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904 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 101

indispensáveis para cumprimento da sua missão. Por outro lado inicia-se a organização corporativa da Nação para que ela não falte também à parte tão importante que lhe está reservada.
É dentro desse processo de adaptação à nova ordem constitucional que tem de ser entendida, como o foi na altura própria, a Lei n.º 1:956, promulgada em 17 de Maio de 1937.
Tem sido já várias vezes lamentado o facto de ter caído em desuso, ou não ter sido mesmo reatada em 1934, a interessante tradição de se antecederem as novas leis do respectivo relatório. Parece manifesta a vantagem de se concretizarem no tempo e no espaço critérios fundamentais que nem sempre resultam suficientemente claros da interpretação isolada dos articulados. Isto se observa mais uma vez a propósito do caso da actual proposta, que, reproduzindo grande parte da matéria da Lei n.º 1:956 no que ela teve de essencial, aparenta no seu relatório interpretação que não coincide de certo modo com aquela que inspirou a promulgação original dos mesmos preceitos.

3. Como se passou de facto do regime inicial do condicionamento de 1931 para a Lei n.º 1:956?
Mantendo simplesmente em vigor por mais algum tempo uma medida de carácter transitório? Encarando o condicionamento como um caso isolado e restrito? Criando, ao contrário, um estatuto tão completo mas afinal em tão evidente -desproporção com uma intervenção tão supostamente excepcional do Estado na vida ou no nascimento das indústrias?
É fácil de ver que as coisas se não passaram assim e que foi outro o horizonte então invocado na resolução do problema.
A proposta de lei de 1937 foi objecto de parecer desta Câmara e teve depois larga discussão na Assembleia Nacional. Pode afirmar-se que os preceitos propostos foram objecto de atento exame por parte dos interessados em geral e dos homens mais eminentes dêste país com assento, ao tempo, nas duas Câmaras.
Pela primeira vez os graves problemas do condicionamento vieram a exame e discussão geral da Nação e a lei saiu depois como verdadeiro produto dessa vasta colaboração de todos os que podiam e deviam intervir nela.
Vale de facto a pena -agora que o Governo propôs novo exame da matéria - reler o parecer desta Câmara emitido em 1937 e seguir com atenção as actas das sessões da Assembleia Nacional, onde o debate se prolongou por vários dias.
Todos foram unânimes em considerar a nova lei, não como uma prorrogação mais ou menos provisória do condicionamento de 1931, mas como integração dentro da nova ordem constitucional e mais especialmente dentro do Estatuto do Trabalho Nacional do que havia de permanente na ideia inicial daquele. Por isso na base I da Lei n.º 1 :956 ficou consignado que o condicionamento passava a subsistir, dentro dos limites da doutrina do Estatuto do Trabalho Nacional, especialmente nos seus artigos 7.º e S.º, mais atrás recordados.
Parece oportuno transcrever do parecer da Câmara Corporativa em 1937 o trecho seguinte:

... a preocupação que neste momento vemos desenhar-se nas várias indústrias é a de ficarem fora do condicionamento. Este resultado, pois só por ele se pode inferir o verdadeiro valor das medidas legislativas, é a confirmação plena do êxito da medida tomada em 1931.
Sòmente o decreto de 1931 foi uma medida apenas de urgência, um mero expediente de ocasião. A intervenção do Estado na vida económica era um fruto das circunstâncias do momento que ainda não obedecia a uma orientação definida.
A 23 de Setembro de 1933 o Decreto n.º 23:048 promulga o Estatuto do Trabalho Nacional, verdadeira constituição da economia portuguesa. Aí, como justamente se recorda no relatório da presente proposta de lei, o Estado reivindica o direito e assume a obrigação de regular superiormente a vida económica e social, consignando para isso os princípios de conduta a seguir no artigo 7.º Nova era a situação assim criada e novos deviam ser, pois,- os processos legais a aplicar. O condicionamento era uma consequência lógica da doutrina do estatuto. Não devia ser mais um expediente temporário, mas um regime definitivo. Com fundada razão assim o vem estabelecer a nova proposta de lei. E, ao redigi-la, o Governo não veio tentar uma nova experiência, como em 1931, mas, forte dos ensinamentos da prática, quis prosseguir no caminho encetado com êxito não duvidoso e procurar aperfeiçoá-lo.
Explica-se, por isso, a contradição aparente que se nota ao ver que se torna mais perfeito e duradouro o regime do condicionamento e que ao mesmo tempo se restringe o seu campo de aplicação. Poderia invocar-se como justificação suficiente para o facto a dificuldade administrativa, já assinalada, da imensidade da tarefa do condicionamento, abrangendo, a bem dizer, todas as indústrias nacionais. Nada mais seria preciso para abonar a restrição referida.
Mas, em boa verdade, essa restrição é contestável. Se, por um lado, se dá para o futuro a exclusão de algumas indústrias até hoje sujeitas ao condicionamento, admite-se a ampliação indefinida deste a todas as indústrias que ingressem no regime corporativo. Se tal se fizesse com o único intuito de criar mais um estímulo para que as indústrias se organizassem corporativamente, já a medida mereceria aplauso. Mas, além dessa consideração, certamente não ausente do espírito do autor da proposta, outra razão determinou fundadamente a sua resolução. O regime corporativo, com efeito, fornece elementos para o conhecimento da situação real das indústrias que abrange, que, fora dele e à falta de um inquérito industrial actualizado, não existem. Dentro daquele regime é simples o funcionamento do regime legal, tão árduo e lento no contacto directo entre os serviços públicos e as indústrias isoladas.
A Câmara Corporativa não pode, pois, deixar de aprovar o sentido geral da proposta e de louvar os intuitos a que ela obedeceu.

O parecer da Câmara Corporativa em 1937 foca nestes curtos períodos toda a substância da Lei n.º 1:956. Não apenas no campo dos princípios -ou seja pelo que importava à definição precisa da nova doutrina e à integração nela do que havia a conservar do condicionamento primitivo -, mas também o papel que ia desempenhar na sua efectivação a própria organização corporativa e ainda a consequente distribuição de funções ou a colaboração que se tinha como indispensável entre o Estado, as corporações e os indivíduos.
Numa palavra: a doutrina e a mecânica da nova ordem de coisas.

4. Esta era, naturalmente, a única visão do problema a aceitar dentro de um Estado que se proclamava unitário e corporativo. E tão vincada foi esta interpretação dos factos e dos textos legais que oito anos volvidos - diferente a época, diferente o horizonte