2996 DIÁRIO DAS SESSÕES NA 148
O Sr. Presidente: — Está em discussão o artigo 18.°
O Sr. Roboredo e Silva: — Sr. Presidente: Sòmente duas palavras respeitantes à redacção da alínea a), que diz assim: «Vias de comunicação, especialmente as de acesso a povoações isoladas e com potencialidades de desenvolvimento.» Esta frase «e com potencialidades de desenvolvimento» ligada a «povoações isoladas» parece-me uma restrição não curial e até certo ponto contraditória. Se as povoações estão isoladas não me parece que tenha sido muito fácil saber quais são as suas potencialidades, e estranho até — e estranharemos mesmo todos — que, estando nós pràticamente no dealbar de 1972, ainda tenha de se escrever, numa lei deste género, «vias de comunicação, especialmente as de acesso a povoações isoladas».
Mas, uma vez que a alínea cá está, afigura-se-me que devia terminar em «isoladas». Necessariamente que não vou fazer nenhuma proposta, como, aliás, é meu hábito, mas não queria deixar passar em julgado este aspecto, que me parece digno de consideração.
Muito obrigado, Sr. Presidente.
O Sr. Correia da Cunha: — Acabo de ouvir as palavras do Sr. Almirante Roboredo e Silva e compreendo a sua perplexidade — compreendo e acompanho-o. Simplesmente poderia acrescentar alguma coisa sobre a intenção que vejo por detrás deste final de frase, referindo as potencialidades de desenvolvimento.
O actual Plano de Fomento, preocupado com a maior rendibilidade (como hoje se diz) dos investimentos, adoptou como norma a concentração dos investimentos, estivessem em causa a implantação de áreas industriais, infra-estruturas sociais ou quaisquer outros investimentos dependentes da acção estatal.
Neste caso, possuindo o nosso país um povoamento — especialmente no Norte — extremamente disperso, acontece, em face das consequências visíveis da emigração, o Governo ter-se apercebido, ou os órgãos de planeamento talvez melhor, de que não conviria andar a espargir e derramar benefícios, ás vezes ilusórios, por milhares e milhares de povoações que estão destinadas mais cedo ou mais tarde a desaparecer do mapa, como dizem alguns dos nossos cidadãos do interior.
Portanto, para além dos milhares de povoações que ainda se podem considerar isoladas, há que contar com o abastecimento de água, de luz, a escola, o médico, enfim… o mínimo necessário para que uma comunidade possa subsistir nos dias de hoje. Conclui-se que haverá que encarar a rede urbana e rural centrada sobre determinados pólos.
Ora, a justificação está posta nesse documento a que me referi esta manhã, que é o plano do ordenamento do território, para o qual eu me permito chamar, novamente, a atenção de VV. Ex.as, parque é um documento que nos leva a reflectir sobre o quadro que se está a gerar para daqui a dez, vinte, trinta anos corresponder aos anseies do nosso país, e por isso eu deduzo, em referência ás potencialidades de desenvolvimento, se destina a salvaguardar essa possibilidade.
Nem todas as povoações, especialmente as pequenas povoações, têm possibilidade, no quadro de um ordenamento do território, de subsistirem para além de muito poucos anos.
Não é necessário obrigar as populações a migrarem, elas próprias reconhecem essas insuficiências e se deslocam sem quaisquer medidas coercivas.
E evidente que, a determinado nível, é o próprio Governo que pode facilitar, pois se em vez de estar a distribuir, segundo um plano de centenários muito ultrapassado, escolas primárias por toda e qualquer povoação do País, se as puder concentrar e fazer a recolecção das crianças, para as levar para centros com melhores condições, onde os professores possam viver, onde possam existir bibliotecas, etc., nós estaremos a dar-lhes melhores condições.
Na realidade, não é possível imaginar o prolongamento de um tipo de povoamento que correspondeu a uma ocupação de territórios em determinada época da nossa história, mas que hoje está nitidamente ultrapassado. Recordo um caso sueco, por exemplo, em que pagam ás famílias de indivíduos que já ultrapassaram a idade do trabalho, ou daqueles que não encontram in loco condições para trabalhar, a deslocação para locais de trabalho e de vida melhores.
É, portanto, o próprio Governo que considera mais económico fazer essa transferência, naturalmente de acordo com o próprio interessado, do que estar a fazer uma pulverização de benefícios que na realidade sai caríssima e não conduz a nada. Porque não se pode pensar em manter em determinados locais, a longo prazo, um certo número de famílias isoladas com cinco, seis e sete fogos, temos realmente uma poalha sem condições de subsistir.
O Sr. Roboredo e Silva: — Agradeço muito ao Sr. Deputado Correia da Cunha, nosso ilustre colega, os esclarecimentos que me prestou a mim e suponho que também foram úteis para a Câmara. De resto, eu sou dos que compreendem o problema do povoamento de Portugal e nomeadamente em determinadas zonas do País, pois sou Deputado por um distrito onde esses problemas são extraordinariamente sérios, em virtude, fundamentalmente, da emigração. Há pequenas povoações que estão pràticamente sem gente e que não têm mais razão de existir. E eu próprio já tive oportunidade e não hesitei em dizer isto a um membro do Governo e para lhe afirmar que considerava como uma das primeiras tarefas a fazer neste País um reordenamento, ou melhor, uma revisão das povoações em determinados distritos, porque até ainda há planos para construção de escolas e outras coisas mais que já não têm razão de ser por os agregados populacionais estarem despovoados. Por consequência, tudo isto precisava de ser revisto com a maior atenção e cuidado, porque se estarão a despender quantias avultadas inutilmente que eram indispensáveis para a satisfação de outras necessidades de interesse público. Mas, aceitando aquilo que foi dito, fico com a certeza de que esta redacção é muito infeliz. Claro que a aceito, por que não apresentei nenhuma proposta para a alterar, mas não deixo de reconhecer que devia ser-lhe dada outra orientação ou limitar-se a dizer: «vias de comunicação nomeadamente rurais», ou qualquer coisa semelhante. Não tenho mais nada para dizer, Sr. Presidente.
O Sr. Correia da Cunha: — Mais uma vez estou solidário com o que o Sr. Deputado Roboredo e Silva acaba de dizer. Na realidade, falar em povoações isoladas e com potencialidades de desenvolvimento… Eu considero que uma cidade pode ter ou não condições de desenvolvimento. De um lugarejo com cinco ou seis fogos naturalmente é estranhável estar a falai em potencialidades de desenvolvimento. Realmente não -está correcta a expressão e eu adiro a qualquer alteração do estilo «acesso a povoações isoladas, com -enquadramento dentro de um ordenamento do território equilibrado», ou coisa que o valha. Mas tal qual está, realmente não faz sentido.
O Sr. Presidente: — Continuam em discussão.
Pausa.