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1226 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 59

nhoso caminho da traição, se constituíram os responsáveis pelo acontecimento a que todo o mundo civilizado assistiu com indignação e espanto.
E nesta quadra do Natal, em que as almas se unem no ideal da paz e da concórdia, que necessariamente postula o respeito dos direitos dos indivíduos e dos povos, surge no meu espírito a figura do homem genial que, com tanto afinco e amor, se devotou à defesa do património da Pátria Portuguesa: o antigo Presidente do Conselho de Ministros, Sr. Prof. Doutor António de Oliveira Salazar.
Ecoam, ainda, nas almas de todos nós as últimas palavras do seu discurso, de 3 de Janeiro de 1962:

Toda a Nação sente na sua carne e no seu espírito a tragédia que se tem vivido, e vivê-la no seu seio é ainda uma consolação, embora pequena, para quem desejaria morrer com ela.

Anos decorreram sobre o nefasto acontecimento, e o Estado Português da índia, mutilado e oprimido, continua a sua representação na Assembleia Nacional, a fim de se acautelarem e defenderem os interesses daqueles portugueses - e muitos são eles - que se encontram espalhados pelas cinco partidas do Mundo.
Quer sujeitos ao jugo da opressão, quer acolhidos à hospitalidade de outros povos, os portugueses da índia, integrados na unidade da língua, da crença e da cultura lusíada, persistem em manter, abnegadamente, o fogo sagrado da portugalidade.
Daqui envio a mais sentida saudação a todos quantos, no Estado da índia, defendem o património da civilização portuguesa e, intransigentemente, afirmam o direito que lhes assiste de continuarem a ser portugueses.

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Castro Salazar: - Sr. Presidente: Completam-se quinhentos anos no «próximo dia 21 de Dezembro que os navegadores portugueses João de Santarém e Pêro Escobar acharam, no golfo da Guiné, a ilha que tomou o nome do santo cuja memória nesse dia se festejava: o apóstolo S. Tomé. Dias depois, a 17 de Janeiro de 1471, encontraram os mesmos navegadores outra ilha, cerca de 80 milhas a nordeste da primeira, que denominaram de Santo Antão, e mais tarde se viria a chamar ilha do Príncipe.
Não nos diz a história quais os sentimentos que dominaram os navegadores portugueses ao tomarem contacto com essas duas ilhas perdidas na imensidade do mar oceano, mas não será precisa grande imaginação ao supormos que deviam ter ficado maravilhados perante a beleza extraordinária com que Deus dotou prodigamente as ilhas de S. Tomé e do Príncipe. «Perdido paraíso terreal» lhes chamou alguém, rendido perante aquela alucinante e exótica beleza; Armando de Aguiar afirmou não deverem existir outras «de maior beleza que estas duas, de areias finas, recantos paradisíacos e de um perfume capitoso provocado pela constante floração de sucessivos jardins, que se substituem quando a natureza faz morrer as plantas que já vicejaram».
A par da sua beleza extraordinária, foram as ilhas igualmente mimoseadas por Deus com, um solo, cujo substrato geológico, aliado à situação geográfica do arquipélago, o tornaram ubérrimo e rico, criando-lhe condições óptimas para o cultivo de dignos dos chamados produtos ricos tropicais.
Ao examinarmos o longo processo histórico que levou à humanização de um território até então desabitado e inóspito, embora paisagisticamente belo, não podemos deixar de admirar o patriotismo e a determinação dos homens que nestes quinhentos anos, superando todas as dificuldades que o clima, a floresta virgem, a distância e as doenças lhes faziam deparar, se fixaram aí e souberam com o seu trabalho e inteligência aproveitar todas as potencialidades que a «bondade do solo» lhes oferecia, fazendo de S. Tomé e Príncipe um dos territórios económicamente mais progressivos do ultramar português.
No entanto, S. Tomé e Príncipe não vale, nem pela beleza com que Deus a dotou, nem pelo trabalho aí realizado pelo homem, que desbravou a terra e criou riqueza: a exiguidade do território pouco significado tem no conjunto do mundo português, e a riqueza extraída do seu solo quase não chega a ter expressão dentro do espaço económico nacional; as ilhas de S. Tomé e Príncipe valem, sim, pelo que o homem português aí realizou em civilização cristã e compreensão humana, promovendo a formação nesse território de uma sociedade multirracial onde sómente o valor do homem como pessoa humana conta, qualquer que seja a sua origem ou cor da pele.
Portugueses oriundos da metrópole e da Madeira, a que se juntaram alguns genoveses e franceses, e depois, em maior número, negros da costa do Gabão, homens brancos e pretos com estilos de vida e cultura diferentes, encontraram-se nos fins do século XV na ilha de S. Tomé, onde se fixaram e constituíram o primeiro núcleo populacional das ilhas; facilitada e até superiormente determinada a miscigenação, que, aliás, nunca repugnou ao Português, aparece dentro em breve a primeira geração de mestiços e começa a estruturar-se socialmente a nova comunidade. Desde o seu início que esta foi aberta a todas as etnias, por ordenação régia e vontade dos portugueses aí fixados, tendo nela cada um o seu lugar unicamente «segundo os seus merecimentos». Essa pequena comunidade, cuja memória quase se perde na bruma dos tempos, cresceu, recebeu nova seiva ao longo dos séculos, multiplicou-se em pequenas comunidades pelas duas ilhas, e sempre fiel aos princípios em que se estruturou, engloba hoje uma população de setenta mil habitantes. Sociedade multirracial onde a amizade e o respeito mútuo unem todos os cidadãos, ela constitui um modelo de conveniência humana e de progresso.
Progresso que se traduz numa população totalmente escolarizada e de índice cultural muito acima da média geral do verificado nas outras regiões africanas; num índice de mortalidade infantil caracterizado por ser o mais baixo de toda a África; num rendimento per capita anual sómente superado em África pelos que se verificam na República da África do Sul e no Gabão; numa população activa aumentando de ano para ano e com um poder de compra que lhe permite adquirir cada vez maior quantidade de bens de consumo; e num produto interno com um crescimento anual bastante superior ao que as estimativas mais optimistas previam e desejavam para o resto do continente africano. S. Tomé e Príncipe é das pouquíssimas regiões africanas que ultrapassaram já a fase de subdesenvolvimento e lança-se com entusiasmo e confiança à conquista de novos horizontes.
Orgulhamo-nos do que em S. Tomé e Príncipe fizemos nestes cinco séculos de história, mas orgulhamo-nos, sobretudo, de termos provado ao mundo, ao longo deste meio milénio, que é possível a convivência fraterna entre homens das mais variadas origens e raças, quando os anima a compreensão, o respeito mútuo, a tolerância e a amizade, frutos da civilização cristã que os Portugueses levaram para aquelas ilhas e souberam, mais pelo exemplo do que por palavras, transmitir aos homens de outras raças que com eles edificaram S. Tomé e Príncipe.