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19 DE JUNHO DE 1971 2105

todos os direitos têm limites - a ofensa dos direitos de terceiros, a moral, os interesses colectivos. Mas isso não implica que, dentro dos limites gerais, não seja necessário acautelar, no próprio texto constitucional, a liberdade do seu exercício. É o que pretende fazer o projecto n.º 6/X, sem necessitar, para tal, subordinar-se em exclusivo a uma concepção jusnaturalista-individualista, e, consequentemente, sem precisar, de modo algum, de repudiar uma visão solidarista da sociedade.

Prova disso é o segundo conjunto de preceitos a que atrás me referi: os respeitantes aos meios de comunicação social. Com efeito, o projecto n.º 6/X não se circunscreve a propor a inclusão no artigo 8.º do direito à informação - o direito de o receptor da informação a ser. informado - como contrapartida ou complemento da liberdade de expressão do pensamento - o direito do emissor de informação a informar. Reconhecendo que a opinião pública, mais do que somatório das opiniões individuais, constitui um "elemento fundamental da política e administração do País", aceitando que os meios de comunicação social não se reportam apenas aos indivíduos, mas influem, positiva ou negativamente, no desenvolvimento da sociedade, o projecto n.º 6/X alterou os dois artigos - 22.º e 23.º - em vigor do título vi- e acrescentou um terceiro preceito - 23.º-A. No artigo 22.º, substituiu-se a fraseologia paternalista do texto actual, preferindo-se insistir na livre formação e expressão da opinião pública e na sua defesa contra tudo o que possa afectar a sua independência. No artigo 23.º foram consagrados os princípios essenciais da lei que regule a Imprensa: abolição da censura administrativa (excepto, em caso de guerra, para as notícias de carácter militar); liberdade de obtenção e divulgação de informações; obrigatoriedade de inserção de notas oficiosas; competência exclusiva dos tribunais comuns de jurisdição ordinária para a determinação de todas as medidas preventivas e repressivas dos crimes cometidos através da imprensa; garantia do direito de resposta; livre fundação de empresas jornalísticas, editoras e noticiosas; definição dos direitos e deveres das empresas e dos jornalistas salvaguardando a independência e dignidade de uns e outros e assegurando aos segundos o sigilo profissional. No artigo 23.º-A enunciam-se os objectivos que deverão ser observados, na organização da rádio e da televisão: comunicação entre todos os portugueses; objectividade de informação; prioridade dos programas educativos.

Os três preceitos citados visam conceder à opinião pública, por um lado, e aos meios de comunicação social, por outro, a possibilidade de cumprirem a sua missão perante a sociedade. E não se fale aqui de individualismo e de liberalismo, como o faz o parecer da Câmara Corporativa, que parece não ter encontrado outros qualificativos - que para ela são defeitos graves - para justificar a rejeição, na generalidade e na totalidade, do projecto. Fale-se, sim, da criação de condições mínimas para que a imprensa, a rádio e a televisão possam manter informada e exprimir os pontos de vista de uma opinião pública que até aqui não tem sido livremente formada. Fale-se da necessidade de subtrair essa mesma opinião pública, deficiente ou insuficientemente formada, ao domínio dos grupos de pressão, políticos ou económicos. Fale-se das vantagens e da urgência em, através de uma informação responsável e livre, conseguir uma opinião pública consciente e actuante.

Estes três preceitos do projecto m.º 6/X .adquirem, assim, uma importância maior do que à primeira vista possa parecer, e anel andará quem dela não se aperceba ou quem dela se aperceba e prefira ignorá-la.

Tem igualmente grande relevância o terceiro grupo de disposições do projecto m.º 6/X. O princípio de eleição do Presidente da República por sufrágio universal directo fez paute integrante da Constituição vigente durante vinte e seis anos, sendo o sufrágio indirecto instituído pela revisão constitucional de 1959. Acerca idas vantagens do sufrágio universal directo sobre o indirecto, num regime simplesmente representativo ou de origem presidencialista como o nosso, em que "o Presidente, para ser independente do Parlamento, item Ide :ter uma autoridade igual à dele, brotada da mesma fonte", é suficientemente conhecido e notavelmente claro o parecer da Câmara Corporativa sobre a proposta de revisão constitucional de 1951, cujo relator foi o Prof. Marcelo Caetano. Dispenso-me, por isso, de adiantar outros motivos favoráveis ao sistema de eleição do Chefe do Estado por sufrágio universal e directo, limitando-me- a referir e perfilhar as conclusões sobre a matéria- do referido parecer:

a) Dada a posição proeminente e independente do Chefe do Estado na Constituição, é essa a única forma de a tornar efectiva e de a assentar sobre uma base sólida de legitimidade;

b) Apesar de todos os seus defeitos, o sufrágio universal é ainda, nos regimes republicanos, a melhor forma que até hoje se descobriu de assegurar a intervenção "popular na determinação do rumo do Estado;

c) As campanhas eleitorais, com os inconvenientes inegáveis que possam apresentar, constituem uma ocasião magnífica de exame de consciência nacional e para despertar a consciência (política da Nação, possivelmente adormecida nos intervalos por um método de governo que dá o maior predomínio à Administração e onde prepondera a burocracia;

d) Finalmente, há toda a vantagem em manter a forma de sufrágio que se encontra consagrada já na Constituição e cujo funcionamento, afinal, não se pode dizer que haja demonstrado deficiências no espírito cívico do País.

O único problema que se pode levantar, em 1971, é, assim, o da oportunidade do regresso à forma, inicial de eleição do Presidente da República, visto não haver duvidais de fraudo quanto à preferibilidade do sufrágio universal e directo sobre o sufrágio indirecto. Neste particular, é legítimo perguntar se a permanência de uma forma que não corresponde à essência do regime presidencialista vigente será mais oportuna do que o regresso imediato à forma original. Se se sabe, agora, que o sufrágio indirecto não se integra no sistema constitucional português, para quê fazer mais experiências, para quê, decorridos doze anos, persistir numa solução condenada de antemão, para quê prolongar um erro que a ciência1 política denuncia e o consenso popular, por natural descrença, rejeita?

"Ao elaborar-se uma constituição política", escreveu em 1951 o Prof. Marcelo Caetano, "é erro, e erro que pode ser muito gira vê, redigir os seus preceitos em atenção a determinadas pessoas que de momento desempenham funções de Governo. Os preceitos constitucionais não devem, ser concebidos tendo em vista o presente, nem sequer com a Meia de poderem ser substituídos de cinco em cinco anos, mas com a aspiração de uma: duração indefinida e, se possível, perpétua."

No caso concreto do modo de eleição do Chefe do Estado, o projecto n.º 6/X .não pretende uma nova solução; deseja apenas restaurar o princípio estabelecido em 1933