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Três notas, certamente diferentes. Mas em todas acentuando uma mesma presença.

[...] A grande lição dos ilhéus não era nem o purexil, nem o carneiro: era a prova provada do nosso emparedamento num vasto calhau atlântico; por assim dizer, a estátua da nossa solidão arrancada das nossas entranhas e ali posta, junto ao Porto Judeu, como o símbolo de um destino e o padrão de uma vida interior.

Creio, todavia, que essa presença e sentimento de solidão são sintetizados, de forma inultrapassável, na página em que Nemésio escreve:

Oh, solidão das ilhas!... Conquista da terra por fimeza no pouco que se tem e por tino e recuo a tempo no muito que se deseja... Portos fechados, ilhas à vista... Entre nós e o mundo aquela porção de sal que torna incorrupto o aro da terra... Movimento e força; outras vezes tranquilidade e pasmo... Extensão... Extensão... (E, por mais que embirremos com reticências, que são espásmos tipográficos, a coisa é assim mesmo... Tem de exprimir-se nesta dose exacta de exaltação e de pouca sintaxe...) Ilhas pontuadas naquela brutalidade oceânica que é afinal a única coisa delicada e discreta da nossa vida o mar do nosso segredo... a volubilidade do nosso ardor que nada estanca... esta inconsistência de projectos humanos (mas desumano é o lógico, o ético, o inflexível). Além disso, o vapor da carreira... o boletim meteorológico (grau de humidade à saturação 100...) e o acostamento de Santos com a bandeira de saída...

Não procurei fazer um exercício escolar ou um ensaio literário incipiente.
Julgo, Srs. Deputados, que o lirismo de Vitorino Nemésio é certamente o modo mais autêntico e sentido de chamar a vossa atenção para aquilo que eu não conseguiria dizer com a mesma contenção e afecto. Porque da solidão das ilhas se trata. Porque «tudo para o ilhéu se resume em longitude e afastamento. A solidão é o âmago do que está separado e distante».
Creio que só percebendo isto, assumindo-o em termos de solidariedade, seremos capazes de, perante os povos dos Açores e da Madeira, lhes prestar a justiça que lhes devemos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A geografia tem as suas leis. Vale tanto como a história, diz-se. Daqui parte o essencial da proposta política subjacente ao projecto que submetemos à consideração da Assembleia.
É, com efeito, a existência de um território descontínuo que obriga a dotar de infra-estruturas básicas cada espaço autonomizado pelo mar, tornando naturalmente isoladas as populações.
Têm elas que dispor de infra-estruturas necessárias à satisfação de necessidades básicas, sejam elas de deslocação - portos e aeroportos - e comunicações, como de educação, de saúde, de cultura ou de fornecimento de energia.
Poderão ser avultados os custos, fraca ou nula a rendabilidade dos investimentos, mas é o próprio princípio da solidariedade nacional que impõe a obrigatoriedade de, com tais infra-estruturas, se dotarem todas as ilhas.
Por assim ser, não se trata, do nosso ponto de vista, de encargos regionais, ou que tenham sequer a ver com

I SÉRIE - NÚMERO 50

a correcção das desigualdades a que se refere o n.º 1 do artigo 231.º da Constituição da República.
Sem ilusões nem demagogias, teremos que dizer que as desigualdades pela realidade geográfica impostas permanecem e não são, sequer, corrigidas. Do que se trata é de assegurar condições de vida digna. Por isso se trata de tarefa prioritária e encargo de toda a comunidade nacional. Essencialmente, tem a ver é com o disposto no artigo 91.º, n.º 2, da Constituição e com os seus artigos 92.º, 93.º e 94.º.
Por assim ser, tal tarefa nacional tem também um horizonte temporal. Dotadas as ilhas das infra-estruturas básicas referidas, apenas os encargos com a sua manutenção, nos precisos termos em que tal for feito no restante espaço nacional, continuará como encargo da Nação.
Questão diversa e, portanto, na filosofia do projecto, a dos custos de insularidade que, no conceito restrito que perfilhamos, correspondem, eles sim, à correcção das desigualdades que a distância determina relativamente ao preço de bens e serviços. Trata-se aí de assegurar uma igualdade de condições no acesso a bens e serviços essenciais, traçando um quadro legal definidor de quais sejam esses bens e serviços e intervindo nos seus preços, corrigindo-os de modo a não penalizar as populações das regiões autónomas, valendo aqui como critério principal o factor distância e a sua influência no agravamento dos custos.
Finalmente, o projecto procura abarcar o problema da dotação das regiões com meios financeiros adequados à realização dos planos regionais para que não sejam suficientes os recursos das próprias regiões.
Também aqui houve a preocupação da objectividade, rigor e transparência de critérios.
Nem as regiões e o seu progresso, nem o conjunto da vida económica e financeira portuguesa, podem estar sujeitos às variações de humor ou às fases de relacionamento dos governos central e regionais para que se fixe, por puro arbítrio ou maior ou menor peso contratual na conjuntura, as dotações para as regiões do Orçamento do Estado.

O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): - Muito bem!

O Orador: - Começa, assim, por tornar-se claro que, neste capítulo, as obrigações do Estado, face à insularidade, não têm carácter absoluto, nem permanente.
Em primeiro lugar, porquanto, como já dispõe o artigo 85.º da Lei n.º 39/80, de 5 de Agosto, apenas défices de investimentos do Plano e não despesas correntes podem ser cobertas pelo Estado.
É certo que a Região Autónoma da Madeira apenas dispõe de Estatuto provisório, mas não se afigura sequer possível que, por tal facto, viesse a beneficiar relativamente à Região Autónoma dos Açores.
A Assembleia da República deverá assim, e atempadamente, poder conhecer dos planos regionais, o que se afigura corresponder, aliás, aos objectivos nacionais do Plano, tal como definidos no artigo 91.º da Constituição, sem que se ponha em causa, como não poderia deixar de ser, a exclusiva competência das assembleias regionais para aprovação do respectivo Plano, prevista no artigo 234.º da Constituição da República.
Do que se trata é, e tão-somente, de enviar à Assembleia da República as propostas de investimentos, previstas no plano regional, a financiar pelo Orçamento do Estado.