25 DE ABRIL DE 1951 899
diferir de indústria para indústria - e será sempre preciso evitar as fraudes-, deve pertencer ao decreto regulamentar respectivo não só libertá-lo como definir os termos em que fica isento. Preconiza-se, desta forma, o regresso à doutrina da base IV da Lei n.º 1:956, de que o Decreto n.º 36:279, de 15 de Maio de 1947, ao preceituar uma isenção geral, manifestamente se afastou.
Outra modalidade é a da indústria complementar da exploração agrícola, pela ajuda que pode trazer à magra economia do nosso lavrador. Com efeito, o aproveitamento das matérias-primas no próprio local onde são produzidas, com a supressão de transportes e de eventuais intermediários e o emprego de mão-de-obra rural, permite ao agricultor valorizar consideràvelmente os frutos da sua lavra, colhendo ele mesmo os benefícios que doutro modo teria de pagar a quem lhe vendesse os produtos fabricados. Sendo assim, devem excluir-se do condicionamento aqueles estabelecimentos que representem uma simples extensão industrial da exploração agrícola, isto é, os que apenas se destinem a preparar ou transformar os produtos do próprio lavrador. Tanto mais que não resultará daí aumento de produção capaz de subverter o equilíbrio do mercado e que valerá a pena renunciar a certos aperfeiçoamentos técnicos - cuja falta, aliás, será geralmente compensada pela redução de outros elementos do custo- só para poupar aos nossos agricultores os embaraços e dificuldades que a obtenção das licenças lhes acarreta. Falta apenas acrescentar que, havendo todo o interesse em suprimir obstáculos à formação de cooperativas nos meios agrícolas, devem ficar libertos não só os estabelecimentos que preparem ou transformem os produtos de um como os de vários lavradores associados.
6. Não há dúvida de que o condicionamento há-de procurar ser sempre um factor de progresso económico, embora de progresso equilibrado. Pois ainda quando o Govêrno intervenha para evitar o desemprego o seu objectivo será apenas impedir uma desocupação numerosa e brusca, e não fechar a indústria aos aperfeiçoamentos técnicos. Que estes se realizem, mas sem perturbações sociais graves.
Logo se vê, porém, que o condicionamento, pelo simples facto de ser uma restrição à liberdade económica, oferece o perigo de se transformar em factor de estagnação: por um lado, a exigência da autorização prévia, com as delongas e a incerteza de a obter, é uma peia que pode desviar da indústria condicionada capitais que a ela acorreriam se fosse livre; por outro, é natural que as empresas pertencentes a essa indústria, sentindo-se mais a coberto de novos competidores, percam muito do seu interesse em melhorar a técnica, sobretudo se já auferirem lucros quantiosos.
Pode bem ser factor de estagnação, e algumas vezes o condicionamento o terá sido. Contudo, seria temerário atribuir-se-lhe sem mais o escasso progresso das nossas indústrias. Na verdade, lembremo-nos de que o ritmo do progresso económico era bem menor antes de instituído o regime do condicionamento do que o foi depois. E de que a economia portuguesa sofre de três males, nem todos sem remédio, mas indubitàvelmente responsáveis por muito do nosso atraso: a falta de riquezas naturais, que impossibilita a formação das indústrias básicas ou as condena a escasso rendimento; a falta de capitais, que impossibilita uma concorrência activa, estimulante, saneadora, em muitas das indústrias existentes; a falta de vastos mercados, que impossibilita a produção em larga escala e, portanto, as economias internas e externas da grande empresa.
De qualquer modo, porém, basta que o condicionamento possa ser factor de estagnação para que tenham de prescrever-se medidas adequadas a evitá-lo. Supõe-se que serão estas:
Primeiro, deverá impor-se ao Govêrno o deferimento dos pedidos de instalação e desenvolvimento das unidades que laborem com maior eficiência, podendo ele apenas, quando daí resulte súbito e considerável desemprego, regular a montagem dos estabelecimentos ou a sua expansão, de modo a que a dispensa de trabalho se torne gradual. Vai isto contra a ideia arreigada em muitos de que, sendo já bastante a capacidade de produção das empresas existentes, é supérflua, e até nociva, a formação de novas empresas. Como se fosse inútil, porventura, a acção da concorrência!
Além disso, deverá facultar-se ao Governo o regular as características de qualidade e o preço das mercadorias das indústrias condicionadas, para que previna ou reprima os lucros excessivos, e a modificação ou revogação das autorizações concedidas, já prevista na base XII da Lei n.º 1:956, para que possa exigir-se às empresas a actualização dos seus métodos de fabrico.
7. Quase todas as nossas indústrias se encontram dependentes do Ministério da Economia. Pràticamente, portanto, o regime do condicionamento está nas suas mãos. Ora, este Ministério tem um órgão consultivo - o Conselho Superior da Indústria - a que hoje compete dar parecer, em matéria de condicionamento industrial, apenas sobre os processos que lhe forem submetidos (Decreto-Lei n.º 36:933, de 24 de Junho de 1948).
Todavia, compreende-se mal que não seja obrigatória a audiência de um organismo superior de consulta em todos os casos que mais de perto possam interessar à economia nacional ou aos direitos fundamentais dos cidadãos: instauração e cessação dos condicionamentos, disciplina de preço das mercadorias, modificação e revogação das autorizações. Assim como se compreende mal que o Ministério da Economia, mormente nesta época de profunda transformação da vida industrial do País, não disponha permanentemente de um grupo de pessoas de reconhecida competência a quem caiba estudar, de moto .próprio e sob consulta, os grandes problemas do condicionamento, reorganização e fomento das indústrias.
Todas estas funções, tão estreitamente conexas, devem ser cometidas a um mesmo organismo; e podem-no ser ao Conselho Superior da Indústria, se a sua estrutura for convenientemente modificada.
Na verdade, o actual Conselho, constituído por várias secções, onde participam em larga medida os representantes de serviços públicos, tem desde logo uma feição que não pode permitir-lhe funcionamento eficaz, pois esses representantes continuam a ser funcionários de outros organismos, e não admira que as tarefas do Conselho, por capitais que sejam, só secundàriamente os interessem, muitas vezes.
Tudo se resolverá, decerto, se o Conselho Superior da Indústria passar a ser composto pelas três ordens seguintes de elementos: pessoas competentes nos domínios da economia teórica e aplicada, industriais perfeitamente conhecedores das exigências das suas actividades e representantes dos organismos de coordenação ou corporativos que façam valer os interesses das respectivas categorias.
8. Ficam assim explicadas as alterações e os acrescentos de maior relevo que o Governo entende deverem fazer-se à Lei n.º 1:956. Pareceu, no entanto, que era ainda conveniente reafirmar-se na nova lei logo de início o princípio da iniciativa privada, com o consequente carácter excepcional do condicionamento. Fora de dúvida que aquele princípio está bem claro nos di-