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DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 53 1106

biclo, não podia funcionar. A que me respondem os tais técnicos que «lê funciona se ns condições do seu funcionamento se verificarem.
Eu digo: pois é verdade, e qualquer outro sistema funciona se ns condições se verificam. Simplesmente a realidade não é aquela, e, portanto, ou nós trucidamos a realidade e n metemos no moinho do sistema, o que é difícil, tem-se provado que é difícil, ou entoo o sistema não funciona. Isto é, a transposição para o sistema inter territorial português de sistemas de pagamentos que funcionaram noutros países com graus de desenvolvimento muito diferentes dos nossos - possivelmente muito mais próximos uns dos outros do que nós em relação ao ultramar- levava, fatalmente, a que este sistema só podia funcionar de uma única maneira: os desequilíbrios estruturais - desculpem-me o palavrão - das províncias ultramarinas tinham de ser sempre compensados por um afluxo de capitais no sentido metrópole-ultramar. E, como os desequilíbrios estruturais do ultramar são maiores, porque o estado de desenvolvimento é menor do que o da metrópole, necessariamente esse fluxo, ou se verifica, ou encontramo-nos naquilo que nós designamos, eufemisticamente, por atrasos de pagamentos.
Portanto, só vejo duas soluções. Ou estes desequilíbrios desaparecem, o que significa, em termos concretos, que o desenvolvimento do ultramar se faz em ritmo muito mais acelerado que o da metrópole, e, portanto, a aproximação de níveis se faz, e como tal o fluxo de capitais terá de ser menor para cobrir o déficit, ou então temos de nos habituar a viver com o déficit se quisermos manter o sistema.
Novo problema surge: então que razões levam a metrópole a cobrir todos os anos os deficits do ultramar? Pois há muitas razões. Mas simplesmente essas razões estilo ligadas ao primeiro problema que pus: o que é o espaço económico nacional? Enquanto eu não souber o que é o espaço económico nacional, não consigo encontrar uma solução, porque toda a solução que se consiga encontrar é uma que pressupõe como é que ns diferentes parcelas se integram e se coordenam.
Há uma coisa que posso por mim, como opinião pessoal, dizer: é possível que o desenvolvimento do ultramar seja muito mais rápido do que o da metrópole. E possível. Os recursos estão lá, as potencialidades estão lá, e devo dizer mesmo mais que o horizonte ultramarino é mais vasto que o horizonte metropolitano.
Ao falar com homens de Angola ou de Moçambique, encontrei sempre um espírito mais aberto no plano do desenvolvimento económico do que na metrópole. Na metrópole vivemos muito protegidos, no tal rectângulo de que já falei. Vivemos um pouco desligados da Europa, com horizontes, digamos, que por vezes não permitem as pessoas verem além da ponte de Sagres ou além dos Pirenéus. Mas, no entanto, em qualquer caso, o horizonte ultramarino, em particular de Angola e Moçambique, é mais largo.
E no plano de desenvolvimento económico isto tem uma importância muito grande. E, por isso, ou realmente se acredita, e eu acredito, que o ultramar se possa desenvolver a um ritmo tal que possa diminuir a diferença em relação à metrópole, e eu penso que possa ser assim, em particular se a metrópole continua com ritmos reduzidos de desenvolvimento, mas, para isso, temos de fazer uma opção decidida e dizer que vamos investir onde a rentabilidade for maior, o que é também uma opção dolorosa. Por isso, queria só afirmar que acredito que possa ser assim. Se assim não for, nós podemos iludir a realidade, um ano, dois anos, quantas vezes não ouvimos já, inclusive a membros do Governo, afirmar que o problema dos pagamentos estava resolvido. Pois estava, naquele momento; mas a estrutura, a máquina implacável, funcionava sempre, num dado sentido, porque não podia deixar de ser assim. É natural até que agora também se nos diga que o problema está resolvido. Se conseguissem reunir alguns milhões de contos (não importa aqui o número), o problema estava resolvido.
Mas a mecânica interna de desenvolvimento será sempre no sentido desse desequilíbrio.
Além disso, algumas consequências surgem no plano da metrópole; provoca aquilo que eu já disse eufemisticamente, os atrasos dos pagamentos do ultramar, e esses significam imobilizações mais longas do que seria previsto pelos exportadores metropolitanos.
Isto significa, portanto, uma imobilização mais longa na liquidez das empresas em relação às suas vendas no ultramar. O que significa, consequentemente, uma imobilização mais da liquidez do próprio sistema bancário. E então o problema põe-se: a liquidez do sistema bancário pode ser afectada (não digo que o esteja completamente. Está em parte). E não só por esse motivo, mas também pela saída de divisas resultante de importações vultosas que se verificaram, assim como por algumas coisas que eufemisticamente também já se chamou de atrasos dos pagamentos militares. E não só por isso. Neste momento, a própria conta corrente do Tesouro fez uma recolha muito grande, visto que as receitas ultrapassaram, felizmente, aquilo que se esperava e, portanto, houve uma redução da liquidez do seu sistema, que é também afectada, na medida em que se desvia a liquidez do sistema monetário para o sistema financeiro.
E um problema que existe em. muitos países e que em Portugal tem a sua maior importância, em face de uma crítica que frequentemente se faz à empresa em Portugal e que já teve eco, digamos, nas próprias afirmações governamentais. Isto é: a estrutura das empresas portuguesas é deficiente no plano financeiro, o que significa que as empresas vivem, muitas vezes, vá lá, em linguagem popular, «presas por arames», porque estão a trabalhar com capital circulante como capital permanente e na medida em que, sendo circulante, juridicamente e legalmente, é economicamente permanente, qualquer liquidez mais apertada do sistema bancário faz tremer, não o funcionamento normal das empresas, mas sim a sua própria fundação e a sua própria essência, visto que elas se baseiam (mal, sem dúvida, mas esta é uma realidade) num capital circulante que é permanente no plano económico.
E por isso deixarei aqui uma palavra somente para ' sublinhar algo que o Governo conhece e que é o problema da liquidez do nosso sistema monetário.
Finalmente, outro aspecto relativo à política financeira.
Parece que estamos todos de acordo em que, em qualquer país e em qualquer tipo de desenvolvimento, o imposto é um mal inevitável, e que se paga cada vez mais imposto e das mais variadas formas. Nós ainda somos considerados como tendo uma carga tributária relativamente baixa. Mas parece também haver acordo generalizado em que essa carga tributária está mal repartida, não digo entre ricos e pobres, porque não é disso que agora me ocupo, mas está mal repartida entre diferentes actividades, e o próprio Governo - e mais uma vez o meu louvor ao Sr. Ministro das Finanças - o reconheceu ao afirmar que a contribuição industrial diminuiu porque havia um desequilíbrio, digamos, entre a imposição contributiva da actividade industrial e a de outros tipos de contribuição, fundamentalmente a predial urbana, que era relativamente reduzida.
Sabemos também que, na medida em que o imposto se torna mais pesado, a fiscalização se torna mais difícil.