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24 DE MAIO DE 1985 3195

O Orador: - Quando o PSD diz que tem uma posição de abertura para qualquer projecto de assunção de poderes extraordinários de revisão da Constituição apenas quer dizer que não aceita que os Srs. Deputados conservadores enclausurem a vontade do povo português nas páginas da Constituição e não admitam que neste momento diga o que quer.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Mendes.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O CDS, de longe a longe, sai do torpor parlamentar que o caracteriza e comete algumas «ousadias»; avança aqui com uma moção de censura; reivindica ali a realização de eleições antecipadas para, a breve trecho, dar o dito por não dito e afagar o Governo no primeiro corredor sombrio; clama pela eficácia de labor dos deputados mas, porque anda à deriva, furta-se ao trabalho de várias comissões e subcomissões enquanto flana, escassamente, pelo hemiciclo, como hoje sucede. Fora da Assembleia, tanto se contorce por sentir-se sem pai, como, de repente, vendo-se com pai a mais e na contingência de sufragá-lo na corrida para Belém, range de opostas dores. Ciclicamente, de ano a ano, reencena o seu número predilecto e apresenta o estafado projecto de resolução visando a assunção, pela Assembleia da República, de poderes extraordinários de revisão constitucional. Chega junto do Partido Socialista e oferece-lhe o escalracho do seu prato de urtigas travestidas de alface, com ademanes de circunstância. Tenta-o, sabe-o dado a lastimáveis fraquezas e alicia-o, adoptando, face ao eventual silêncio incómodo, a postura entre capadócea e libertina do que pergunta, com o lenço farfalhudo nos dedos:
Para já ou para mais tarde? Eu espero, filhos. Vocês não resistirão aos meus encantos.

Vozes do PSD: - Ah!

O Orador: - O quadro seria caricato se não vivêssemos numa situação, de facto, inconstitucional. Se não campeasse o golpismo, se o adiado cadáver governamental não procriasse no meio dos estrebuches crescentes, males gravíssimos contra o regime democrático.
Enquanto se assiste ao espectáculo de líderes que não aceitam assumir funções de vice-primeiro-ministro e de vices que não são dirigentes partidários, de titulares de pastas que preparam a mala para novos périplos europeus e economistas que espreitam, na antecâmara, a ocasião de entrar em cena, de ministros que se acusam, desresponsabilizam, espingardeiam, o País debate-se com dificuldades sem paralelo, com uma crise a que a política do «bloco central» deu proporções de alarme. O Governo, colocando-se à margem da legalidade, sobrevive penosamente, sobressalta-se com o fim inelutavelmente próximo e, entretanto, distribui prebendas a beltalante, discrimina, persegue, de forma ominosa, quem se não rende ao novo apodrecido instalacionismo, assalta a Reforma Agrária, as empresas nacionalizadas, os direitos elementares dos trabalhadores. Há membros da equipa de Mário Soares que se confessam, publicamente, comprimidos pela Constituição, reclamam outra, acham « incrível que a Constituição do País estabeleça normas constrangedoras para a governação». Desde os tempos do despotismo iluminado, pelo menos, que se não ouvia desabafo tão radicalmente adverso à ideia de Estado democrático. É obra, Srs. Deputados!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Os escândalos avolumam-se. A informação estatizada, inconstitucionalmente, promove, sem desfalecimentos e pelos métodos mais descabelados, a candidatura presidencial do secretário-geral do PS. A própria defunta Comissão Política do PSD, num desarrincanço de feitor que vê a quinta invadida impunemente, teve que bradar umas quantas exigências, proclamando: «Isto não pode continuar». Mas continua. A RTP pulveriza, em cada dia que passa, as regras constitucionais e legais do pluralismo, da isenção, da objectividade. O presidente do seu conselho de administração utiliza o carro da empresa para se deslocar, em veste profissional, a julgamentos incompatíveis com o cargo que desempenha; com o mesmo escrúpulo, no entanto, proíbe, farisaicamente, a exibição de películas, por alegados motivos morais, permitindo que certames inqualificáveis disputem espaços vitais da programação.
Em nome de idênticos valores se distorcem factos, amalgamam espécimes informativos, ostracizam eventos relevantes, agigantam medíocres, empreendem esforços na anticultura e na propagação de retrógados ideários.

Vozes do PCP: - Que vergonha!

O Orador: - Convergindo com estes, outros escândalos proliferam.

A extinção da CTM e da CNN, abrindo os túneis da miséria a milhares de homens e mulheres, generalizando o desemprego e a injustiça social, operou-se contra a moldura constitucional, em favor do nepotismo, da arbitrariedade, dos interesses privados de desbarato e rapina. Recentemente, o Governo criou, por decreto--lei, um fundo de apoio financeiro do Primeiro-Ministro, prestado pelos Estados Unidos no âmbito da Fundação Luso-Americana, gerido mediante a intromissão directa do embaixador daquele país em Lisboa. O procedimento, para lá das coordenadas políticas em que está envolto, é inepto e inconstitucional: desvia do Orçamento do Estado e da fiscalização pública dinheiros concedidos a Portugal, num montante originário de 38 milhões de dólares. Vergonhoso é, porém, que o preço das facilidades doadas às Forças Armadas Americanas à custa da soberania portuguesa, num processo inçado de obscuridades, atropelos e claudicações por parte do Governo que suportamos, seja canalizado expeditamente para o comité eleitoral dos negociadores! Aliás, com vista aos actos de apuramento da vontade popular que se avizinham, surgem já as medidas demagógicas, o entreluzir das falsas abundâncias para iludir incautos e os apoios discriminatoriamente estabelecidos. Que culpa tem a Constituição de tudo isto? Absolutamente nenhuma!
A realidade económica, financeira e social do País não se compadece com práticas irresponsáveis em todos os azimutes e exige, imperativamente, que a Constituição, em vez de ser violada, seja cumprida. A Constituição consagra todos os direitos fundamentais mas, por força