tributária no que se refere aos impostos directos ó, regra geral, constituída pelo chamado imposto de rendimento, que se baseia em declarações individuais do contribuinte e abrange todos os seus rendi-