898 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 101
nos termos atras expostos, que outra razão atendível poderá torná-las condicionáveis? Só se for a de evitar a desnacionalização das empresas; mas a isso se aludirá mais adiante.
3. O condicionamento realiza os seus fins mediante o licenciamento dos actos que com eles contendem. Interessa, portanto, saber que actos hão-de poder ficar dependentes de autorização prévia.
A base III da Lei n.º 1:956 menciona os seguintes: instalação de novos estabelecimentos, reabertura dos estabelecimentos fechados há mais de dois anos, quaisquer modificações no equipamento que produzam alteração nos registos do cadastro industrial, transferência da propriedade de nacionais para estrangeiros e transferência da propriedade de nacionais para nacionais, quando envolver mudança do local do estabelecimento.
Evidentemente que devem ser licenciáveis a instalação e a reabertura de estabelecimentos fabris. Parece arbitrário, porém, só tornar a reabertura dependente de autorização prévia em todas as indústrias quando o encerramento exceda, dois anos. É que dois anos permitem número maior ou menor de ciclos produtivos, consoante o carácter das actividades, a origem orgânica e inorgânica das matérias-primas, as exigências dos mercados. Será conveniente, portanto, adaptar o período à natureza da indústria que se condiciona e, até para evitar fraudes, definir o encerramento em função das características dessa indústria.
Evidentemente, também, que devem ser licenciáveis as modificações no equipamento fabril. Que modificações, todavia? A Lei n.º 1:956 fala das que importem forçosamente alteração nos registos do cadastro industrial. Mas a verdade é que nunca se soube ao certo quais os elementos que devem ser registados no cadastro nem este se encontra ainda satisfatoriamente organizado. Por conseguinte, parece preferível indicarem-se sempre, em relação a cada indústria condicionada, as modificações no equipamento que ficam dependentes de autorização prévia.
A base III da Lei n.º 1:956 torna licenciáveis, por último, as transferências da propriedade. Quanto à inclusão destas, porém, é que podem mover-se sérios reparos.
Vejamos, primeiramente, as transferências da propriedade de nacionais para estrangeiros. Pretende-se evitar, através do seu licenciamento, a desnacionalização das empresas. No entanto, é desde logo estranho que, não abrangendo o condicionamento todas as indústrias nem figurando explìcitamente entre as numeradas na base II da lei em vigor aquelas que precisem de ser defendidas do acesso de estrangeiros, só se possam controlar as transferências da propriedade para eles nas indústrias condicionáveis, e não em todas. Como se vê, o licenciamento destas transferências de propriedade articula-se mal com a economia da Lei n.º 1:956. Independentemente disso, porém, haverá razões para elas continuarem sujeitas a autorização prévia? Parece que não. Pois que, por um lado, as indústrias onde poderia ser perigoso o predomínio de estrangeiros caem hoje sob a alçada da Lei n.º 1:994 (lei de nacionalização de capitais); por outro, afora essas indústrias, justificam-se mal os empecilhos à entrada de capitais e à vinda de empresários neste nosso país, que está, felizmente, ao abrigo de tentativas de colonização imperialista, mas carece de dinheiro e de industriais capazes para desenvolver a sua economia.
Vejamos agora as transferências da propriedade de nacionais para nacionais: só podem ser sujeitas a licença prévia quando envolverem mudança do local do estabelecimento. Contudo, parece que a mudança do local, quer consequente ou não à transferência da propriedade, tanto para nacionais como para estrangeiros, deve poder ser sempre controlada pelo Governo. Basta pensar-se em que a localização da indústria é susceptível de influir consideràvelmente no mercado do trabalho e no dos produtos.
4. A Lei n.º 1:956 consagrou, na sua base V, o princípio da especialização do condicionamento: o condicionamento de cada indústria tem de ser feito por diploma próprio (decreto regulamentar), no qual se indiquem explìcitamente os actos carecentes de autorização prévia.
O princípio está de inteiro acordo com a natureza do condicionamento. Trata-se de um regime de excepção, que é ou pode ser imposto por diferentes motivos a indústrias em situações diversas. Daí que o condicionamento de cada actividade deve ser definido em função do fim especial a atingir e das particularidades da indústria respectiva. O que, além disso, tem a vantagem de evitar a facilidade - para não dizer a possível ligeireza - dos condicionamentos em série.
Há, pois, que manter o princípio da especialização. Mas como êsse princípio, apesar de consagrado desde 1937, raras vezes foi cumprido, há que providenciar para que o seja sempre doravante: de um lado, fixando prazo para a publicação dos decretos regulamentares respeitantes àquelas indústrias, de entre as actualmente condicionadas, que se entenda deverem continuar sob esse regime; do outro, só permitindo - como justificámos atrás - que certos actos fiquem dependentes de licença prévia quando expressamente discriminados ou especialmente definidos no diploma do condicionamento da respectiva indústria.
Supõe-se que dêste modo se conseguirá não só afeiçoar o regime às exigências de cada actividade, como ainda confiná-lo àqueles sectores onde seja realmente necessário.
Dados, porém, os objectivos do condicionamento, não se suportaria que fosse, e até que pudesse ser, autorizada a criação de unidades ineficientes. No entanto, a fim de poupar despesas inúteis aos interessados e trabalho estéril à Administração, convém que esta determine e aqueles conheçam as condições mínimas de fabrico requeridas para a montagem de novos estabelecimentos: o que se deve fazer, indicando-as no competente decreto regulamentar.
5. O condicionamento pode não abranger uma indústria toda, limitando-se a alguma ou algumas das suas modalidades. Todavia, há modalidades que, em certas circunstâncias, devem ser declaradas sempre isentas do condicionamento.
Uma é a da indústria familiar no domicílio, pela protecção que socialmente merece e a nossa Constituição lhe dispensa no artigo 32.º
A seu propósito, porém, não pode esquecer-se que vários sectores industriais são inadequados ao trabalho caseiro, ou porque exigem grandes instalações ou porque normalmente não consentem as pequenas oficinas. Ora, se se libertasse do condicionamento toda a indústria familiar no domicílio, poderia muito bem assistir-se, neste último caso, à proliferação das oficinas caseiras em épocas excepcionalmente favoráveis, com a eliminação delas ou a sua subsistência em termos precários quando depois se regressasse à normalidade. Parece conveniente dispensar as indústrias dessa tarefa de eliminação ou da sobrecarga de um peso morto, assim como poupar aos pouco abastados a perda dos seus mealheiros. Daí que as oficinas familiares do domicílio só devam ser isentas do condicionamento nas indústrias que lhes forem propícias. E como os requisitos do trabalho caseiro merecedor da isenção hão-de